O blefe da líder de mercado

Dado Galdieri
Foto: Dado Galdieri

A notícia caiu como uma bomba entre os trabalhadores da empresa. A GM divulgou um comunicado interno na sexta-feira 18 para todos seus funcionários em que destaca as dificuldades para continuar suas operações no Brasil e fala na possibilidade de fechamento de fábricas e até mesmo de interrupção da produção na América do Sul. Causou estranheza a dramaticidade do documento, que apresenta a GM numa situação de crise profunda, apesar de ser a montadora que mais vende carros no País. Seu modelo Onix, que custa a partir de R$ 48 mil, está há três anos no topo da lista dos mais vendidos do mercado. Mesmo assim, o presidente da GM Mercosul, Carlos Zarlenga, informou que a empresa “teve prejuízo agregado significativo no período de 2016 a 2018 que não pode mais se repetir”. E reforçou que a montadora vive um momento crítico que “vai exigir importantes sacrifícios de todos e que 2019 será um ano decisivo para nossa história.”

Na última terça-feira, Zarlenga se reuniu com lideranças dos sindicatos dos metalúrgicos de São José dos Campos e de São Caetano, onde a GM tem fábricas em São Paulo, e com os prefeitos dos dois municípios, Felicio Ramuth e José Auricchio Júnior, para discutir um plano de viabilidade para a empresa. O plano requer apoio dos governos, concessionários, empregados, sindicatos e fornecedores e, segundo Zarlenga, do seu sucesso dependerão os novos investimentos e o futuro da GM. “Nós, obviamente, manifestamos nossa oposição a essa reestruturação que a companhia está fazendo, ao fechamento de plantas, às demissões e a todo esse projeto que busca descarregar nas costas dos trabalhadores uma crise que nem existe”, afirma Renato Almeida, vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos. “A situação apresentada pela GM é muito contraditória, eles não dimensionaram o prejuízo para nós e queremos que a empresa abra seus livros caixa para iniciarmos um processo de negociação”. A GM não quis se pronunciar sobre o assunto.

O blefe da líder de mercado

“A GM do Brasil teve uma prejuízo agregado significativo no período de 2016 a 2018 que não pode mais se repetir. 2019 será um ano decisivo para nossa história” Carlos Zarlenga, presidente da GM Mercosul

Uma das finalidades imediatas da ameaça da GM de fechar fábricas ou deixar o País é conseguir vantagens fiscais e pressionar os metalúrgicos para que haja redução dos custos de mão-de-obra. O governo de São Paulo, através do secretário da Fazenda, Henrique Meirelles, indicou que poderá conceder incentivos fiscais para a GM e, consequentemente, para todas as montadoras do estado. Meirelles reconhece dificuldades no setor e cogita antecipar créditos do ICMS a que a indústria tem direito em troca do abatimento imediato de impostos devidos.

Apesar do mercado de veículos ter sofrido uma queda brusca entre 2014 e 2016, nos últimos dois anos ele apresenta tendência de retomada. No ano passado, por exemplo, o licenciamento de carros novos cresceu 13% e a GM viu seu volume de vendas aumentar 11,7%. A empresa comercializou 434,3 mil carros e veículos comerciais leves no País. Mesmo assim, alega que teve prejuízos estimados em R$ 1 bilhão no período. Mundialmente, a empresa tem apresentado resultados positivos e, no terceiro trimestre do ano passado, teve lucro de US$ 2,53 bilhões. A GM controla quatro fábricas no Brasil. Além de São Caetano e São José dos Campos, tem unidades em Gravataí (RS) e Joinville (SC), onde produz motores. Em São Caetano são feitos os modelos Onix, Cobalt, Spin e Montana. De Gravataí, saem o Onix e o Prisma. E a unidade de São José dos Campos, com 4,8 mil trabalhadores, produz a picape S-10 e a SUV Trailblazer, além de motores e transmissões. A GM emprega cerca de 16 mil trabalhadores no País e cogita o corte de 20% do pessoal.

Negócios globais

Nos últimos dois anos, a GM dá sinais de perda de interesse por alguns mercados emergentes. Fechou fábricas na Rússia, na Indonésia e diminuiu operações na Tailândia. Também estuda vender a Opel para a PSA Peugeot Citröen e suspender operações na Índia e na África do Sul. Em um plano de reestruturação anunciado em novembro, a presidente mundial da GM, Mary Barra, comunicou que fechará quatro fábricas nos Estados Unidos, uma no Canadá e mais duas em outras regiões. No Brasil, a fábrica que está mais ameaçada é a de São José dos Campos. Ela tem sido preterida nas últimas rodadas de investimento da montadora e, desde 2012, quando perdeu as linhas de produção de modelos populares, é um foco de tensão entre a empresa e o sindicato.O blefe da líder de mercado