O Rio de Janeiro tem a maravilhosa capacidade de se reinventar, e sempre que isso ocorre a cidade melhora. Mais uma vez, vai melhorar. Há doze anos, aquela que foi uma das mais famosas casas de show do País fechou as portas, e, desde então, o casarão que a abrigava vem tristemente se deteriorando sob o sol e a chuva. Desde o início da semana passada, no entanto, há novamente música no ar: um novo Canecão, que se chamará Arena Canecão, começou a nascer. Com outorga de R$ 4,3 milhões e concessão de trinta anos, o consórcio Bonus-Klefer (integrado por Kleber Leite, ex-presidente do Flamengo, e Bônus Track Entretenimento) venceu o leilão para erguer a casa de espetáculos. Ficará localizada no bairro de Botafogo, ao lado do antigo Canecão, em terreno de quinze mil metros quadrados cedido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em seu campus da Praia Vermelha. Terá plateia de três mil lugares e acolherá grandes nomes do rock, grandes nomes da música popular brasileira e, novidade das novidades, grandes nomes da ópera. A boca de cena medirá seis metros de altura, uma das maiores entre os teatros brasileiros, e haverá, obviamente, o espaço adequado à orquestra. O velho Canecão apagou derradeiramente os seus refletores na noite de 17 de outubro de 2010, tendo em sua apoteose a consagrada Bibi Ferreira, interpretando Non, Je Ne Regrette Rien. A mesma Bibi que inaugurara a casa em 1967, só que nessa ocasião como diretora: o show era da cantora Maysa, uma das divas do samba-canção (“Meu mundo caiu/Quem me fez ficar assim”). A partir de então, foram quarenta anos de espetáculos, um artista atrás do outro no templo da música que começou como uma simples cervejaria – daí o nome Canecão, propriedade do empresário da noite Mário Priolli. Agora, o Canecão vai voltar. Tem o Rio de Janeiro, de fato, a capacidade de se reinventar para melhor.

Para alcançar tal objetivo, há um grandioso projeto que é inovador. A universidade não receberá dinheiro mas, sim, edificações. “São as chamadas contrapartidas in natura. Dessa forma não corremos risco de eventual falta de verba”, afirma Carlos Frederico Leão Rocha, vice-reitor da instituição. Em outras palavras, o planejamento referencial passará, inevitavelmente, por adequações, mas seguirá sem problemas de ordem de financiamento – e, assim, deverá ser finalizado em 2025. Faz parte do plano a construção de outras edificações que vão mexer com aspectos acadêmicos do campus da UFRJ. Para além do Canecão, será erigido um prédio no qual funcionará o Espaço Ziraldo, que abrigará o histórico mural feito pelo cartunista. O painel tem trinta e dois metros de largura e seis de altura, com desenhos que representam localidades turísticas e personalidades da Cidade Maravilhosa. A UFRJ ganhará também a infraestrutura para setenta salas de aula, novo refeitório com capacidade de fornecer duas mil refeições diárias, centro de exposições e uma arborizada praça pública. A universidade poderá usar esses locais para ações educacionais próprias em determinados períodos do ano.

De volta à Arena Canecão, o público terá acesso ao que existe de mais moderno no seguimento de casas de show noturnas: o ambiente em que acontecerão as apresentações musicais dançantes é flexível, mesas e cadeiras da plateia poderão virar pista de dança. Isso permitirá que parte do público aprecie as exibições de maneira correta e confortável. “O setor cultural da UFRJ e a escola de música serão contemplados com o que há de melhor”, diz Rocha. Pode-se dizer que as construções também vão revitalizar todas as vias públicas do entorno do terreno. A ideia do surgimento do novo Canecão faz lembrar os magníficos espetáculos que ocorreram no velho espaço: Chico Buarque e Maria Bethânia, em 1975, numa noite em que se dissera que um disco voador visitara o céu do Rio de Janeiro. Dois anos depois, a apresentação conjunta e histórica, em um sábado, de Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Toquinho e Miúcha. E a esses shows somam-se tantos outros memoráveis. A mesma ideia aguça a curiosidade e leva a imaginação ao ano de 2025.

“A abertura de um novo Canecão após uma década será sensacional. Esse nome faz parte da história do Rio de Janeiro e é um local emblemático para a classe artística. Nessa casa toquei muitas vezes e, em outras muitas vezes, assisti a músicos incríveis fazerem seus shows. De Chico Buarque a Paralamas do Sucesso e bandas internacionais. Somente se apresentavam lá as pessoas que alcançavam o topo da música brasileira. Agora é momento de festejar o ressurgimento desse espaço e espero que ele possa acolher artistas de todo o País e também do exterior. Boa sorte a todos os envolvidos nesse grandioso projeto que vai sacudir a cultura nacional”. Dado Villa-Lobos, ex-integrante do Legião Urbana