Se fosse possível decifrar os segredos do cérebro humano, os cientistas encontrariam nos neurônios do escritor J.R.R. Tolkien algumas das descobertas mais fascinantes da raça humana. O sul-africano de origem britânica não escreveu apenas personagens e tramas interessantes: ele criou um amplo universo, com seres imaginários, idiomas próprios e até uma geografia particular. Inspirado por mitologia e pelas obras de Júlio Verne e E.R. Eddison, Tolkien tornou-se o “pai da literatura fantástica moderna”.

Professor de literatura em Oxford, na Inglaterra, John Ronald Reuel Tolkien ganhou fama mundial com “O Hobbit” (1937) e a trilogia “Senhor dos Anéis”, finalizada em 1955. Junto com os poemas de “Silmarillion”, obra póstuma publicada em 1977, esses livros compõem o eixo principal de sua obra. E ela vai bem além dos limites humanos: eram alocadas na Terra-Média, um mundo criado por Tolkien onde a química, a biologia e até o tempo funcionam de forma diferente. A descrição dessas regras é a base para “A Natureza da Terra-Média”. O livro inédito editado pelo estudioso Carl F. Hostetter levou 25 anos para ser finalizado. Demorou tanto que o próprio filho de Tolkien, Christopher, responsável por aprovar a obra póstuma do pai, morreu antes do lançamento, em 2020.

O livro é interessante para os fãs do Tolkien, mas também para leitores interessados no processo criativo do autor. Ele não se contentava apenas em contar histórias em inglês: criou os alfabetos “Angerthas” e “Cirty”, além de idiomas completos. Os anões de “O Hobbit”, por exemplo, falam Khuzdul, mistura de hebraico e línguas do Oriente Médio; há personagens que se comunicam em Quenya, algo entre o finlandês e o português; outros se expressam em Sindarin, baseado no galês. Além do valor literário, “A Natureza da Terra-Média” é importante por contextualizar um dos universos mais ricos da ficção mundial: trata-se de um manual para a mitologia de Tolkien. Embora não seja uma obra para iniciantes, sua riqueza de detalhes comprova a criatividade do escritor e seu talento para conceber realidades paralelas onde antes havia apenas papel em branco.

A história pessoal de Tolkien diz muito sobre o mundo que ele criou. Por ter lutado na Primeira Guerra Mundial e ter visto os filhos se alistando na Segunda Guerra, a temática militar é a base de todo o seu universo. É permeada ainda pela eterno duelo do bem contra o mal, com episódios que valorizam a amizade e a honra entre seus clãs e guerreiros. Não é à toa que a riqueza de detalhes desses relatos tem motivado tantas e tão bem sucedidas adaptações para o cinema e a TV.

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“A Natureza da Terra-Média” traz material inédito escrito entre 1959 e 1973 e responde a algumas das dúvidas levantadas há anos por estudiosos. Os interessados nessas questões não são poucos: os livros de Tolkien venderam mais de 150 milhões de cópias e foram traduzidos para 40 idiomas. Com as informações contidas em “A Natureza da Terra Média”, seus fãs poderão ampliar esse número, formulando novas traduções para alguns dos diversos idiomas criados pelo Senhor dos Anéis.