Fake news são a bola da vez.

Natural, afinal fazia tempo que não surgia uma ferramenta tão eficiente para prover sucesso e conquistar amigos.

Fake news servem para tudo. Veja o presidente Trump.

Exímio na arte de inventar notícias, ele se elegeu apoiado por uma intrincada rede de fake news e, quando acusado de alguma trapalhada, faz o quê?

Alega que a patacoado não passa de fake news e problem solved.

Dizem até que outros presidentes pelo mundo aprenderam essa importante lição.

Com eficácia comprovada, o fenômeno deixou de ser prerrogativa de políticos antenados com a modernidade e contaminou outras áreas de atuação.

A diretoria de um time de futebol está sendo pressionada?

Tasca uma fake news afirmando que vai contratar outro treinador e pronto.

Fica todo mundo feliz por mais uma semana.

Depois é só explicar que o tal técnico não aceitou — fake news de novo — e pimba na gorduchinha.

A verdade é que as fake news são, hoje, um skill, como dizem os coachs, já que termos em inglês também são um importante asset.

Tem mais notícia boa.

Em torno das fake news começou a surgir uma verdadeira indústria.

Basta conferir o caso da empresa de locação de jatinhos particulares que oferece pacotes para você pode ser fotografado na cabine, sem que o avião precise sequer decolar.

Já contratei o pacote Luxury, onde serei fotografado com uma comissária de bordo dinamarquesa servindo Veuve Clicquot sem nem precisar sair do hangar.

São as fake news gerando empregos!

É caro, mas não economizo quando o assunto é minha imagem.

Só existe um problema.

Aos poucos nosso critério sobre onde cabe usar uma bela fake news se torna mais elástico.

Escolher um presidente ou postar uma foto fake não prejudica ninguém.

Mas tem gente perdendo a mão e usando fake news em assuntos onde a verdade deveria imperar.

A consequência é o surgimento de uma espécie de fake reality.

No universo paralelo, apoiado por inverdades, onde estamos vivendo já há algum tempo, tudo é aceitável e ninguém é obrigado a assumir responsabilidade nenhuma.

Recentemente assistimos duas tragédias: Brumadinho e o CT do Flamengo.
Desgraças que causaram a morte de centenas de inocentes.

Ocorre que quando tomados os depoimentos dos responsáveis e do governo, o resultado é um flagrante caso de fake reality, onde todos lamentam, mas ninguém tem culpa.

Aos poucos, somos levados a acreditar que, no fundo, essas imperdoáveis tragédias ocorreram por fatalidade.

Com o tempo, a fake reality que vai sendo construída em nosso cotidiano permite acreditarmos que não existe incompetência ou má-fé e que tudo não passa de desastre natural ou obra do acaso.

Na fake reality americana, um muro dividindo dois países não é uma coisa sem pé nem cabeça.

Já por aqui, jovens atletas vivendo longe das mínimas condições de segurança não são coisa revoltante.

Vistorias em barragens e obras públicas estão sempre em dia e o viaduto caiu porque era impossível evitar.

Aos poucos somos envolvidos por uma bruma densa de surrealismo onde uma ministra alega publicamente que se tornou doutora por obra e graça do Espírito Santo ou que Lula está sendo perseguido por ser forte candidato ao Nobel da Paz.

O máximo que a gente faz é sorrir amarelo. Ou engolir a próxima fake news que justifique nossa ingenuidade e nos permita seguir em adiante.