Entre insultos e apertos de mãos, Kim Jong-un e Donald Trump tiveram bons e maus momentos. E, nesse percurso, o presidente americano nunca inspirou na Coreia do Norte o mesmo ódio que seu líder, Kim Jong-un, diz ter de Joe Biden, um “cão raivoso” que é preciso “matar a pauladas”.

O inquilino da Casa Branca, que não se cansa de comemorar sua proximidade com o líder norte-coreano, já prometeu fechar “muito rapidamente” um acordo com Pyongyang se for reeleito em 3 de novembro, apesar do processo diplomático entre os dois países se encontrar em ponto morto há 20 meses.

Não há dúvida, segundo os especialistas, de que, se Biden vencer, sua abordagem será totalmente diferente.

A Coreia do Norte odeia Biden por seu papel como vice-presidente no governo Obama e por sua doutrina de “paciência estratégica”. A ideia era recusar qualquer diálogo com o regime norte-coreano, se ele não fizesse concessões primeiro.

Em novembro de 2019, a agência oficial de notícias KCNA liderou um ataque verbal de violência incomum contra o candidato democrata.

“Cães loucos como Biden podem machucar muitas pessoas, se forem deixados soltos”, lançou a agência. “Você tem que matá-los a pauladas”.

– Fim das “cartas de amor” –

O regime norte-coreano endossou um dos apelidos que Trump dá a seu adversário, “Joe, o dorminhoco” (“Sleepy Joe”, no original).

Biden acredita que o atual presidente foi longe demais ao se aproximar do líder norte-coreano. O democrata garante que não se encontrará com Kim incondicionalmente e que exigirá, em primeiro lugar, uma promessa de desnuclearização da península coreana.

“O governo Biden não vai escrever cartas de amor”, brincou ele, referindo-se às cartas trocadas entre Trump e Kim.

Na quinta-feira, durante o último debate presidencial, o candidato democrata atacou a amizade que Trump fez com um “bandido”, o qual comparou a Adolf Hitler.

De acordo com Andrei Lankov, professor da Universidade Kookmin em Seul, Pyongyang espera que Trump obtenha um segundo mandato.

“A eleição de Joe Biden levaria a um beco sem saída”, explica Lankov à AFP.

“Se Donald Trump for reeleito, (os norte-coreanos) serão cuidadosos por um tempo, na esperança de obter concessões dele”, apontou.

O início da Presidência de Trump foi marcado por trocas de insultos que contribuíram para agravar as tensões em 2017. A distensão veio, porém, com os Jogos Olímpicos de Inverno de 2018.

– Reunião histórica –

Naquele ano, Donald Trump se tornou o primeiro presidente americano a se encontrar, em Singapura, com um líder norte-coreano.

Kim e Trump voltaram a se reunir outras duas vezes, em Hanói e na Zona Desmilitarizada (DMZ, na sigla em inglês), na fronteira entre as duas Coreias. Apesar desse movimento, as negociações nucleares não tiveram resultados concretos. No início de outubro, Kim exibiu um míssil balístico em um desfile militar.

Chung Min Lee, do “think tank” Carnegie Endowment for International Peace, saudou recentemente os esforços de Trump para chegar a Kim.

“O problema é o que ele fez com isso”, diz, denunciando as más motivações do presidente dos Estados Unidos.

“Trump ficou tomado pela ideia de que Kim Jong-un iria permitir que ele, de uma forma ou de outra, impusesse nos Estados Unidos a imagem do presidente que trouxe a paz aos coreanos”, completou o especialista.

A eleição de Biden significaria um retorno a um processo diplomático clássico, de acordo com o embaixador da Coreia do Sul em Washington, Lee Soo-hyuck, ou seja, longas negociações em nível ministerial em vez de reuniões de alto nível entre dois líderes.

Os conselheiros de Biden para temas de diplomacia e segurança ocuparam cargos importantes no governo Obama, lembra o embaixador.

“Mais do que uma abordagem vertical, de cima para baixo, espero que as políticas sejam desenvolvidas e propostas no nível de grupos de trabalho e aprovadas pelo presidente”, acrescentou.