Primeiro, as boas notícias: o Chile escolheu um jovem novo presidente, Gabriel Boric, de 36 anos, que superou com larga vantagem seu oponente radical, José Antonio Kast, no segundo turno, dia 19. Com isso, o país se afasta da onda extremista de direita que teve Donald Trump como maior líder, e Jair Bolsonaro, o mais grotesco. Como Bolsonaro, Kast era nostálgico da ditadura de Pinochet e defendia uma pauta de costumes arquiconservadora. Além disso, seu pai havia sido um membro do partido nazista alemão. A América Latina se livrou de uma figura sombria.

O problema é que Boric tem poucas chances de ser bem-sucedido em suas promessas. O Chile é uma das economias mais liberais da América Latina, com alto índice de crescimento. Ele promete “enterrar o neoliberalismo” e criar um Estado de bem-estar social. Pretende acabar com os fundos de pensão privados e o sistema de aposentadoria atual (o que é uma boa providência, já que ele falhou; Paulo Guedes fracassou em reproduzir ele no Brasil, felizmente, mas essa é outra história). Boric também deseja aumentar os impostos, o que vai reduzir o crescimento e afastar investimentos. É pouco provável que consiga manter as contas públicas sob controle querendo transferir ao Estado tantas responsabilidades em um prazo tão curto.

Apesar de ter virado um candidato popular na esteira de protestos estudantis e propondo reformas sociais de difícil implementação, ele moderou seu discurso para vencer o pleito. Mostrou-se um negociador hábil, realista e pragmático. Além disso, manteve a tradição de civilidade da política chilena, exibindo uma relação cordial com o candidato derrotado e com o atual presidente conservador. A nova Constituição será votada no segundo semestre de 2022, e será um teste duro para ele também. Até o momento, ela parece mais uma carta de intenções irreal que vai levar o Chile para a mesma armadilha vivida pelo Brasil: amplos direitos sociais garantidos pela Carta, mas sem nenhum plano factível para garanti-los.

O maior risco é o novo líder sucumbir ao velho populismo de esquerda que continua incrustrado no continente. Maduro (Venezuela), Alberto Fernández (Argentina), Ortega (Nicarágua) e Pedro Catillo (Peru) não representam nenhuma esperança democrática ou de transformação econômica. Lula também não dá nenhum sinal positivo com suas propostas regressivas no Brasil. Boric, ao contrário, disse que se espelha na social-democracia nórdica e no exemplo do Uruguai, que soube fazer uma administração mais moderna e social. Seria ótimo que ele impusesse uma modernização na região. Mas, a julgar pelas suas promessas desmesuradas, pode representar mais um regresso.