Um velho fantasma que parecia ter sumido há alguns anos agora volta a assombrar os brasileiros, trazendo uma insegurança para toda a população, especialmente na hora de ir às compras do dia a dia. Nos últimos meses, a inflação vem subindo e só no mês de novembro ficou acima do esperado pelo mercado, com alta de 0,89% — ante 0,86% em outubro, conforme o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O resultado foi o mais alto para o mês desde 2015 e ajudou a elevar ainda mais o acumulado dos últimos 12 meses: 4,31%, percentual que ultrapassa a meta de 4% estabelecida pelo governo. Na lista, o que mais pesa nas contas do brasileiro foi alimentação, especialmente aquela feita dentro de casa, que disparou 21,13%. É a maior alta desde 2003, pressionada pelos produtos essenciais na mesa das pessoas como batata (acréscimo de 29,65%), tomate (18,45%), óleo de soja (9,24%), arroz (6,28%) e carnes (6%).

Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) — aquele que é calculado com base nas famílias com rendimento de até cinco salários mínimos — subiu 0,95%, também a maior variação para um mês de novembro em cinco anos. No ano, o INPC acumula alta de 3,93% e, nos últimos 12 meses, ficou em 5,2%, acima dos 4,77% registrados no período anterior. E, assim como no IPCA, a alimentação pesou muito.

O aumento generalizado de preços da comida vem na esteira da disparada da cotação do dólar, que beneficiou as exportações da safra brasileira de grãos. E, com o velho dragão parecendo despertar, a diarista Sonia Caldas está bastante apreensiva. Mesmo contando com uma cesta básica recebida pela nora, ela diz que precisa completar as compras no mercado para alimentação dos filhos e o neto. “Os preços estão um absurdo e, com o quilo da carne de segunda a mais de R$ 30, a única saída é comer frango”, desabafa Sonia.

O recrudescimento da inflação não poderia vir em uma hora pior. No meio da crise agravada pela pandemia, ela pode ter impactos ainda mais nefastos, elevando os preços exatamente num período em que cresce o desemprego e a renda da população cai, com a redução do auxílio emergencial concedido pelo governo. Soma-se a isso um déficit primário estimado em mais de R$ 800 bilhões para 2020. Tem-se aí uma receita bombástica, que torna as perspectivas para ainda mais sombrias para a economia. O que pessoas como a diarista Sonia Caldas sentem na pele todos os dias é o efeito mais perverso da inflação, que onera justamente quem ganha menos e não tem chance de se proteger. “Inflação é o imposto do pobre, porque retira seu poder real de compra”, argumenta o economista e presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo & Mercado de Consumo (Ibevar), Claudio Felisoni. Segundo ele, a pandemia desorganizou todo o sistema de produção, distribuição e varejo, causando um impacto fortíssimo na economia, com o fechamento de mais de 700 mil empresas. “E temos de ser realistas. O horizonte é complicado, mesmo com o surgimento da vacina”, acrescenta.