Salman Rushdie ficará eternamente marcado como o escritor condenado por uma fatwa, sentença de morte promulgada pelo aiotolá Khomeini graças à publicação de “Versos Satânicos”. Segundo o líder iraniano, o polêmico livro de 1989 seria uma afronta ao islamismo. O autor indiano de ascendência britânica foi obrigado a viver no anonimato – ele chegou a se mudar de casa mais de 50 vezes. Hoje, Rushdie é cidadão americano e mora em Nova York, onde vive uma vida quase normal. Foi lá que ele concebeu seu mais novo livro, finalista do renomado Man Booker Prize e paródia de um dos maiores clássicos da literatura mundial. “Quichotte” é um Dom Quixote dos tempos modernos, um balaio de referências pop narrado no melhor estilo do realismo fantástico asiático. Assim como Cervantes, que fez uma crítica à cultura da época, Rushdie abusa da ironia para descrever a América de Donald Trump. O livro alterna dois protagonistas, o escritor fracassado Sam DuChamp e seu personagem, Ismail Smile, um vendedor de origem indiana que se apaixona por uma estrela da TV. Ao lado de um filho imaginário, batizado obviamente de Sancho, ele sai pelos EUA em uma odisseia repleta de perigos e situações curiosas.

Um balaio de cultura pop

O excesso de referências a Dom Quixote faz de “Quichotte” um livro bastante divertido. Em vez de enlouquecer com os romances de cavalaria, como o nobre fidalgo de Cervantes, o protagonista de Salman Rushdie fica burro depois de tanto ver televisão. No lugar de Dulcineia, paixão imaginária do cavaleiro andante, a donzela a ser conquistada agora é Salma, apresentadora de talk-show de origem indiana para quem Ismail Smile escreve cartas sob o pseudônimo “Quichotte”. O livro funciona bem como obra independente – mas quem conhecer o original vai gostar ainda mais.