O diagnóstico dos especialistas é contundente: os mares, os solos e os seres vivos que eles abrigam estão ameaçados pela destrutiva mão do homem, que deve fazer a “paz com a natureza” para evitar um desastre.
Esta é uma análise dos principais números das negociações sobre biodiversidade da COP16, retomadas em Roma em 25 de fevereiro, após o fracasso parcial em Cali.
– 75% da Terra alterada pela humanidade –
Por volta de 75% da superfície terrestre sofreu uma degradação significativa nas mãos do homem, incluindo florestas destruídas e ecossistemas urbanizados ou convertidos em terras cultiváveis. As terras úmidas, as mais afetadas, perderam 87% de sua área nos últimos três séculos.
Essas são as conclusões da IPBES, uma plataforma de especialistas em biodiversidade da ONU.
As consequências são variadas: perda de habitat para a fauna, solos sem nutrientes e inférteis, menor absorção de CO2, deterioração da qualidade do ar, risco de zoonoses e menor disponibilidade de água potável, entre outras.
“A degradação da terra por atividades humanas está comprometendo o bem-estar de pelo menos 3,2 bilhões de pessoas”, avaliou a IPBES em 2018. E “a população em áreas áridas passará de 2,7 bilhões em 2010 para 4 bilhões em 2050”.
Nem tudo está perdido: “os benefícios de restaurar solos são dez vezes superiores ao custo de destruí-los”, segundo a plataforma científica. Um dos 23 objetivos acordados na COP15 é de que os países restaurem 30% das terras degradadas até 2030.
– Um milhão de espécies ameaçadas –
Das 8 milhões de espécies animais e vegetais que há no planeta, um milhão estão ameaçadas de extinção, segundo a IPBES. Para chegar a esse número, a plataforma científica utilizou uma estimativa “conservadora” de 10% das espécies de insetos em risco, ou seja, quase 600.000.
O total de espécies em perigo de extinção é 20 vezes superior ao lista vermelha da UICN, a referência mundial, que enumera 46.000 espécies ameaçadas. Mas o inventário da UICN se limita a 166.000 espécies sobre as que há dados científicos sólidos.
Os polinizadores, essenciais para a reprodução das plantas e 75% dos cultivos que alimentam a humanidade, são especialmente vulneráveis.
Os corais, dos quais dependem 850 milhões de pessoas para se alimentar e trabalhar, são outro exemplo preocupante: esse animais, cujos recifes abrigam uma imensa fauna e protegem o litoral atuando como quebra-mares, estão morrendo em velocidade recorde devido à acidificação e ao aquecimento dos oceanos. Em um mundo, 1,5ºC mais quente que na era pré-industrial, desapareceriam entre 70 e 90%. Se a temperatura aumenta a 2ºC a perda será de 99%.
– Os cinco cavaleiros do apocalipse –
Para a ONU, a crise da biodiversidade tem cinco fatores, todos de origem humana, apelidados de “Cinco Cavaleiros do Apocalipse”. Em ordem decrescente de preocupação, são eles: destruição do habitat, superexploração de recursos, mudança climática, poluição e espécies invasoras.
Somente a destruição do habitat causou uma perda de 2 a 11% da biodiversidade global durante o século XX, de acordo com um estudo publicado na revista Science em abril. Mas é o aquecimento global que pode se tornar a principal causa da destruição da natureza até 2050, de acordo com os autores.
– Metade do PIB mundial depende da natureza –
Mais da metade (55%) do Produto Interno Bruto mundial, ou 58 trilhões de dólares (330 trilhões de reais), depende “moderada ou fortemente” da natureza e de seus serviços, de acordo com a gigante de auditoria PwC.
A agricultura, a silvicultura, a pesca e a aquicultura, bem como os setores de alimentos, bebidas e construção, são os mais expostos. O que seria da economia global sem grãos, madeira, peixes, café, couro e borracha?
A polinização, a água e o controle de doenças também são contabilizados como “serviços prestados pela natureza”, um conceito onipresente nos textos da COP, mas rejeitado pelos ambientalistas, que o veem como uma forma de “mercantilizar” e “escravizar” a natureza.
– Bilhões de dólares em “subsídios prejudiciais” –
A natureza presta serviços inestimáveis à humanidade, mas o dinheiro público é usado para promover atividades que a prejudicam: extração de combustíveis fósseis, pesca excessiva, agricultura intensiva e muito mais.
Quanto eles valem? Uma das metas do acordo de Kunming-Montreal (COP15) era quantificar os subsídios ou isenções fiscais “prejudiciais” até 2025 e reduzi-los em “pelo menos US$ 500 bilhões por ano” até 2030.
O valor desses “subsídios prejudiciais ao meio ambiente” foi estimado em até US$ 2,6 trilhões por ano, ou 2,5% do PIB global, pela Earth Track.