Em um período muito curto, sei lá, de dois ou três meses, o Brasil assistiu a episódios de ‘cancelamentos’ sumários. Idiotas intelectuais e/ou imprecisos e estúpidos nas falas foram vítimas de si mesmos e da crueldade falso-moralista da era digital. Em tempo: as vítimas não podem reclamar, pois alçaram sucesso justamente pelo funcionamento ligeiro e fugaz da internet. Do contrário – e eu sou um exemplo crasso! -, jamais seriam conhecidos e reconhecidos fora de seus grupos sociais mais íntimos.

Bruno Aiub, o Monark, ex-Flow, um podcaster de extremo sucesso, conheceu a profundeza do inferno após, bêbado, drogado e perdido em seu labirinto de péssimas ideias, expor uma barbaridade qualquer a respeito de antissemitismo e nazismo, ao vivo e em cores, para milhões de seguidores. Imediatamente, o batalhão do ódio, a lacrolândia oportunista, os arautos da moralidade (mais falsa que nota de três reais) entraram em modo de ataque e trucidaram para sempre o falastrão irresponsável.

Tão logo se deu conta do ‘crime hediondo imperdoável’, Monark, de forma absolutamente humilde, clara e sincera, se desculpou publicamente, repetidas vezes, aliás, demonstrando profundos arrependimento e sentimento de culpa. Infelizmente, para ele e para quem gosta dele, até hoje ao menos, a perfeita sociedade brasileira, os incorruptíveis patrocinadores e a casta dos influenciadores digitais não só não o perdoaram, como nem sequer levaram minimamente em conta suas justificativas.

KIM

No mesmo podcast que levou ao extermínio – profissional e emocional – o jovem youtuber, um outro episódio de cancelamento eclodiu feroz. Kim Kataguiri, o melhor deputado federal do País (confiram os números e o trabalho do moço no Congresso Nacional), embarcou na conversa de bêbado sobre nazismo, e mandou ver uma outra porcaria a respeito. Para sua sorte, porém, a fala e a maneira como ‘bostejou’ deixaram claras a confusão de palavras e de raciocínio. Kim, ao final, escapou por um fio!

O ‘japa do MBL’ também se explicou e se retratou. Mais: utilizou suas poderosas redes sociais para mostrar quem é e o que faz, em contraponto ao que lhe acusavam, injusta e rasteiramente. Kim, além de ter sobrevivido à tentativa de assassinato de sua reputação, venceu o embate porque, assim como Monark, foi absolutamente franco, humilde e rápido. Contudo, aqui e ali, sobretudo nas hordas políticas do chamado bolsopetismo, o ataque cruel e desmedido continua vivo e vigoroso.

JOVEM PAN

Dois ou três dia depois, eu acho, foi a vez de um outro rapaz, comentarista da rádio Jovem Pan, conhecido pelo jeito grosseiro e histriônico de ser, ou melhor, de defender as causas mais absurdas em prol de Jair Bolsonaro e sua família, escorregar feio em uma casca de banana ligada ao tema nazismo. Ao fim de um programa, Adrilles Jorge, de forma jocosa e infantil, repetiu uma saudação nazista e sorriu de forma asquerosamente cretina, para o espanto do apresentador do programa.

Adrilles é nazista? Claro que não. Como não são Kim nem Monark, ora. Mas quem sobe às custas da lacração – seu caso -, cai na mesma velocidade. O conteúdo e o comportamento intelectuais do ex-BBB são tão profundos quanto enxurrada de garoa, correndo rente ao meio-fio. Ocorre que é rápido e habilidoso com as palavras, e fala o que o público da Jovem Pan gosta de ouvir. Uma vez, contudo, ultrapassada a barreira do politicamente aceitável, seu medíocre castelo de cartas sucumbiu.

MBL

A bola da vez é o deputado estadual do Podemos, de SP, Arthur do Val, conhecido como ‘mamãe falei‘, também uma subcelebridade de internet, alçada aos holofotes da fama. Em primeiro mandato, Arthur vinha desempenhando um excelente papel e sua carreira parecia promissora. Oriundo dos quadros do MBL (Movimento Brasil Livre), partiu em viagem para a Ucrânia, junto com um colega de Movimento, em prol de uma causa humanitária, mas também, em busca de ganhos eleitorais.

Pois bem. O caso é mais do que conhecido e não vou detalhá-lo aqui. O fato é que, assim como Kataguiri e Monark, Mamãe Falei se desculpou, sincera e reiteradamente. Assumiu seu enorme erro e está pagando um preço elevadíssimo. Ainda assim, a fúria – em parte legítima e justificada; em parte hipócrita e oportunista – lhe açoita dia e noite, de domingo a domingo, sem descanso para o almoço ou pausa para ir ao banheiro. Pior. Arthur está sendo execrado até pelo o que jamais fez.

BOLSONARO

O leitor mais atento – e persistente, por chegar até aqui – deve ter percebido que não citei Adrilles Jorge no rol de quem pediu desculpas. Pois é. O bolsonarista fanático não pediu mesmo. Ao contrário, negou o ocorrido e saiu pela tangente. Sabe o que aconteceu com ele? Ganhou milhares e milhares de novos seguidores, e foi convidado por um partido para disputar as eleições. Ah! Lembram-se do ex-jogador de vôlei, homofóbico declarado? Pois é. Idem. Ganhou mais fama e será deputado.

Quem nunca viu ou ouviu o presidente da República, Jair Bolsonaro, a despeito de tudo o que já sabemos sobre coronavírus, pandemia, vacinas etc., dizer ‘jamais errei’ ou ‘não errei uma’ quando o assunto é Covid-19? Ato contínuo, quando é que ele, ou algum familiar seu, se desculpou pelas rachadinhas, funcionários-fantasmas, declarações cruéis, solidariedade a Vladimir Putin, enfim, pelos inúmeros erros – e crimes! – cometidos às claras desde que assumiu a Presidência? Nunca. Jamais.

LULOPETISMO

Do lado oposto da política, assistimos ao mesmíssimo fenômeno ocorrer. Lula da Silva e o PT jamais, em tempo algum, assumiram o mensalão, o petrolão, o tríplex, o sítio, o caso Celso Daniel, o apoio e o financiamento a ditaduras e a grupos terroristas. Jamais se desculparam por José Dirceu, Antônio Palocci, Delúbio Soares, João Vaccari e tantos outros companheiros históricos de gangue, digo partido, presos por corrupção, lavagem de dinheiro e outros crimes. Nunquinha!

Assim como Bolsonaro, Lula goza de enormes prestígio e poder. Não à toa, são os dois francos favoritos nas eleições de outubro e novembro próximos. Dessa forma, resta claro e evidente, e provado!, que assumir os erros – mesmo que não tão graves quanto roubo – e se desculpar por eles, no Brasil, não é um bom negócio. Ao contrário! Todo ser humano que se mostrar arrependido e humilde, perante nossos justiceiros morais, será ainda mais punido e castigado. Simples assim. Triste assim.