O aprendiz de twitteiroA mania de tuitar do presidente Jair Bolsonaro lembra Mickey Mouse no desenho animado “O Aprendiz de Feiticeiro” (1940), de Walt Disney. O rato é deixado sozinho na oficina do mestre. Sua tarefa é fazer a faxina no local. Como não quer dar duro, usa uma mágica que ele não domina e encanta o esfregão para que o utensílio faça o serviço no seu lugar. Mas o esfregão gera caos, arrancando os objetos e móveis e encharcando o chão. Mickey golpeia o esfregão com um machado. Mas este se duplica e se multiplica – e assim a cada golpe. Tudo parece perdido quando o feiticeiro volta para restaurar a ordem.

Também o feitiço virou contra o aprendiz de twitteiro. Bolsonaro se entusiasmou com a mágica do mestre Donald Trump, que lançou a moda de governar pelo microblog. Assim, desde que assumiu o governo ­­— ou “a selva”, como tuitou no dia da posse —, passou a disparar mensagens contra a classe artística, os inimigos políticos, militantes de esquerda e sobretudo contra a imprensa. Insultou jornalistas na velocidade de uma postagem a cada três dias. O mais recente foi contra Constança Marques, correspondente do jornal “O Estado de São Paulo”, a quem acusou de conspirar para derrubar o governo. Como se não bastasse, postou um vídeo pornográfico para condenar os supostos costumes lúbricos em moda no Carnaval. Assim, popularizou o “golden shower” junto à família brasileira.

Dessa forma, nosso bravo noviço aumentou o tom e desferiu machadadas contra o esfregão até que desagradou a todos, inclusive apoiadores e as categorias que votaram nele, como funcionários públicos, policiais, militares e empresários. A pancadaria se instalou nas redes sociais, com repercussões internacionais nada positivas. Feito Mickey, quase foi enxotado da oficina por um exército de rodilhas. Em meados da semana, a deputada Joice Hasselmann, líder do governo no Congresso, interveio e pediu a seu chefe uma pausa no destempero. O tom amenizou e a paz voltou a reinar, pelo menos por enquanto.

Imprensa x fake news

Bolsonaro não tem sabido se valer da mágica lançada pelo feiticeiro mor Donald Trump. Desde a campanha presidencial de 2016, o presidente americano passou a usar o Twitter como um instrumento de contato direto com cada um de seus eleitores. Eliminou, assim, a mediação racional exercida desde o século XVIII pela imprensa, rotina que construiu a base dos regimes democráticos. Substituiu o diálogo com a mídia tradicional pelos insidiosos esquemas da pós-verdade e da fake news e deixou para trás qualquer perspectiva iluminista. Mesmo assim, suas postagens são mais organizadas e eficientes que as do seguidor tropical.

O fato é que Bolsonaro lança mão do recurso de forma tão atabalhoada que corre o risco de enfraquecer e até abalar sua liderança como presidente da República. Não gere nem faz a necessária faxina no Estado. A restituir a ordem, prefere tuitar, fascinado pelo feitiço digital. Talvez seus eleitores e a população em geral gostassem de vê-lo governando e não experimentando fórmulas perigosas. Na visita a Trump, ele deveria solicitar uma sessão de coaching sobre como usar as redes sociais com seu mestre.O aprendiz de twitteiro