Um provérbio africano difundido entre professores diz que é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança. Na pandemia, em que os desafios crescem à medida em que escolas seguem fechadas, a frase ganha força. Crianças mais vulneráveis, sem acesso à tecnologia ou pouco suporte em casa, têm dificuldades com aulas online, mas educadores e pais mobilizados ajudam a superar obstáculos.

Com máscara no rosto, Andressa Cruz, de 20 anos, leva um computador, paciência e vocação para acompanhar os estudos de crianças de favelas próximas à Ceagesp, na zona oeste de São Paulo. Ela ajuda os pequenos, ainda não alfabetizados, a acessar a internet para assistir a aulas da professora pela tela.

Ali, ao lado, ajuda a abrir o livro na página certa, tira dúvidas e, sem perceber, vira motivação e espelho para que os meninos não desistam. A jovem sabe por experiência própria o quanto é difícil aprender em contexto desfavorável.

“Minha mãe é analfabeta e não tinha condição de me ajudar, eu me virava. É a mesma coisa com essas crianças. Ficaria mais difícil para eles se eu não ajudasse”, diz ela, que sonha em ser professora.

O trabalho de monitoria atende crianças do ateliescola acaia, unidade escolar criada pelo Instituto Acaia, organização social privada e sem fins lucrativos.

O projeto surgiu após a direção perceber que não bastavam equipamentos. “O mais complexo é garantir a aprendizagem na sua melhor potência nessas condições”, diz a diretora Ana Cristina Cintra.

Na zona leste, é o trabalho de outro grupo que ajuda crianças a formar as primeiras palavras. Educadoras voluntárias fazem chamada de vídeo duas vezes por semana com crianças de 6 anos de uma escola estadual. O contato pelo celular envolve conversa, contação de história, jogos e o reconhecimento das letras. As mães ajudam a posicionar a câmera do celular e acabam se envolvendo na alfabetização.

“Conforme a criança ia caminhando, as mães ficavam muito felizes”, diz Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec, que coloca em prática a iniciativa junto com a Fundação Tide Setubal.

A ação, que começou em 2020, alfabetizou parte das crianças e continua. “Não abro mão dele enquanto não estiver lendo”, diz Marlene Alexandroff, de 73 anos, uma das professoras voluntárias do projeto, sobre Yago, criança com quem criou vínculo afetivo mesmo sem encontro presencial.

Desigualdade ao lado

Para dar chance a crianças vulneráveis, a associação de pais do Colégio Gracinha, na zona sul, vai arrecadar computadores, fazer reparos e distribuir a bolsistas e alunos de outras escolas.

O projeto surgiu após a dentista Daniela Passoni, de 43 anos, saber que a diarista, com quatro filhos, teria de priorizar um deles nas aulas remotas da rede pública com o único computador que tinha.

Pouco depois de pedir nas redes sociais, conseguiu dois equipamentos – e percebeu que poderia mobilizar mais. “O menino dela tem a idade do meu filho. Está no 3.º ano e não sabe ler”, diz a dentista.

Ela apresentou a ideia à associação de pais do Gracinha e o projeto já conta com voluntários animados. “Temos de ajudar quem não tem, é obrigação moral.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.