Em 1912, por muito pouco não tivemos Carnaval. Enlutado pela morte do Barão do Rio Branco em 10 de fevereiro daquele ano, o governo adiou o evento para abril. O brasileiro não perdeu o gingado. Apesar de decretado o fechamento dos órgãos públicos e o silêncio obsequioso ter virado quase uma imposição nacional, a festa ocorreu do mesmo jeito. Em abril, o folião se abriu. Houve Carnaval de novo. Com direito a marchinha politicamente incorreta: “Com a morte do Barão/tivemos dois carnavá/Ai que bom, ai que gostoso/Se morresse o Marechá”, numa referência ao Marechal Hermes da Fonseca, presidente da República entre 1910 e 1914.

Seis anos depois, em 1918, mais uma vez o Carnaval quase foi a pique. O Brasil guerreava. O País entrou na Primeira Guerra em 1917, depois que o nosso maior navio da marinha mercante, o “Vapor Paraná”, carregado de café, foi bombardeado por um submarino da Alemanha no cabo Barfleur. Três brasileiros morreram e a Venceslau Brás não restou outra saída senão anunciar o conflito. Em 3 de fevereiro de 1918, no jornal O Estado de S.Paulo, o jornalista e imortal da ABL Medeiros e Albuquerque escreveu: “Uma preocupação muito geral é saber se haverá Carnaval. Pouco a pouco, ao menos nas camadas mais cultas da população , uma onda de indignação está se levantando contra essa ideia selvagem que nos desonraria aos olhos de estranhos.

(…) Ora, é incontestavelmente uma tendência deplorável a de quem não sabe abster-se de festas, quando deve manifestar pesar por qualquer lutuoso acontecimento”. O escritor prosseguiu em sua toada antimomesca: “Seria um ato inominável que, enquanto nossos Aliados se batessem a obuses e granadas, ceifados às centenas e aos milhares, dando seu sangue pela causa comum, nós nos batêssemos a confetes, serpentinas e lanças-perfumes. Atualmente, para viagens de um a outro Estado, pede-se a exibição de carteira de identidade e mesmo um passaporte ou salvo-conduto. Como, em tal situação permitir o uso de máscaras?”, questionou.

Os apelos foram em vão. O brasileiro, conforme escreveu Antonio Carlos Prado em recente artigo na ISTOÉ, não estava nem aí para a guerra: “Na verdade, andavam mais interessados em palpitar nas esquinas do Rio de Janeiro sobre o assassinato do senador Pinheiro Machado, em discutir nos cafés o conturbado clima político decorrente da República recém-proclamada e em cantar na porta das barbearias o primeiro samba aqui gravado (“Pelo telephone”, letra que fazia chacota com a polícia que acobertava na cidade os jogos de azar)”. O Brasil, então, carnavalizou.

Hoje, Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, quer guerra com a Venezuela. O vice general Mourão, ao que parece,
não. Independentemente do lado da trincheira a prevalecer, que todos fiquemos tranquilos: Como diria o ex-presidente Venceslau, aqui, nem batalha naval (ou campal) impede o Carnaval.