Os protestos que tomaram as ruas de Buenos Aires desde a quinta-feira 14 não foram suficientes para impedir a aprovação da reforma da Previdência, uma importante vitória para o presidente argentino, Mauricio Macri. Após discussões que avançaram madrugada adentro, a medida foi aprovada na manhã da terça-feira 19, com 127 votos favoráveis, 117 contrários e duas abstenções. A principal alteração diz respeito ao reajuste da aposentadoria. Antes os benefícios eram corrigidos com base em índices como a arrecadação previdenciária e a evolução dos salários. Pelo novo texto, seguirão o índice de inflação. Com a mudança, o governo espera poupar US$ 3,2 bilhões no próximo ano, equivalentes a 0,4% do PIB argentino.

A reforma da Previdência é uma das principais bandeiras de Macri. O presidente chegou à Casa Rosada em dezembro de 2015 com o objetivo de aprovar uma série de mudanças estruturais que visam reerguer o país após uma grave crise. O desaparecimento do submarino San Juan e a falta de transparência do governo em lidar com a questão arranharam a imagem de Macri, que perdeu cinco pontos percentuais de aprovação desde janeiro de 2016. Mesmo assim, ele manteve sólidos 54%. A nova reforma deve torná-lo ainda mais impopular. Após a votação, manifestantes foram às ruas e entraram em confronto com a polícia. O saldo foi de 141 pessoas feridas, incluindo 88 policiais. “A violência que vimos não foi espontânea, foi orquestrada”, disse o presidente. Mas nem os protestos deverão desviar a Argentina do bom caminho. Nas eleições legislativas de outubro, Macri conquistou mais apoio no Senado e na Câmara dos Deputados, o que favorece a agenda reformista.

O caso do Brasil

Brasil e Argentina enfrentam uma situação parecida. Uma grave crise e os rombos nas contas públicas causados pela previdência demandam mudanças. Enquanto Macri conta com o apoio do Congresso e a aprovação da população, o governo Temer não conseguiu reunir votos suficientes para aprovar a reforma, que só será votada em fevereiro. Embora a avaliação governo Temer tenha melhorado (segundo o Ibope, 6% o consideram bom ou ótimo, contra 3% na pesquisa anterior), o ano termina com a sensação de derrota para o Congresso na pauta mais importante de sua gestão.

Semelhanças e diferenças

As reformas de Macri e Temer têm alcances diferentes, mas nos dois casos a situação do país exige uma mudança

SEMELHANÇAS

SITUAÇÃO DO PAÍS
Argentina e Brasil têm rombos bilionários nas contas públicas, o que torna as reformas necessárias. Para agravar a situação, os dois países passaram por graves crises financeiras

MEDIDA IMPOPULAR
Nos dois casos, não há consenso sobre a extensão das reformas e a maneira como elas devem ser colocadas em prática; a população se revoltou, mas com intensidades diferentes

DIFERENÇAS

TAMANHO DA REFORMA
Enquanto a mudança argentina foca na maneira como o benefício é reajustado, a reforma brasileira é mais ampla e aborda idade mínima e tempo de contribuição, entre outros pontos

IMAGEM DO PRESIDENTE
Macri perdeu um pouco de apoio desde janeiro de 2016, quando se elegeu, mas ainda é aprovado por 54% da população argentina. Temer, por outro lado, é reprovado por 74% dos brasileiros