Ao congelar a aplicação de quase R$ 7 milhões do orçamento que seriam destinados para a modernização do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Bolsonaro explicita sua intenção de inviabilizar o aprimoramento de controle das movimentações financeiras suspeitas, como as que envolveram seu filho Flávio nas rachadinhas no Rio de Janeiro. Os recursos bloqueados pelo presidente seriam aplicados pelo Coaf para atualizar o Sistema de Controle de Atividades Financeiras (Siscoaf), uma plataforma digital usada para identificar, com maior precisão, depósitos bancários atípicos. O sistema é uma das principais ferramentas para combater os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro e utilizado também para a produção de relatórios de inteligência para a PF, Receita e Ministério Público, com base em informações apuradas junto a bancos, corretoras, Bolsa de Valores e transportadoras de dinheiro vivo.

O direcionamento dos recursos para o Coaf consta da última versão da proposta de Orçamento para 2021, sancionada pelo mandatário no mês passado. No texto original, havia previsão de a União reservar R$ 6,7 milhões para que o órgão de controle atualizasse o sistema de monitoramento financeiro. Quando foi aprovado pelo Congresso, esse valor caiu para R$ 6 milhões. Ao chegar às mãos do capitão, contudo, os recursos para o Siscoaf foram simplesmente zerados.

O processo de modernização do Siscoaf, que agora está sendo interrompido pelo presidente, começou em 2013. O conselho estava preparado para concluir a última etapa da atualização neste ano. Com o corte de verbas, porém, o Coaf informa não ter mais previsão de quando o sistema estará totalmente pronto. Em 2018, o órgão usou essa ferramenta para elaborar um relatório que identificou a movimentação financeira suspeita nas contas de Fabrício Queiroz, então assessor de Flávio Bolsonaro, que na época era deputado estadual no Rio de Janeiro. Dentre as transações atípicas, o conselho também revelou a existência de um cheque de R$ 24 mil depositado na conta da primeira-dama Michelle.

A rachadinha

Segundo o Coaf, Queiroz movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. O valor chamou a atenção porque os valores eram incompatíveis com o patrimônio do assessor. Ele era servidor da Alerj no gabinete de Flávio e tinha um salário de R$ 8,5 mil, além do vencimento mensal de R$ 12,6 mil pago pela Polícia Militar, mas esses recursos seriam insuficientes para justificar a movimentação. O relatório também mostrou como funcionava a rachadinha: sete servidores da Assembleia que trabalharam no gabinete de Flávio fizeram transferências para a conta mantida por Queiroz. O MP estima que Flávio recebeu mais de R$ 6 milhões desse esquema. Desde então, o presidente tem feito de tudo para desmontar o Coaf e livrar os familiares de punições por seus malfeitos.