Foi uma temporada inolvidável de poder nas mãos de um insano. As consequências, visíveis e inevitáveis, estão postas. Nessa reta final, a poucas semanas da troca de guarda, da transmissão da faixa – que, naturalmente, o capitão vai se recusar a fazer ao sucessor, dada a rabugice que acalenta pela derrota –, a máquina pública vai parando. Quase entrando em colapso. Contando os trocados dia a dia. Faltam recursos para o elementar, o essencial, até para as despesas comezinhas, o cafezinho (já frio), e mesmo as discricionárias, que deveriam ter verba garantida. Não há, por exemplo, como pagar pensionistas do INSS. Inexistem recursos para as universidades públicas. A de Minas Gerais, ficando em um caso emblemático, informou ter em caixa míseros R$ 71, sem condições de sobreviver daqui até o final do ano com “tanto”.

O pendura junto aos organismos multilaterais, dos quais o Brasil participa como ativo interlocutor, supera os R$ 5 bilhões. Na Saúde, classificaram membros da equipe de Transição, prevalece “uma desgraceira” sem fim. Desmontaram o programa modelo de vacinação que erigiu a imagem do País como referência mundo afora. Dos 30 grupos temáticos, responsáveis por realizar um levantamento minucioso para o elenco de Lula que entra em janeiro, nenhum deles têm boas notícias a apresentar. Ao contrário, o conjunto da obra bolsonarista é calamitoso. A falência, na definição de um dos especialistas integrantes do grupo de trabalho, é não apenas financeira, como gerencial, moral e social. Izabella Teixeira, ex-ministra especializada em Meio Ambiente, agora mergulhada em um calhamaço de informações sobre o desastre em curso, avaliou da seguinte maneira o que viu e verificou: “Não é exagero, não é drama. Houve uma decisão política de destruir tudo. No Meio Ambiente não há dinheiro para prevenção alguma. Acabou”.

Parece isso mesmo, o Brasil experimenta, lamentavelmente, um apagão orçamentário do Estado sem precedentes. De tal monta que a administração em final de feira apela ao time que tomará posse para que antecipe algum recurso extra com o objetivo de quitar as contas deixadas penduradas. Do contrário, a alternativa abusiva buscada por esses vendilhões do templo será a de furar o teto de gastos (mais uma vez), espetando um papagaio adicional de nada menos que R$ 23 bilhões na fatura, como ameaçam. Não bastou a esbórnia fiscal praticada nos últimos meses mirando uma reeleição que não veio. Não bastaram os acordos espúrios de um orçamento secreto demolidor das finanças. O governo Bolsonaro dá sinais de sua inépcia explícita.

O mandatário em pessoa trancafiou-se no seu Palácio, seguiu mudo, amuado, muxoxo, cancelou despachos e não quer saber de nada. Desprezo pelos problemas “alheios” — porque assim ele encara. Na mais recente aparição pública que fez, o capitão deu a exata dimensão de seu despreparo psicológico e emocional para o cargo que ocupou nos últimos quatro anos. Resolveu verter lágrimas em uma cerimônia corriqueira no ambiente militar. Por nada, sem motivo aparente. Decerto, não em consideração a vítimas de seus equívocos ou como qualquer sinal de comiseração ou de arrependimento pelos malfeitos praticados. Imagine! Longe disso. O lapso sentimental, como interpretaram os presentes, dizia respeito exclusivamente ao seu próprio destino e à sensação, indisfarçável, de que vai ficando só no intento tresloucado de promover um golpe para se perpetuar no cargo.

Era um abatimento em causa própria, digamos dessa forma. Bolsonaro não chorou quando as milhares de mortes de brasileiros viraram uma constante durante a pandemia. Ali exibia a macheza insensível, reclamando de todos: “vamos deixar de frescura, de mimimi, vão ficar chorando até quando?”.

A fraquejada do atual momento parece reflexo de um egoísmo que jamais abandonou. As dificuldades impostas a um País que viveu atormentado por incitações ao caos, pelas “motociatas” sem sentido e pelas gambiarras gerenciais do alto comando estão deixando um alto preço. Vítima da mediocridade do pior mandatário de todos os tempos – único a não conseguir se reeleger desde a redemocratização, o que demonstra o desprezo que cultivou na maioria –, o Brasil tenta se safar da crise e esquecer a sombria marca legada pela malfadada temporada desse caudilho no Planalto. Verdadeira tortura administrativa, finalmente com os dias contados. O horror da era Bolsonaro não cabe em suas lágrimas de crocodilo.