Álbum – Mauro Restiffe/Estação Pinacoteca, SP/ até 5/11

“Album” reúne 143 imagens do arquivo de Mauro Restiffe feitas nos últimos 20 anos, mas não é uma retrospectiva. Apresenta imagens inéditas, sem ser uma mostra de trabalhos novos. A exposição em cartaz na Estação Pinacoteca, em São Paulo, é a melhor definição de um “projeto curatorial”, visivelmente um fruto do intenso diálogo entre o fotógrafo Mauro Restiffe e o curador Rodrigo Moura.

O fato desse diálogo ter durado três anos, ao longo dos quais foram examinadas cerca de 30 mil imagens para dali serem extraídas as 143, é um detalhe importante, mas não decisivo. Ao fim desse processo, Moura poderia ter optado por uma exposição “convencional” de fotografias, com um discurso linear – cronológico ou não. Mas esta não é simplesmente uma exposição de fotografias. É uma exposição de imagens em diálogo. De fotografias em conversa com outras fotografias e com 25 pinturas dos acervos da Pinacoteca e do MASP.

As imagens são apresentadas em grupos, criando frases, sentenças que somam-se umas às outras, compondo o grande texto visual da mostra, ao longo de três salas. O título, “Álbum” anuncia: há uma narrativa autobiográfica nesse conjunto, composto por imagens pessoais – do cotidiano familiar – e imagens profissionais – orientadas pelas pesquisas artísticas e jornalísticas de Restiffe.

Todo esse repertório pessoal do artista é observado pelo curador desde um ponto de vista da história da arte e dos gêneros pictóricos. Na primeira sala, as fotografias de viagens são ladeadas por pinturas de paisagens de João Batista Castagneto, Benedito Calixto, Alberto da Veiga Guignard, José Pancetti. Bastante eficiente o emparelhamento de “Proclamação da República” (1893), de Benedito Calixto, com “Empossamento Revisitado” (1993), que Restiffe faz de Brasília.

PROFISSIONAL Curadoria da exposição parte de um acervo de 30 mil imagens de Mauro Restiffe

Certamente há um dado de ineditismo em montar uma exposição de fotos de um artista em diálogo com ícones da história da pintura. Se Mauro Restiffe tinha em mente a tradição do nu feminino na pintura europeia, quando fotografava Lianna no colchão, Lianna descansando com Helena e Matheus, ou Lianna em quarto de hotel, não é possível saber. Há, em suas fotografias, a naturalidade e despretensão típicas de qualquer álbum de família. Mas, ao mesmo tempo, um rigor de olhar, de enquadramento e de instante fotográfico, próprios da composição artística. Além de tudo, há a fidelidade de Restiffe ao aparato analógico e a recusa do digital, o que garante ao trabalho certa aura.

Um outro argumento favorável ao paralelismo entre a fotografia e a pintura na exposição, é o fato de Restiffe ter em sua trajetória várias incursões ao registro de trabalhos de outros artistas, de outras pinturas e fotografias, um recurso que, finalmente, configura-se metalinguístico: representar a representação.

Roteiros
A pedra e a perda

Geologia doméstica – Marcia Xavier/Casa Triângulo, SP/ até 16/9

Os trabalhos que compõem a nova individual de Marcia Xavier na Casa Triângulo nasceram de uma perda. Um acidente, que danificou irreversivelmente um álbum de família, foi a chave para um processo auto-reflexivo sobre a fugacidade e a perenidade do tempo.

As fotografias antigas expostas à intempérie foram refotografadas e deram origem à série “Geologia Doméstica”, que também dá titulo à exposição. À erosão que desfigura cenas de um casamento, foram sobrepostos minerais – ágata, pirita, magnesita, cristal e mármore –, como que devolvendo-lhes um pouco da eternidade perdida.

Diante dos sete retratos nas paredes da galeria, três mesas expõem fotogramas do corpo da artista, deitado sobre papel fotográfico, reproduzido em tamanho natural. De aparência fantasmagórica e espectral, são imagens que traduzem o tempo fugaz. Foram impressas em quatro, três e dois segundos de exposição do corpo à luz.

A instalação “Santa” completa o ciclo temporal explorado por Marcia Xavier. Aqui, detalhes do corpo e das vestes de mármore de uma escultura da Santa Agnese, fotografada em Roma, são projetados em uma sala escura. Mas a perenidade do mármore é devorada pela imaterialidade da luz.

Num canto, escondido, um relógio de parede – apropriado da casa dos pais – a tudo assiste. PA