“Bem-aventurados os países de merda, porque nos deram o sonho americano!” A provocativa exaltação de Bono durante o show do U2 que integrou a 60ª cerimônia de entrega do Grammy, no domingo 28, resume o coro anti-Trump que ecoa cada vez mais forte em todo o planeta. Ditas por meio de um megafone pintado com as cores da bandeira dos EUA, as palavras do cantor irlandês, conhecido por seu protagonismo na defesa de causas humanitárias, foram a resposta que muitos queriam ter dado ao presidente americano desde que ele usou a expressão “países de merda” para se referir ao Haiti e a nações africanas. Trump já negou ter feito a afirmação, mas a frase serviu para galvanizar a aversão a tudo que seu primeiro ano no poder representou. O cenário escolhido para a manifestação anti-Trump de Bono e seus companheiros de banda não poderia ser mais apropriado. O U2 se apresentou em um palco montado ao ar livre no porto de Nova York, local onde no passado milhões de imigrantes desembarcaram fugidos da fome em seus países. Cada um a seu modo, eles ajudaram a construir a América. Ao fundo, era possível ver de relance a Estátua da Liberdade, cujo nome oficial é “A Liberdade Iluminando o Mundo” – exatamente o oposto do que prega a política xenófoba, isolacionista e protecionista de Trump.

ELE RESISTE Depois das ofensas aos imigrantes, Donald Trump ouviu o que não queria de celebridades da música (Crédito:Win McNamee)

País de sonhadores

O palco montado na área portuária foi uma extensão da cerimônia no Madison Square Garden que reconheceu os grandes destaques da música em 2017. Dessa vez, a música ficou em segundo plano. Nem mesmo o cantor Bruno Mars, que abocanhou seis estatuetas, incluindo melhor disco e melhor canção, esteve tão no centro das atenções da festa como o presidente Donald Trump. Ele foi lembrado também no discurso da cantora Camila Cabello, de origem cubana. “Esta noite, nesta sala cheia de sonhadores da música, lembramos que este país foi construído por sonhadores, para sonhadores, perseguindo o sonho americano”. A grande estrela da noite, contudo, foi o livro “Fogo e Fúria”, de Michael Wolff, jornalista que acompanhou a campanha de Trump à Casa Branca e detalha os bastidores dos primeiros dez meses de seu conturbado governo. Em cenas pré-gravadas e exibidas durante a cerimônia, trechos do livro foram lidos pela atriz e cantora Cher, pelo rapper Snoop Dogg e pela maior das rivais de Trump: a ex-primeira-dama, ex-senadora e candidata derrotada à presidência pelo partido democrata Hillary Clinton.

LEITURA DINÂMICA Cher, Snoop Dogg e Hillary Clinton leem trechos de “Fogo e Fúria” em cena pré-gravada do Grammy: política derrubou audiência do prêmio da música

Transformar parte do Grammy em um ato político foi uma decisão corajosa. Embora se encaixe na onda de protestos que tomaram conta de eventos como o Globo de Ouro, com o inflamado discurso de Oprah Winfrey contra o abuso sexual, e do National Board of Review Annual Awards, em que o ator Robert De Niro chamou Trump de “idiota de merda”, desta vez o resultado não foi o esperado. O Grammy Award é o equivalente musical do Oscar e também um espetáculo televisivo importante. A julgar pela audiência doméstica nos EUA, a conversão política não agradou. Em 2017, a transmissão foi assistida por 26,1 milhões de telespectadores. Este ano, com a festa do Grammy antecedendo em poucos dias o primeiro discurso do Estado da União do presidente Trump, apenas 19,8 milhões de televisores sintonizaram a premiação.

Democratas vestem preto

Divulgação

Um ano após assumir a presidência dos EUA, o republicano Donald Trump fez na noite da terça-feira 30 seu primeiro discurso anual do Estado da União, como é chamada a fala que o chefe da Casa Branca dirige aos congressistas. Embora tenha se concentrado em temas de governo, como a proposta de revisão da política de imigração, parte da oposição aproveitou o ensejo para se vestir de preto em apoio movimento #TimesUp, de combate ao abuso sexual – o mesmo que mobilizou artistas na entrega do Globo de Ouro, semanas antes.

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