Dólar negociado a R$ 5,20. Taxa básica de juros com tendência de chegar a 8%. Aumento do PIB no ano praticamente sem recuperar as perdas de 2020, e com projeções de crescimento abaixo de 1% para 2022. Tudo isso em meio à disparada de 8% nos preços, e com uma das taxas de desemprego mais altas da história, que está deixando 14,4 milhões de brasileiros sem trabalho e renda. Esse cenário catastrófico para 2021 era impensável até meses atrás para boa parte do mercado, mas se concretizou agora pelas constantes crises políticas provocadas pelo presidente. Elas contaminaram as perspectivas para este ano e para o próximo.
Mais do que isso, todos esses prognósticos — que até o primeiro semestre podiam soar alarmistas demais — hoje ainda passam por otimistas. O Banco Itaú, em geral conservador em suas análises, já espera uma expansão de apenas 0,5% no PIB de 2022. O JP Morgan diz que ela será de 0,9%, enquanto a MB Associados baixou, nesta semana, sua expectativa para o ano que vem para apenas 0,4%. “O ‘custo Bolsonaro’ é o pior da nossa história recente, porque não vemos saída política no horizonte”, critica o economista-chefe da MB, Sérgio Vale, fazendo comparações com as crises que derrubaram Fernando Collor, em 1992, e Dilma Rousseff, em 2016. Ele se refere ainda à expressão que o mercado vem utilizando para se referir à deterioração econômica por conta dos arroubos golpistas de Bolsonaro.
Pior do que isso, a XP admite que o Brasil pode simplesmente estagnar em 2022, e que é possível até uma queda do PIB até lá se o País atravessar um período de racionamento de energia. Já o mercado, que chegou a prever um dólar abaixo dos R$ 5 no próximo ano, agora não espera que a moeda estrangeira seja negociada abaixo dos R$ 5,20, segundo o Boletim Focus, compilado pelo Banco Central. Isso prolongaria o cenário de inflação e juros altos, aumento nos custos produtivos e consequente debandada de empresas, prejudicando seriamente as expectativas de retomada econômica.
“Hoje, o custo Bolsonaro é muito alto para a sociedade”, concorda o economista David Deccache, diretor do Instituto de Finanças Funcionais para o Desenvolvimento (IFFD). “Impacta desde as grandes cadeias de produção, que estão deixando de acessar insumos importados, até o bolso do consumidor direto, que paga mais pelos produtos, mas fica com o salário estagnado”, continua. Há alguns dias, o próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, confessou a investidores estrangeiros que os “barulhos” do presidente prejudicam a economia. “Isso pode desacelerar o crescimento”, disse. Dias depois, diante de uma plateia de banqueiros, ele voltou a colocar panos quentes nos conflitos institucionais, dizendo que os discursos violentos de Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal são “só palavras”.
O Boletim Focus mostra que o auge do otimismo com o PIB de 2021 aconteceu em meados de junho: a previsão era de crescimento de 5,30%. Hoje, ela é de 5,04%. Queda ainda mais drástica aconteceu com as previsões para o ano que vem, que estavam em 2,5% em fevereiro e agora são de 1,72%. E essa expectiva pode piorar. Espera-se que nos próximos dias vários bancos e consultorias revisem suas perspectivas para baixo. “É resultado de uma conjunção muito ruim de instabilidade política e crise energética iminente”, argumenta Sérgio Vale. “O mercado está aceitando que esse é um governo sem solução.”
Disparada dos preços
Para a inflação, os analistas esperavam, em janeiro, uma taxa de 3,43% ao fim do ano, abaixo do centro da meta estipulado pelo BC, de 3,75%. Agora, a previsão mais otimista é de que fique em 8%, mas há quem preveja um índice na casa dos dois dígitos — o que não acontece desde 2015, durante o colapso do governo Dilma Rousseff. O presidente do banco, Roberto Campos Neto, confirmou esse risco nesta semana dizendo que “levará a Selic até onde precisar” para conter a aceleração dos preços. “É um caso raro de crescimento da inflação sem aumento da demanda, o que cria um ambiente de estagflação”, diagnostica Eduardo Costa Pinto, professor e vice-diretor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Entre os economistas, há um consenso de que o canal mais evidente do custo Bolsonaro recai sobre o dólar. Cada vez que o presidente eleva o risco de ruptura institucional, a moeda americana sobe rapidamente, porque investidores daqui e de fora temem perder dinheiro com o mar de incertezas. Isso faz com que as cotações subam rapidamente. Para conter a pressão inflacionária, o BC se vê forçado a subir a taxa básica de juros, o que, por sua vez, desaquece a economia como um todo. “O resultado é uma crise sistêmica e estrutural, em que câmbio, juros, crescimento do PIB e emprego são significativamente afetados”, afirma Deccache.
Um dos economistas mais importantes do País, Edmar Bacha, resumiu essa situação da seguinte forma: “A economia não gosta de zigue-zagues, gosta de linha reta e, nesse sentido, Bolsonaro é parte do problema”. Seguindo esse raciocínio, as previsões são ainda mais desastrosas, pois o mercado enxerga que dificilmente o presidente se manterá em uma rota segura daqui em diante. Na verdade, o que se espera é que ele siga cada vez em movimento pendular. “O pior momento da economia ainda nem chegou. Bolsonaro ainda o está construindo”, lamenta Sérgio Vale.