08/06/2016 - 11:40
Estou sentado, almoçando num restaurante qualquer de São Paulo.
No Brasil não é comum jantar sozinho.
Brasileiro é gregário, amistoso.
Comer sozinho faz com que as pessoas desconfiem de você.
Evitam olhar, como se você fosse pedir para sentar em suas mesas.
A vantagem é que, de onde estou, cercado de mesas ocupadas por casais, posso observar os comportamentos alheios como se fosse invisível.
Já vi e ouvi de tudo.
Uma vez um playboy se gabava sedutor para a futura conquista quando, na empolgação, disparou:
– Aí, a gente alí dançando, ela se engraçou com outro sujeito.
– E você? – a moça pergunta ingênua, dando mais uma mordida no hambúrguer.
– Ah, eu enchi a mão na cara dela.
A garota, o garçom, eu, o resto do restaurante, todos pararam de falar.
Acabou ali a noitada do moço.
Volto pro meu sanduíche.
Brigas das mesas ao lado são sempre deliciosas.
Até bem acompanhado vale ficar em silêncio para ouvir o barraco ao lado.
– Mas não dá para contar com você para nada mesmo.
– Como assim?
– Décio, escuta de uma vez: você é um bosta.
Engasgo com a farofa.
Hoje estou num bistrô.
Na mesa a minha direita, um casal de uns setenta anos de idade.
Cinquenta de casados, fácil.
Estão apaixonados.
Ele tem a mão esquerda sobre a dela para deixar a direita livre para o macarrão.
Ela olha com o orgulho como se tivesse cozinhado para o marido.
Já acabou sua sopinha.
Ele levanta a cabeça e ameaça falar alguma coisa.
Desiste.
O macarrão está bom demais.
Do meu lado esquerdo, um casal mais jovem.
Reparei desde que entraram, colados cada um em seu celular.
Entraram, sentaram e não trocaram nenhuma palavra.
Riem, fazem gestos com a cabeça, mas não se olham.
Estão entretidos demais.
A tela ilumina seus rostos como num filme de terror.
Escuto a mulher da direita cochichando para o marido:
– Que horror essa gente que não larga o celular.
Nem mesmo quando o garçom veio tirar o pedido tiraram os olhos da tela.
Já sabiam o que pedir.
– Dois Nhoques Mediterrâneo – ele pede de cabeça.
– Uma Coca Zero e uma água com limão e gelo. – ela completa batucando na tela.
Volto para o casal de apaixonados.
A sobremesa chegou.
Merengue com morangos.
Ela sorri.
Adora ver o marido dissolver o merengue na boca com um estalinho.
– Shhhh Agenor…não faz barulho!
Ele levanta a cabeça calmo.
Com um olhar entediado, foca nos olhos da mulher:
– Para mim chega.
– O que meu amor? – ela pergunta suspeitando que ele esteja satisfeito. Só eu entendi.
– Chega. Não suporto mais viver com você.
Ela retira a mão de sob a dele, lenta e tremula.
Olha para mim.
Desvio o olhar para o outro lado para não constrange-la justamente quando o sujeito grita para a mulher:
– Ganhei de novo!!!! hahahahaha. Eu sou monstro nesse jogo. – grita como se estivessem sozinhos.
A mulher joga o telefone de lado, divertida, agarra o sujeito pelo pescoço e tasca-lhe um beijo apaixonado.
– Droga! Você é demais nessa porcaria! Mas eu te amo assim mesmo. – e sorri.
Volto para a mesa da sobremesa.
Os olhos da mulher estão cheios de lágrimas, cabeça baixa.
O que ela não daria para estar enfiada num celular.