Nos EUA, a eleição presidencial de 2024 já começou

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Pelo lado Republicano, Donald Trump tentará voltar ao poder Foto: MANDEL NGAN / AFP

A relativa previsibilidade da política norte-americana sempre foi um fator de estabilidade para o resto do mundo. A constante alternância de poder entre Republicanos e Democratas desde a eleição de Jimmy Carter, em 1976 – com governos de quatro ou oito anos, dependendo do sucesso do mandatário na busca pela reeleição –, permitia certo grau de assertividade nos cenários a longo prazo. E com exceção de uma ou outra medida, o fato de haver um Democrata ou Republicano na Casa Branca não exercia grande impacto na vida do americano médio, uma vez que as decisões mais relevantes são tomadas no âmbito dos governos e legislativos estaduais.

Isso mudou em 2016, com a eleição de Donald Trump. A partir de sua personalidade egocêntrica e obsessivamente midiática, quase todos os holofotes da vida política americana passaram a se concentrar na figura do presidente – e isso se mostrou um desastre. Sua vocação autoritária e o discurso agressivo dividiu o país de uma maneira que não era vista desde a Guerra da Secessão (1861-1865) e estimulou o conceito de “duas Américas” que permanece até hoje, uma característica que enfraquece o país aos olhos do mundo.

A eleição presidencial de 2024 já começou. Pelo lado Republicano, Donald Trump, humilhado pela derrota na busca do segundo mandato, tentará voltar ao poder de qualquer maneira – até para fugir das questões jurídicas que podem levar, em último instância, a sua prisão. Pelo lado Democrata, seria normal que o presidente em exercício, Joe Biden, tentasse a reeleição. O problema é que nenhum dos dois, Trump e Biden, tem apoio incondicional de seus partidos, condição fundamental para alavancar suas campanhas.

São razões bem diferentes que os opõem. Trump enfrenta resistência por parte daqueles que acreditam que sua postura violenta foi longe demais, inclusive lhe atribuindo culpa pelo episódio da invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, que levou a cinco mortes. Já Biden terá como desafio um elemento físico: sua idade avançada. Biden terá 82 anos em 2024 e, embora esteja bem de saúde, enfrentar a desgastante campanha presidencial será um obstáculo real.

Se os dois maiores líderes de seus partidos, que têm a vantagem e o recall de terem ocupado a Casa Branca não se candidatarem, como fica, então, a disputa?

Entre os republicanos, o favorito é o governador da Flórida, Ron DeSantis. Muitos doadores que estavam com Trump, condição importante para viabilizar qualquer nome, já anunciaram que migrarão para o seu lado. DeSantis é uma versão apenas um pouco mais palatável de Trump, embora seja igualmente radical em questões como a vacina – foi um negacionista contrário ao uso de máscaras durante a pandemia – e na defesa intransigente dos símbolos confederados, o que vai contra a comunidade negra. Outro nome que ganha força é Glenn Youngkin, governador da Vírginia, este sim uma versão mais ao centro do espectro republicano – ele é a favor do aborto em casos de estupro, incesto e risco de vida à mãe, o que contraria parte do partido.

Entre os democratas, o nome mais óbvio, sem Biden na disputa, seria o da vice-presidente Kamala Harris. O problema é que sua atuação tem sido vista como abaixo do esperado pelos próprios democratas. Surgem então nomes de governadores que vêm se destacando no cenário nacional. Os principais são Gavin Newsom (Califórnia), Gretchen Whitmer (Michigan) e Jared Polis (Colorado). Eles devem disputar as primárias com nomes que integram o governo Biden, entre eles o popular Pete Guttigieg, secretário dos Transportes, e Gina Raimondo, secretária de Comércio e favorita dos centristas.

A eleição americana ainda está distante, mas sua importância para a geopolítica mundial é tão grande que os nomes especulados já começam a despertar o interesse dos poderosos, que buscam intensificar a aproximação para buscar posições de influência – uma atitude bastante previsível em meio às incertezas que rondam a democracia americana.