SÃO PAULO, 18 DEZ (ANSA) – Pouco mais de um ano após ter inaugurado uma nova fábrica em Sorocaba (SP), a multinacional italiana de fios e cabos Prysmian mantém o otimismo em relação ao mercado brasileiro e diz que a pandemia do novo coronavírus não mudou seus planos de longo prazo no país.   

A unidade de Sorocaba é a sede do grupo para a América Latina, mercado no qual o Brasil responde por 40% a 50% do faturamento, dependendo das movimentações cambiais. Se na época da inauguração da fábrica a empresa apostava nos setores de telecomunicações e energias limpas, isso não mudou com a Covid-19.   

“Em longo prazo, nossa direção e missão continuam”, diz o CEO da Prysmian para a América Latina, Juan Mogollón, em entrevista exclusiva à ANSA. Durante a conversa, o executivo também falou sobre as mudanças aceleradas pela pandemia e as expectativas em relação ao Brasil, incluindo o aguardado leilão do 5G e os desafios no setor energético. Confira: Há um ano, a Prysmian inaugurava sua fábrica em Sorocaba, mas certamente vocês não imaginavam que em 2020 estariam frente à maior pandemia em um século. Como a Covid-19 mexeu com o planejamento da empresa para este ano? Em longo prazo, não mudou nada. Nosso compromisso continua igual, talvez ainda maior do que no ano passado, quando fizemos essa inauguração. Nossos investimentos continuaram iguais neste ano, com a expansão das plantas de produtos para telecomunicações e linhas de transmissão. Em longo prazo, nossa direção e nossa missão continuam.   

Em curto prazo, primeiro tivemos uma reação imediata para focar nos segmentos de que o mercado precisava, os chamados produtos essenciais. Tivemos muita ênfase na parte de telecom e energia.   

E fizemos um pouco de contração nos produtos em que diminuiu a demanda, como automotriz ou óleo e gás.   

Vivemos uma situação de muita incerteza sobre quando o Brasil vai sair da pandemia. Qual é o desafio de planejar as atividades da empresa no curto prazo sem saber quando a situação vai voltar a algo parecido com a normalidade? Infelizmente, não tenho a resposta, mas posso compartilhar os elementos que usamos para o planejamento com ou sem Covid. Como todos sabemos, a situação do ponto de vista de saúde ou da sociedade entrará na fase de normalização quando a vacina for comercializada, o que seguramente vai acontecer na primeira metade do próximo ano.   

Mas isso não quer dizer que a situação vá mudar imediatamente.   

Haverá um período longo de recuperação, e nós estamos assumindo que a recuperação no Brasil, ao menos para nosso negócio, começará na segunda metade do ano.   

No curto prazo, no próximo mês ou dois meses, estamos muito alertas, porque o número de casos também subiu no Brasil, e isso nos preocupa muito. Temos um plano de contingência para os próximos dois meses para sobreviver a uma possível repetição do pico.   

Como a pandemia afetou a vida dentro da empresa? Eu sinto, pessoalmente e com meu time, que a pandemia nos uniu mais. É incrível, mas, apesar de trabalharmos de casa, eu sinto que conheço mais e melhor o meu time do que antes da pandemia.   

Isso trouxe uma união incrível, uma ligação que é difícil conseguir em uma situação normal.   

Quase todas as nossas plantas na América Latina estão na mesma área dos escritórios administrativos. A primeira coisa que fizemos, em março, foi colocar todo o pessoal administrativo na América Latina em home office porque queríamos evitar contaminar a produção. Temos nove meses trabalhando de casa, e estamos trabalhando muito bem.   

Na parte de produção, começamos iniciativas muito agressivas para ajudá-los a se manter saudáveis contra a Covid, como transporte e testes, incluindo nos familiares, para manter baixos o absenteísmo e o nível de contágio. Por enquanto, funcionou bem. Tivemos alguns casos, mas não a ponto de fechar a planta.   

No ano passado, a Prysmian disse que a melhor oportunidade no Brasil seria no setor de telecomunicações e que também apostava em energia sustentável. Esses mercados continuam sendo o principal foco da empresa no Brasil? 100%, e expandimos nossa produção nos dois segmentos. Telecom continua sendo uma prioridade por causa da expansão da internet de banda larga no Brasil, e nós somos um dos principais fornecedores de cabos nesse segmento. E o outro – produtos de energias renováveis, como eólica e solar – continua sendo uma força de crescimento grande.   

O fato de duas empresas líderes nesses setores também serem italianas (TIM e Enel) abre portas para a Prysmian? O fato de que sejam italianas não muda a relação de negócios. O que faz a diferença é que já temos experiência trabalhando com as duas. Conhecemos as empresas, conhecemos suas formas de operar, as empresas conhecem nossos produtos, e isso é forte.   

Isso é o que faz diferença.   

O mês de novembro evidenciou uma grande carência do Brasil em termos de energia com o apagão no Amapá. De que forma isso abre oportunidades no país? Infelizmente, isso que aconteceu no Norte trouxe à luz pública alguns dos desafios que já existiam. Esses desafios não são novos e não existem somente no Brasil, mas também em outros lugares da América Latina. E por isso que nós da Prysmian temos tanto sucesso na América Latina. Estamos no meio dos produtos de que se precisa para expandir a energia em lugares como o Norte do Brasil. Temos muitas prospecções, estamos expandindo a força de venda e técnica nessa área. Há um mês, abrimos em Sorocaba um laboratório para apoiar o desenvolvimento de novos produtos na área de transmissão de energia, porque a demanda por produtos continuará por muitos anos.   

Outro foco da Prysmian é o 5G. O leilão já foi adiado algumas vezes e agora está previsto para o primeiro semestre de 2021.   

Como a empresa vê esse mercado? Somos um dos principais fornecedores para intermediários desse mercado. Temos um segmento que se chama ISP, que são aqueles pequenos provedores na área de telecomunicações, um segmento que está crescendo muito no Brasil. Já estamos sentindo a demanda por produtos, ao ponto em que nossas plantas de telecom estão lotadas. Estamos muito emocionados com isso.   

As objeções na União Europeia sobre o acordo comercial com o Mercosul de alguma forma preocupam a Prysmian? Esse acordo é importante, certamente, não vou diminuir sua importância, mas, para nós na América Latina, especialmente no Brasil, são mais importantes nossos acordos com a China, porque a China é o maior consumidor de commodities e dos recursos naturais do Brasil, como mineração e agricultura. Para nós, a relação comercial com a China é mais importante. Não me refiro à parte política, me refiro ao intercâmbio comercial.   

Mas a recente tensão política entre Brasil e China preocupa a Prysmian? Não, não, porque a realidade é que a América Latina fornece 40% do cobre do mundo, entre Chile e Peru, e o consumo e a demanda por cobre por parte da China continuarão, assim como por produtos de agricultura e mineração do Brasil, apesar de algumas diferenças políticas. Então nos preocupa, sim, mas não é o que mais nos preocupa.   

A Prysmian também passou por algumas mudanças internas ao longo do ano, inclusive com o aumento do número de mulheres em cargos de liderança. O que desencadeou esse processo? Mudanças são essenciais, sempre devem existir em uma empresa, porque o mercado muda, e à medida em que o mercado e o negócio mudam, os líderes têm de evoluir ou transformar as organizações.   

Contudo, a Covid acelerou coisas que já estavam no horizonte. No setor de energia, por exemplo, temos muitos talentos, muitos bons produtos, e uma das coisas que fizemos foi colocar isso com uma mulher que gerencia todo esse setor para nós na América Latina.   

E na parte de telecom, também colocamos todas as unidades de negócios sob um único guarda-chuva , para poder ver todo o mercado como um só e todos os produtos em uma única cesta. Em outro ponto, temos também a inclusão, sobretudo de gênero.   

Um exemplo disso é a própria Alba [Portela, que acompanhou a entrevista], que tinha a posição de marketing de Brasil e agora tem o marketing e comunicação de toda a América Latina. A Covid foi um acelerador muito importante. Nos tempos difíceis, a Covid nos ajudou a estar mais unidos e a valorizar todas as opiniões.   

(ANSA).