Sobrevivemos ao Carnaval.

Se você, como eu, passou na praia, com uma turma de amigos, é um vencedor.

Porque, quem sabe, você também foi vítima de um personagem que existe em todo grupo de amigos que, às vésperas de todos os feriados, resolve “agitar o pessoal”.

Nossa que horror.

É o mesmo sujeito que organizou o Réveillon em Trancoso.

Aquele que você suava tanto que a dona da Pousada gritou:

— Já disse que mergulhar na piscina de roupa não pode, hein!

O pior é que ele sabe convencer.

Começa com uma unanimidade:

— Vamos para um lugar tranquilo, no Carnaval, hein?

Um sem muvuca?!

— Vamos!!!! – gritam todos, inocentes.

Ele continua:

— E sem trânsito!

— Isso!!!! – concordam.

Você, experiente, sabe que não existe um lugar tranquilo e sem trânsito no Carnaval, mas se cala para não ser visto como o pessimista da turma.

O sujeito começa mandando três opções de casas para o grupo do WhatsApp.

Fotos selecionadas no Instagram que, como você sabe, são ilusões.

São fotos cenográficas, preparadas exatamente para enganar gente de bem, como você e sua turma.

Além do mais, existe uma verdade no mercado imobiliário que nunca é dita: imóvel bom não anuncia. Ponto final.

Por isso, casa bacana, na praia ou na montanha, durante o Carnaval, já foi alugada em janeiro.

Do ano passado.

Mas não adianta você dizer nada. Estão todos hipnotizados pela ideia de passar o Carnaval juntos, numa praia sem trânsito, sem multidão e, ainda por cima, numa dessas casas paradisíacas.

Você já sabe que não terá como escapar, então decide acompanhar os planos apenas pelo prazer mórbido de continuar vendo as escolhas erradas se sucederem.

Todo mundo escolhe a casa pé na areia.

Você comenta que “pé na areia” todas são, porque com 16 na casa, vai ter areia no chão até maio.

Ninguém entende sua fina ironia.

Chamam você de estraga-prazeres pela primeira vez.

A casa é pré-fabricada. Tem TV de tubo. Lustre redondo de acrílico laranja. O sofá é de tijolinho e as almofadas são de vinil com estampa de plantinha.

Você consegue sentir o cheiro de mofo já pelas fotos.

A sala tem piso de azulejo de banheiro.

E o banheiro tem louça marrom com chuveiro elétrico que dá choque na torneira.

O Brasil é o único País que tem chuveiro elétrico, sabia disso?

No resto do mundo só misturam eletricidade e água quando querem se suicidar.

Essa é a época do ano ideal para testar a resiliência de suas amizades

Contrato assinado, mapinha de como chegar enviado, tudo pronto.

Para chegar à Praia da Dorotéia do Norte dizem que leva nove horas, saindo no sábado de madrugada.

O pessoal que veio pela Tamoios insiste que chegou em duas horas.

Você desconfia que falem isso só para te irritar.

Quando você chegou, depois de quinze horas na estrada e duas na balsa, obviamente as duas suítes já tinham sido ocupadas.

Em silêncio, você tira as malas do carro e descobre que apenas sobrou o quarto com ventilador no teto.

Ou a sala, que tem ar condicionado, mas você vai ter que dividir com o Golden da Luquinha.

O que lambia a sua cara no Réveillon.

O que baba no requeijão e ninguém parece notar.

Você escolhe o quarto.

Os dias passarão lentos.

De madrugada bate aquela fominha.

Na geladeira, toda enferrujada e sem a tampa de baixo, alguém colocou fita crepe com o nome em todos os iogurtes. Não que você goste especialmente dos malditos iogurtes.

Mas, resolve tomar um. Só de birra.