Mais popular força de oposição ao presidente Lula (PT), o grupo político de Jair Bolsonaro (PL) entrará no ano eleitoral de 2026 sem uma definição clara de quais rumos tomar na ausência do ex-presidente, que está inelegível e preso na superintendência da Polícia Federal por uma tentativa de golpe de Estado.
Depois de começar o ano com o governo petista registrando seus piores índices de aprovação, o bolsonarismo viu o STF (Supremo Tribunal Federal) condenar seu principal líder e tornar o ex-deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) réu, presenciou Lula recuperar popularidade com a reação ao tarifaço imposto pelos Estados Unidos e decidiu apostar no senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) como presidenciável.
Ano começou com queda de Lula
A queda de popularidade de Lula no início do ano animou a oposição. Mesmo com a menor taxa de desemprego da série histórica mapeada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e a alta do PIB (Produto Interno Bruto), erros políticos como a crise do Pix e a dificuldade em se relacionar com o Congresso minavam os resultados e fizeram o petista registrar seu pior índice de popularidade ao longo de três mandatos.
Embora o bolsonarismo explorasse a fragilidade, a inelegibilidade do ex-presidente até 2030 já estava decretada e juristas consideravam as chances de reversão remotas. Com o incumbente submergindo, o chamado “centrão” dava os primeiros sinais de rumo à oposição e preparava candidaturas paralelas.
Em abril, o STF concluiu a avaliação das denúncias que a PGR (Procuradoria-Geral da República) apresentou contra Bolsonaro e aliados por uma tentativa de golpe após as eleições de 2022 e tornou-os oficialmente réus. Com o processo aberto, o bolsonarismo considerava a condenação do ex-presidente “precificada” em razão da composição da Primeira Turma da corte, dominada por magistrados que condenaram os invasores do 8 de janeiro de 2023 a penas elevadas.
Tarifaço de Trump mudou o jogo
Com o pai réu, o ainda deputado Eduardo Bolsonaro havia pedido licença do mandato e se mudado aos Estados Unidos com o objetivo declarado de articular uma reação ao Judiciário brasileiro, em especial ao ministro Alexandre de Moraes, sustentada pela relação política com o presidente americano, Donald Trump.
As sanções, que começaram com a revogação de vistos de autoridades, ascenderam à imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros enviados aos EUA com menção de Trump à “caça às bruxas” promovida pelo Judiciário brasileiro contra Bolsonaro. Eduardo celebrou o tarifaço, mas o potencial danoso para a economia local foi amplamente rejeitado — inclusive por setores da direita.

Eduardo Bolsonaro: ex-deputado foi aos EUA articular sanções e acabou perdendo mandato
Nas semanas seguintes, Lula surfou no discurso de defesa da soberania nacional e associou reiteradamente a família Bolsonaro às taxas. Com a reação, o presidente viu sua popularidade reagir e mesmo integrantes do centrão que haviam se distanciado do governo voltaram a se aproximar.
Nesse contexto, o STF concluiu o processo e condenou Bolsonaro a 27 anos e três meses de prisão em regime inicialmente fechado — o ex-presidente já estava em prisão domiciliar, desde agosto, por descumprimento de medida cautelar imposta pela corte. Numeroso no Congresso, o bolsonarismo manteve a aposta na aprovação de um PL (Projeto de Lei) que anistiasse o político e condenados pela invasão do 8 de janeiro.
O esforço por protagonismo
A condenação minou as já improváveis chances de que Bolsonaro recuperasse seus direitos políticos e animou candidaturas alternativas no campo da direita. Embora se opusessem publicamente à condenação do ex-presidente, os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), aproveitaram o cenário para reiterar os planos de concorrer ao Palácio do Planalto.
Em movimento menos explícito, dirigentes de PP e União Brasil articulavam para que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), topasse a empreitada — ainda com Ratinho Júnior (PSD), mandatário do Paraná, como “plano B”. O ex-ministro de Bolsonaro chegou a dar sinais de que embarcaria na ideia ao negociar, em Brasília, por um projeto de anistia que tirasse o ex-chefe da cadeia, mas o mantivesse inelegível, e atacar pela primeira vez Alexandre de Moraes durante uma manifestação de 7 de Setembro na avenida Paulista.

Tarcísio de Freitas: preferido do ‘centrão’, governador não recebeu aval público de Bolsonaro para concorrer à Presidência
Isolado nos EUA e atrelado à pecha do tarifaço de Trump, Eduardo Bolsonaro se colocava como presidenciável do “bolsonarismo raiz” sem empolgar outras alas políticas; a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) também ganhava menções sem grande entusiasmo.
Condenado e aguardando a ida para a cadeia, Bolsonaro não avalizou qualquer candidatura do grupo e foi transferido para a superintendência da Polícia Federal, em Brasília, depois de tentar romper a própria tornozeleira eletrônica. Fragilizado pela ausência do líder das articulações, o grupo apostou no PL da Dosimetria como alternativa para reduzir o período do ex-presidente na cadeia — o texto foi aprovado no Congresso.
Flávio Bolsonaro presidenciável
Arriscada a perder a cabeça da principal chapa de oposição a Lula, a família lançou Flávio Bolsonaro como presidenciável em 5 de dezembro. Dois dias depois do anúncio, o próprio senador colocou um “preço” para se retirar da corrida. “Meu preço é justiça. Não é só justiça comigo, é justiça com quase 60 milhões de brasileiros que foram sequestrados, estão dentro de um cativeiro, nesse momento, junto com o presidente Jair Messias Bolsonaro. A única forma disso [desistência] acontecer é se Bolsonaro estiver livre, nas urnas”, disse à TV Record.
O gesto foi interpretado como uma estratégia do bolsonarismo para assegurar apoio do centrão a um projeto de anistia; diante da improbabilidade desse desfecho, no entanto, cenários começaram a ser calculados com Flávio na corrida. Parlamentares da ala mais ideológica apoiaram a empreitada do senador, assim como o governador Tarcísio de Freitas. Outros presidenciáveis do campo, Zema e Caiado reafirmaram suas candidaturas.
Para Marcelo Vitorino, professor de marketing político da ESPM-SP e responsável pelas campanhas de Gilberto Kassab (PSD) à prefeitura de São Paulo e do ex-prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (Republicanos), o cenário mais provável é de fragmentação e consequente favoritismo de Lula à reeleição.
“Há uma pulverização de candidaturas de direita e, do outro lado, uma unificação do campo da centro-esquerda. Com a pulverização extrema e alternativas que não despertam paixão [sem o ex-presidente], Lula tem chance até de vencer no primeiro turno“, afirmou à IstoÉ. Na última pesquisa Quaest divulgada em 2025, o petista registrou 46% das intenções de voto contra 36% de Flávio no cenário de segundo turno testado.