Maria Teresa Pimentel já tinha uma filha de 2 anos e estava desempregada quando se viu novamente grávida, em 1984. A mãe de Maria Teresa não aceitava a nova gravidez e a expulsou de casa. Morando de favor com uma amiga, sem emprego e com uma filha pequena para criar, ela tomou a decisão de entregar o bebê voluntariamente para a adoção, como fez a atriz Klara Castanho. Como mostrou o Estadão, o Brasil tem três entregas voluntárias de crianças para adoção a cada dia.

A decisão de entregar o filho recém-nascido para a adoção é prevista em lei e não demanda justificativas, apenas a decisão da mãe biológica. Mas por trás de cada decisão sempre há uma história. Acompanhe o depoimento de Michele Lopes, filha de Maria Teresa, ela mesma mãe adotiva de duas crianças.

SEM ACOLHIMENTO

“Eu tinha 2 aninhos quando a minha mãe, que era solteira, ficou grávida novamente. Minha avó não aceitou de jeito nenhum. Disse que não era pra ela voltar para casa se tivesse mais um filho, que já tinha eu e, ainda por cima, estava desempregada. Ela foi morar comigo na casa de uma amiga, de favor, e se viu sem saída. Minha mãe pensou por muito tempo e decidiu pela entrega da criança para adoção.

Naquela época, era muito comum fazer a entrega direta, o que é proibido hoje. Ela entregou a criança para uma pessoa, que entregou para um casal que queria adotar. Apesar de achar que tinha feito a melhor coisa para ele, ela se sentia muito culpada e envergonhada por tudo o que aconteceu. Ela conta que foi a decisão mais difícil que tomou na vida, que sofreu muito, chorava muito. Não teve nenhum apoio da família.

No segundo dia em que voltou para casa depois do parto, ainda de resguardo, o peito jorrando leite, minha avó mandou ela sair para arrumar um emprego. Eu não sei de onde ela tirou forças. É um sofrimento que nem posso imaginar.

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Quando eu tinha 28 anos, ele apareceu procurando por ela. Disse que o maior sonho da vida dele era encontrá-la, que todo mundo dizia que ele tinha uma irmã e ele queria conhecê-la. Eu não sabia de nada, quase ninguém sabia. E aí que minha mãe veio conversar comigo. Eu sempre tive a cabeça muito aberta, já tinha adotado a minha primeira filha (tenho duas filhas adotadas) e sou muito grata às genitoras. Se não fossem elas, eu também não seria mãe.

Num primeiro momento, me senti muito culpada também. Porque, de certa forma, ela também fez aquilo por mim. Ela não teria dado tudo o que me deu – tempo, amor, carinho, ela trabalhava muito para me sustentar -, se tivesse ficado com o outro filho. Fiquei muito abalada e, até hoje, guardo uma mágoa grande da minha avó. Acho que o que ela fez foi uma crueldade muito grande, se minha mãe tivesse tido um mínimo de apoio, não teria feito isso. E a vida inteira ela (a avó) me tratou como um estorvo. Ela não aceitava que a filha não tivesse casado, achava que era uma vergonha.

Me lembro, quando era pequena, que ela (a mãe) vivia muito deprimida, chorava muito, e nunca consegui entender por que era tão amarga. Só quando fiquei sabendo da história e conheci meu irmão foi que entendi. E ele foi um mega irmão durante os dois anos em que tivemos contato com ele (que acabou morrendo em um acidente de moto). Mas ele falou para ela que agradecia a ela por ter lhe dado a oportunidade de ter a família que teve, que entendia o quanto tinha sido difícil. Para a gente, foi um presente. Convivemos com ele por dois anos, e ele era um cara incrível. Isso acalmou o coração da minha mãe.

EXEMPLO

Por outro lado, quando eu ainda era criança, tinha uns 10 anos, meu tio, irmão da minha mãe, morreu e a mulher não quis ficar com o filho dele. Minha avó disse que não podia cuidar da criança e minha mãe adotou ele e o criou com muito amor e carinho.

Hoje, que estou vivendo uma situação delicada, lutando há um ano para adotar a minha terceira filha, que está num abrigo, o meu irmão me fala: ‘Por isso agradeço tanto à mãe, porque se não fosse por ela, eu também teria ido para o abrigo’.

Essa história da Klara (Castanho) mexeu muito comigo. Fiquei muito chocada e triste, queria conhecer essa menina, dar um abraço nela. Ela pensou em primeiríssimo lugar na criança. Eu sei o que é estar do lado de cá. Não passei pelo que minha mãe passou, mas vi o sofrimento dela. Acho importante entender que não podemos julgar, não podemos apontar o dedo.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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