Os povos indígenas vêm sendo especialmente castigados pela pandemia, falta de recursos para a saúde e pelo desleixo da Fundação Nacional do Índio (Funai). Se a população em geral está sofrendo, minorias étnicas sofrem ainda mais. Levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostra que até o início de dezembro, a Funai gastou apenas 52% dos recursos destinados ao enfrentamento do novo coronavírus entre os indígenas. Dados compilados pelo Comitê Nacional de Vida e Memória Indígena, juntamente com ONGs, apontam que até segunda-feira 4, 43.524 casos de Covid-19 foram confirmados entre índios de 161 etnias. Do total de casos, 902 resultaram em óbitos. Os números reais são superiores aos apresentados pelo governo federal, que tenta minimizar tudo que se refere à pandemia. Pelos dados oficiais, as mortes entre indígenas por causa da doença foram 507.

Há deficiências antigas relacionadas ao planejamento e à execução de programas de saúde orientados para a população indígena, detectadas em relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União (CGU) no mês passado. O relatório se refere a gastos realizados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) em 2019 e aponta que cerca de 70% dos contratos firmados pelo órgão foram superfaturados. Os gastos da Sesai totalizaram R$ 1,5 bilhão para atender uma população de cerca de 765 mil indígenas. Os valores das irregularidades podem ser superiores, uma vez que o governo, segundo a CGU, não apresentou a relação de contratos emergenciais firmados para os serviços de transporte desde 2016. Ligada ao Ministério da Saúde, a Sesai é responsável pela elaboração da política nacional de saúde Indígena (Pnaspi). Entre as comunidades atendidas pelo programa está a Yawalapitis, do norte de Mato Grosso, que, em agosto, perdeu o cacique Aritana para a Covid-19. A aldeia dos Yawalapitis não foi a única a engrossar as mórbidas estatísticas. As mortes causadas pelo coronavírus no meio indígena estão em curva ascendente diária e são aceleradas por ações preventivas equivocadas.

VERGONHA Posto do Sesai no Alto Rio Solimões: gastos irregulares e contratos superfaturados (Crédito:Divulgação)

As irregularidades apontadas pela CGU se materializam em prejuízos para a saúde indígena. Um exemplo citado pela CGU se deu em uma unidade no Tocantins, onde foram identificadas manipulações processuais na cotação de preços. O objetivo, segundo o órgão, foi superfaturar o valor máximo a ser aceito no pregão para a escolha de prestadores de serviços. Em nota, o ministério afirmou que a Sesai “passa por aprimoramentos constantes e cria estruturas de controle e integridade de boas práticas de governança”. Só não soube explicar quais são essas boas práticas, já que a situação é caótica.