O governo do Rio de Janeiro divulgou no início da tarde desta quarta-feira, 29, que ao menos 119 pessoas, incluindo quatro agentes, foram mortas durante a megaoperação nos complexos da Penha e do Alemão, na terça-feira, 28. Ainda segundo o secretário, 113 pessoas foram presas e 10 adolescentes apreendidos. O número de mortos, no entanto, difere do balanço da Defensoria Pública do estado do Rio de Janeiro, que afirma que ao menos 132 pessoas foram mortas.
O balanço oficial indica que a megaoperação superou a quantidade de mortos durante o “Massacre do Carandiru”, quando 111 detentos foram mortos na Casa de Detenção de São Paulo. Na ocasião, nenhum policial morreu.
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O que foi o ‘massacre do Carandiru’?
Considerado a mais violenta ação policial dentro de uma penitenciária brasileira, o massacre ocorreu na tarde do dia 2 de outubro de 1992, por volta das 14h, véspera de eleições municipais, após dois detentos brigaram no Pavilhão 9, na Casa de Detenção de São Paulo, um complexo penitenciário que foi construído nos anos 1920, no bairro do Carandiru, na zona norte de São Paulo. O complexo era formado por sete pavilhões. Na época, 7.257 presos viviam no local, 2.706 deles só no Pavilhão 9, onde estavam encarcerados os réus primários, aqueles que cumpriam sua primeira pena de prisão ou que ainda aguardavam julgamento.
A briga entre os detentos logo se generalizou e se transformou em uma rebelião. Foi então que a Polícia Militar (PM) foi chamada para conter o conflito. Depois da falha em uma tentativa de negociação com os presos, o comando policial decidiu entrar no local com metralhadoras, fuzis e pistolas. No total, 341 policiais da Tropa de Choque da Polícia Militar do Estado de São Paulo foram mobilizados.
Meia hora depois da entrada da PM, “as metralhadoras silenciaram”, contou o médico Drauzio Varela, em seu livro Estação Carandiru. O resultado da violenta ação policial no local, que mais tarde ficou conhecido como o Massacre do Carandiru, foi a morte de 111 detentos, sendo que 84 deles sequer tinham sido julgados e condenados por seus crimes.
Evidências posteriores confirmaram que presos foram fuzilados com armas como fuzis AR-15 e submetralhadoras HK e Beretta. Não raras vezes, aquele dia é lembrado como o ápice da falência do sistema prisional brasileiro. Depois da repercussão da chacina e muita pressão de ativistas de direitos humanos, houve uma revisão da política prisional, sobretudo no estado de São Paulo.
A repercussão internacional fez com que o Brasil fosse denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização de Estados Americanos (OEA).
Megaoperação é a mais letal do Rio
A megaoperação contra integrantes do Comando Vermelho nos complexos do Alemão e da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro, é também a mais letal da história do Estado, de acordo com dados do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF).
De acordo com o relatório Chacinas Policiais, produzido pelo Geni/UFF, no período de 2007 a 2021, foram realizadas 17.929 operações policiais em favelas na Região Metropolitana do Rio, das quais 593 terminaram em chacinas, com um total de 2.374 mortos. Isso representa 41% do total de óbitos em operações policiais no período.
Veja as operações mais letais no Rio de Janeiro:
- Complexos do Alemão e Penha: 119 mortos, 2025
- Jacarezinho: 28 mortos, 2021
- Penha: 23 mortos, 2022
- Complexo do Alemão: 19 mortos, 2007
- Complexo do Alemão: 17 mortos, 2022
Além disso, o estudo mostra que o Jacarezinho era, até então, a localidade com o maior número de mortos em chacinas. Em média, a cada 10 operações realizadas no Jacarezinho ocorrem 7 mortes.
O relatório também aponta que das 593 chacinas policiais ocorridas entre 2007 e 2021, 64,6% ocorreram na capital (383 ocorrências, com 1.599 mortos), 21,4% na Baixada Fluminense (127 ocorrências, com 475 mortos) e 14,0% no Leste Fluminense (83 ocorrências, com 300 mortos), portanto, a região que concentra o maior número de chacinas é a capital, seguida da Baixada Fluminense e do Leste Fluminense.
No total, cerca de 2,5 mil policiais civis e militares participaram da ofensiva desta terça-feira. No Alemão e na Penha, 48 escolas tiveram as atividades afetadas. Além do clima de medo nas favelas, houve interferência na Linha Amarela e tentativas de bloqueio da Avenida Brasil.