‘Não há hipótese de a gente não resolver o tarifaço dos EUA’, diz Haddad

Em entrevista concedida ao Estadão/Broadcast, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avalia que haverá negociação sobre o tarifaço antes do prazo determinado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, para a medida entrar em vigor, em 1º agosto. Para o ministro, a taxa de 50% imposta pelo republicano “não faz sentido econômico” para os Estados Unidos. “Qual é o sentido de taxar suco, café, carne? São coisas que vão encarecer o café da manhã do americano”, disse Haddad.

O ministro da Fazenda evitou estimar impactos para a economia brasileira da medida e das novas investigações iniciadas pelo governo dos EUA que citam temas como desmatamento, pirataria e até o Pix. “Os Estados Unidos deviam estar copiando o Pix. Você não se incomoda com criptomoeda e vai se incomodar com o Pix? Qual é o sentido disso?”, questionou.

Sobre a pauta econômica e a relação com o Congresso, Fernando Haddad, quer que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), abrace o projeto de lei que isenta do Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil como se fosse “a reforma para chamar de sua”. Motta tem dito, por sua vez, que gostaria de aprovar a reforma administrativa e já encomendou uma proposta ao Legislativo para pôr em tramitação.

Os últimos presidentes da Câmara lideraram, cada um a seu turno, importantes reformas econômicas. Sob Rodrigo Maia, foram aprovadas a reforma trabalhista e da Previdência. Já Arthur Lira aprovou a reforma tributária. “A maior reforma que ele pode chamar de ‘minha’, no caso dele, é a reforma da renda”, disse o ministro da Fazenda. Leia a íntegra abaixo:

Obrigado pelo tempo, senhor. Eu queria começar perguntando sobre a agenda que o senhor teve com os bancos públicos e o presidente Lula. Veio uma nova medida de crédito por aí? Qual a discussão que vocês estavam tendo?

Foi uma reunião de balanço. Ele gosta de acompanhar a evolução das linhas de crédito que foram criadas, do impacto das medidas regulatórias sobre o crédito, o marco de garantia, acredita, os vários desenrola, porque o desenrola está indo para a sua quinta edição, teve o rural, teve a questão do consignado privado, o crédito do trabalhador. Então, ele acompanha e provoca muito debate. Por que o juro ainda está alto? O que está faltando para cair para o tomador final? Está havendo competição entre os bancos, os trabalhadores estão informados, quem está contratando, se a taxa de juros está caindo. Ele acompanha muito essa coisa do crédito.

Mas tem uma nova linha aí? Uma nova linha de crédito?

Não. Não tem previsão nenhuma.

Tinha um estudo de uma nova linha para trabalhadores informais, com garantia do Pix, isso está em estudo ainda?

Já tem uma lei aprovada pela Câmara, se eu não estou enganado. Está no Senado já há algum tempo. Mas ainda não passou. Que é a possibilidade de você dar de garantia o fluxo da tua conta corrente, que às vezes você é um pequeno empreendedor, às vezes você é um trabalhador ainda na informalidade, mas que tem uma atividade comprovada. Uma instituição financeira pode perceber que você tem uma movimentação e aí ela pode, com base nessa movimentação, te oferecer uma linha de crédito garantida pelo fluxo. Isso está na linha de produção já há mais de um ano, mas ainda não foi aprovado. Está tramitando, se eu não me engano, há dois anos esse projeto.

O presidente do Banco Central estava na reunião, ele falou alguma coisa sobre por que os juros ainda estão altos?

Não, a gente está falando do juro para o tomador, não está falando do Selic, está falando do spread mesmo. De algumas linhas que estão muito… os spreads estão elevados ainda. Então o debate não foi sobre o Banco Central, foi sobre o spread que os bancos estão aplicando.

E os presidentes dos bancos públicos? Eles falaram alguma coisa de juros altos, se pode cair mais?

Então, mostraram como está caindo. Essas medidas que nós estamos tomando, elas estão fazendo os spreads se reduzirem. Você vê que na venda de carros, de imóveis, com marca de garantias, melhorou. O consignado do trabalhador, o crédito do trabalhador, o Presidente do Banco Central, do Banco do Brasil, deu um depoimento importante, que a grande maioria das pessoas está trocando dívida carga por barata. Desde cheque especial, cartão de crédito, CDC, a pessoa vai lá com uma dívida a 5% ao mês, 6% ao mês, e ela troca por menos de 3%. Então já é um alívio na prestação na veia, a pessoa já entra com uma dívida não barata. E o seu presidente, com justa razão, considera que ainda 2,5%, 2,8%, que são as taxas praticadas pelos bancos públicos, ainda é alta. Sobretudo comparado com o consignado do servidor público, do aposentado. Então ele se preocupa com isso, porque ele sabe que isso pesa. E ele fica muito indignado, porque as pessoas de alta renda têm acesso a linhas mais baratas, e a pessoa de baixa renda ainda tem dificuldade em acessar. E ele fala, nós estamos dando a garantia. Isso tinha que ter uma repercussão mais rápida. Agora essa linha com a garantia do Pix, só se o Senado aprovar. Não tem como sair sem a aprovação do Congresso. Depende de uma votação simples. É um projeto que está ajustado até ali. Quase 400 votos a favor da Câmara. Não é polêmico.

E o senhor falou que conversou com o Davi Alcolumbre sobre…

Conversei no começo do ano. Não voltamos.

Não é recente?

Não. Até em função dessa conversa aqui, eu vou voltar a falar com ele. Mas está naquela lista nossa das medidas de prioridade. Essa era uma, porque vai facilitar o crédito para quem hoje não tem o que oferecer. A pessoa não é celetista, não é aposentada, não é servidora pública. Essa pessoa tem uma atividade econômica, tem alguma garantia. Eventualmente tem uma atividade há muito tempo. E às vezes, nós estamos falando de uma pessoa que está precisando de 3 mil reais para comprar um freezer para armazenar sorvete feito em casa. Essa pessoa vive daquela atividade muitas vezes. E às vezes, 3 mil reais, 4 mil reais, um crédito barato, vai fazer muita diferença na vida dessa pessoa. Essas linhas de microcrédito estão avançando muito. A referência do BNB, que tem uma tecnologia desenvolvida há muito tempo, está se espalhando pelo Brasil. O presidente vai medindo a qualidade dessas políticas públicas. E ele sabe que crédito é uma forma de emancipar a pessoa. Sobretudo quando não é um crédito caro. Sobretudo quando ele é voltado, eventualmente, para produção. Para pequena produção. Às vezes é uma produção doméstica. Mas aquela produção doméstica garante a sobrevivência digna de uma família.

Relação com o Congresso

O senhor disse que melhorou a relação do Executivo com o Congresso. De fato, aparentemente houve uma melhora. Qual foi o marco dessa melhora? O que aconteceu que melhorou?

Eu faria a pergunta às avessas, porque até na última conversa que eu tive com o presidente Hugo Motta, porque eu tenho um apreço pessoal, não é um jogo de palavras o que eu estou falando. O presidente Hugo Motta, enquanto líder, frequentava o Ministério da Fazenda, eu fui a ele várias vezes, ele veio a mim várias vezes, ele se dá bem com toda a minha equipe, ele tem trânsito aqui dentro do Ministério da Fazenda. Ele liga para o Darío, ele liga para o Marcos Pinto, ele tem tranquilidade, vai ser bem recebido a vida toda, como sempre foi. O estresse foi esse ponto fora da curva. A nossa relação foi boa e continuará boa. Esse ponto fora da curva, nós conseguimos equacionar, conseguimos superar. Foi um incidente, não vou aqui ficar explorando esse tipo de coisa, o que acontece na vida das pessoas, incidentes, se as pessoas têm maturidade, elas superam o incidente e seguem a vida. É do interesse do presidente Hugo Motta, do presidente Davi Alcolumbre, ter uma agenda edificante, uma agenda produtiva, uma agenda que responda aos interesses da população. A mesma coisa vale para a fazenda, para o governo. Não tem por que fazer desse incidente uma era que ele é. Ponto fora da curva, é bom seguir a curva, deixar o ponto fora da curva.

Mas o que fez voltar para a curva? Foi o ministro Alexandre Moraes?

Não, eu acredito que a percepção de que aquilo não estava produzindo o melhor resultado para ninguém. Qual é o interesse em não harmonizar os poderes da República? A quem interessa? Ninguém.

Taxação de Trump

Bom, mudando de assunto, a gente também, recentemente, tem a questão da taxação do trânsito, 50% sobre as exportações brasileiras. Ontem (quarta) também foi anunciada uma investigação a respeito de vários temas da economia brasileira, inclusive o Pix. Chegou a mencionar também a Rua 25 de Março como um lugar onde isso vem em giro.

Deve ter sido porque eu trabalhei lá por 18 anos…

De que forma o governo vai reagir a essa investigação agora, que é um novo elemento, além da fala dele e da promessa de taxar, que essa vez ele abriu uma investigação de vários…

O governo tem procurado, na minha opinião, com muita correção, com muita sobriedade, a racionalidade das cartas que estão sendo enviadas, das manifestações. Nós estamos procurando qual é a racionalidade, o que está de fato por trás dessa iniciativa. Porque, por exemplo, nós em maio apresentamos uma proposta de negociação. Sem que houvesse sequer uma resposta à proposta que o Brasil fez, veio a taxação de 50%. (Taxação de) 10% ensejou uma negociação. Foi aberta, foram 10 reuniões. Acho que não conta com a minha que tive com o [secretário de Tesouro dos Estados Unidos, Scott] Bessent na Califórnia. E ele próprio, na reunião que teve comigo, disse que negociaria a tarifa de 10%, diante da minha provocação de que não fazia sentido tarifar um país deficitário em relação ao comércio de bens e serviços com os Estados Unidos. Ele falou que há espaço para um entendimento, para uma negociação. Se com 10% havia espaço para uma negociação, do que nós estamos falando? O que o Pix pode incomodar?

As empresas de cartão de crédito?

Mas vamos supor que seja isso. Você vai abrir mão de um instrumento que foi desenvolvido com tecnologia brasileira, faz mais de 10 anos que o Pix está sendo desenvolvido. Há outras modalidades que estão entrando em operação. Pix parcelado, uma série de coisas. E vão baratear as transações financeiras.E aí você vai se incomodar com uma coisa que vai baratear as transações financeiras? Os Estados Unidos não estão copiando o Pix. O Pix pode ser exportado como uma tecnologia que vai facilitar muito a vida das pessoas. Você não se incomoda com a criptomoeda e vai se incomodar com o Pix? Qual é o sentido disso? É difícil compreender. É só lobby das empresas de cartão de crédito? É disso que nós estamos falando? Isso não está claro para nós. É uma pergunta que eu faço. A questão do desmatamento? O presidente Trump manifesta apoio e admiração ao ex-presidente Bolsonaro, que foi o maior responsável pelo aumento do desmatamento. Nós estamos revertendo o desmatamento, que temos um programa de recuperação de pastagens. Estamos fazendo tudo de acordo com as melhores práticas internacionais. Lideramos o debate de mudança climática no mundo. Vamos agora para a COP com propostas concretas de preservação das florestas tropicais. Este país vai ser penalizado? Qual é o sentido disso? Então, vai ficando difícil. Na carta que ganhou a repercussão, fala-se de um déficit comercial dos Estados que não existe, eles são superavitários. Fica difícil entender…Com quem a gente fala? Quais pontos vão se manter na conversa? Então, nós estamos procurando. E a nossa diplomacia, vamos combinar, não é mérito de nenhum partido político. A construção histórica de uma diplomacia altamente competente e capacitada.

O senhor falou também, dentro desse tema de justiça tributária, do corte dos benefícios, que o senhor falou que são muitos ralos. A Fazenda disse que vai mandar em agosto uma proposta. Como vai ser esse corte? Ele vai ser linear? Vai ser de 10%?

Então, nós estamos conversando com o deputado Aguinaldo Ribeiro, que foi encarregado pelo Presidente Hugo Motta. Tem dois projetos tramitando nessa direção de parlamentares. Um senador, Esperidião Amin, e de um deputado, o Mauro Benevides. Diversas formas diferentes sobre o mesmo tema. E o deputado Aguinaldo Ribeiro foi designado pelo Presidente Hugo Motta para interagir com a Fazenda para chegar a um desenho. E isso vai ser feito.

O Aguinaldo vai convergir todos os textos, inclusive o da Fazenda?

Isso.

Mas o senhor falou de grandes ralos. A Fazenda já tem mapeado ali os ralos?

Quando a gente faz um anúncio, a gente tem que fazer um anúncio de uma coisa que já está arrumada. A MP 303 está lá, já está anunciada. Está no Congresso para debater com os parlamentares. Está tudo em ordem.

E vocês precisam de 118 bi de receita para o ano que vem para fechar as contas? Vocês pretendem enviar novas propostas para estarem incluídas?

O que está tratado, fecha a peça orçamentária.

Mesmo com o IOF sem, por exemplo, risco sacado? Ou seja, não é uma possibilidade de perda que vai ter necessariamente de ser recomposta de outra forma?

Nós estamos com a agenda dada. Nossa agenda é essa até o final do ano.

Mas o senhor também já falou em outras entrevistas que sente falta de disputar e rever questões mais estruturais como o piso de saúde e educação, até pela forma como o orçamento brasileiro está. O senhor ainda tem espaço?

Antes disso, é o que eu vivo falando. Você está mexendo com duas áreas muito sensíveis, que têm demandas muito urgentes, sobretudo a saúde que é subfinanciada, lembrando que nós temos um sistema universal. Tem tanta coisa que precisa ser revista imediatamente que nós estamos negociando. Está lá o deputado Pedro Paulo negociando com a Esther Dweck, sobre a questão da reforma administrativa. Tem lá os projetos que foram mandados ainda no final do ano passado, que ainda não foram apreciados. Tem uma série de medidas de saneamento dos cadastros, de programas que estão com uma trajetória explosiva de gastos, que teve uma decisão recente agora do Conselho Nacional de Justiça, disciplinando a matéria. E foi um esforço da AGU justamente no sentido de dar racionalidade para o programa, que estava crescendo a R$ 20 bilhões ao ano. Então, tudo isso tem que ser feito. Nós, com o apoio do PT e tudo mais, revimos a política de valorização do salário mínimo, mantendo ganhos reais acima da inflação, portanto, assim como do avanço salarial. Foram mais de 10 iniciativas patrocinadas pelo Executivo, oito das quais ainda não estão aprovadas. Percebe?

Mas o sr. acha que isso é suficiente para discutir o engessamento do Orçamento? Por que não discutir o índice de correção dos pisos de saúde e educação para que se adequem ao do arcabouço fiscal? O arcabouço fiscal fica de pé sem discutir isso?

Ele fica de pé, mas veja bem. Quando você não consegue aprovar o mais fácil, qual é a expectativa de conseguir aprovar o mais difícil? Nós não estamos conseguindo aprovar o mais fácil. O pessoal fala, nós não conseguimos colocar o fundo do GDF (Governo do Distrito Federal) em compasso com o Fundo de Desenvolvimento Regional. O Fundo de Desenvolvimento Regional é para 27 unidades da federação. O fundo do GDF é para uma unidade da federação. E nós não conseguimos compatibilizar esses dois fundos. Nós temos que ter uma conversa franca, porque dependo de voto. Não adianta você mandar uma coisa para lá (para o Congresso) para ficar bem perante a Faria Lima e não ter noção de como as coisas vão se processar. A Fazenda nunca se indispôs a discutir nada. Se falava que a reforma administrativa ia salvar o Brasil, está lá o deputado Pedro Paulo, vai apresentar a proposta. Vamos ver.

Vocês vão apoiar a proposta?

Eu não conheço a proposta.

O presidente da Câmara, Hugo Motta, tem defendido a reforma administrativa como se quisesse uma reforma para chamar de sua.

A maior reforma que ele pode chamar de “minha”, no caso dele, é a reforma da renda. Você imaginou ser o presidente da Câmara dos Deputados que patrocinou a aprovação de uma medida histórica, que nunca foi sequer tentada por governo nenhum? Eu, no lugar dele, abraçaria essa causa.

Mas ele não deveria abraçar a reforma administrativa?

Não, ele pode abraçar dez reformas. Mas você me falou de uma para chamar de sua. Essa é a reforma da renda. Você poder estar na solenidade de sanção de um projeto desse, do lado do presidente da República, do lado do presidente do Senado, é histórico. O maior problema do Brasil é a desigualdade.

Mas a reforma da renda não era só a isenção do imposto de renda até R$ 5 mil. A reforma trataria também de outras rendas, principalmente da pessoa jurídica, e acabou que o governo não entrou nesse campo.

Eu provavelmente, se vou deixar um legado aqui, vai ser de reforma. Quarenta anos tentando a reforma tributária, o ministro que entregou fui eu. Com apoio de muitas mãos, de muitas cabeças, mas eu entreguei uma reforma tributária da história do País em regime democrático. Então, não vem falar de reforma para mim, porque fundo fechado, fundo offshore, fim de subvenção a custeio, uma série de medidas foram patrocinadas por esse ministério. Não me venha falar disso. Nós começamos a falar da reforma da renda em 2023, não começamos agora. E a isenção do imposto de renda é uma promessa de campanha que foi feita pelo Bolsonaro e não foi cumprida. Ninguém cobra ele por isso. Mas o presidente Lula tem palavra e vai cumprir. Faz muita diferença um político que tem e um político que não tem palavra. Então, alto lá, não é bem assim. Não é uma reforma do mesmo tipo do IVA, que exigiu uma reforma constitucional, uma pactuação entre setores de economia, uma pactuação com 5.570 prefeitos e 27 governadores. Por isso que ela demorou 40 anos para ser feita. Agora, quem sentar aqui depois de mim vai ter muito menos tarefa para fazer, para ajustar, do que eu recebi, totalmente caótica. O sistema tributário brasileiro é considerado um dos dez piores do mundo. Não esqueça que nós estamos fazendo um sistema operacional que vai digitalizar toda a emissão de nota fiscal e pagamento de tributo do País, centralizado aqui. Custou R$ 1 bilhão. A gente tem orgulho do Pix, não tem? O sistema que nós estamos desenvolvendo é 140 vezes maior que o Pix.

Nesse ano e meio, o que o senhor quer entregar a mais?

Olha, no ano que vem, imaginar que nós vamos aprovar grandes reformas não é razoável. Eu penso que essa agenda de medidas, muitas das quais nós anunciamos no começo do ano, parte das quais já está no Congresso, nós estamos empurrando essa agenda. Tenho tratado com o deputado Hugo e com o senador Davi dessa agenda; a questão do PL da inteligência artificial; a questão do Redata, que é dos data centers, que está pronto mas a gente está discutindo com o Congresso qual a melhor maneira de fazer, se faz por lá, se faz por provocação do Executivo; a questão da lei de falências que voltou para a mesa de negociação e pode ter uma solução; a garantia de Pix para crédito barato, que também está pronto para votar no Senado; a questão do devedor contumaz, que foi algo da última conversa que eu tive com o senador Davi Alcolumbre.

Qual o status desse projeto (devedor contumaz)?

Ele disse que o senador Efraim vai mandar cópia do último relatório para saber se está ok para votação. Estamos falando de muitos diplomas legais, que se forem todos aprovados até o final do ano, realmente é um motivo de muita satisfação, e não tem por que não aprovar, porque são coisas muito avançadas, amadurecidas. E para a Câmara e para o Senado, é muito importante chegar até o final do ano com essa entrega.

Qual sua avaliação do projeto do IR? O deputado Arthur Lira ampliou os benefícios para contribuintes de rendimento de até R$ 7.350. Tinha espaço para isso?

O projeto que foi aprovado hoje está ok, a gente conversou com ele, ele fez alguns ajustes, e o que foi para votação na comissão achei bem legal. Tinha um espaço, você manda (para o Congresso) com um espaçozinho ali, né? Quando nós mandamos, ele perguntou “tem um choro”? (risos) Porque assim, ninguém gosta de aprovar o que o Executivo manda, muito raro, ainda mais num projeto desse tamanho. E aí nós fomos honestos, nem podia ser diferente. Tinha memória de cálculo, tem um espaço, o senhor tem que tomar a decisão do que fazer com esse espaço. Vai mexer na alíquota? E na minha opinião ele fez a melhor opção.

Tem algum cargo público que o senhor gostaria de ocupar que ainda não ocupou?

Que pergunta… essa pergunta não existe (risos). Eu não trabalho com esse conceito. Já fui candidato a governador, já fui candidato a prefeito, já fui prefeito, já fui ministro, fui candidato a presidente. Então, essas coisas, ainda mais a Presidência da República, é uma coisa que é uma circunstância histórica. Quem imaginou que eu fosse ser candidato em 2018? Eu não esperava isso. Aliás, eu fiquei sabendo um mês antes que eu ia ser. Eu pertenço a um campo político que tem um projeto de transformar para melhor o Brasil. Sobretudo na questão da desigualdade. Eu não consigo conviver muito com um país tão desigual. Para mim, afeta emocionalmente. Quero que meus filhos, meus netos, meus netos, vivam um país melhor do ponto de vista da igualdade social. O País está entre os dez mais desiguais do mundo. Se a gente andar muito, a gente ainda vai ser muito desigual. Então, eu gostaria de colaborar com isso. Então, se amanhã pintar um projeto que vai nessa direção, beleza. Quando o presidente Lula me convidou para ser ministro da Fazenda, eu não falei sim. Eu falei, posso dizer o que eu acho que seria legal fazer? Ele falou “eu também gostei”. Então vamos juntos. Eu não consigo fazer uma coisa pelo cargo. Eu consigo fazer uma coisa pelo projeto.

Mas em abril, o senhor desincompatibiliza do cargo para… ?

Eu não tenho, eu até falei outro dia, eu fui coordenador do programa de governo do presidente Lula em 2018. Foi uma coisa que eu gostei de fazer, o programa de governo. Pode ser que eu saia, pode ser que não. O que eu repito sempre é que eu não tenho pretensões eleitorais. Mas de participar do projeto, eu tenho.

Mas se eventualmente o Lula for reeleito, o senhor permaneceria na Fazenda?

Imagina uma coisa que é prerrogativa do presidente da República, se eu… O cargo é dele.

Mas o sr tem um sentimento de já ter cumprido a missão, ou ser mais longevo do que o Mantega ou o Malan?

Eu já fui longevo demais no MEC. Eu não tenho esse fetiche. Eu estou completando nove anos de ministério. Seis e meio no MEC, dois e meio aqui. Não é isso. De novo, eu me movo pelo projeto. Pode ser que eu toque um projeto de seis meses, mas que me apaixone. Não precisa ter dez anos. Não é o tempo, não é o cargo, não é o salário.

A gente está chegando a quase um ano e pouco aqui da eleição, como o sr vê o Lula e o cenário eleitoral?

Eu penso que o presidente Lula vai chegar competitivo, com as bandeiras históricas que ele sempre defendeu, numa condição de disputar ideias. Faço o todo possível, não só para ajudá-lo, mas para ajudar o país a ter uma eleição decente, uma eleição programática. As últimas duas eleições, pela presença do Bolsonaro, não foram eleições que apontaram para o futuro. E isso é ruim. O que eu puder fazer para, primeiro, ajudar o presidente a chegar bem, porque eu acredito nas ideias, nas intenções, na energia dele em relação ao país. E, segundo, para o país também chegar discutindo coisas relevantes, sem aquele bate-boca estéril que não era nada, com fake news, horrível, que não se fala coisa com coisa, se acusa de qualquer coisa. É ruim, é o Brasil, é muito importante esse País.

Há uma preocupação do presidente em relação à eleição no Congresso, porque a relação de forças mudou bastante nos últimos anos. O senhor toparia uma campanha para o Congresso, para o Senado?

Primeiro, mudou muito, mas eu não considero que se eleger um pouco mais de deputado do campo progressista, de senador do campo progressista, vai mudar muito essa realidade, porque é uma realidade que mudou institucionalmente. Não é questão partidária, é questão institucional. Eu tenho elogiado muito o Supremo, que muitas vezes é acusado de se imiscuir em temas que não são dele, mas o Supremo só age provocado. O fato dele ter dito que o Congresso tem que observar a Lei de Responsabilidade Fiscal quando toma uma decisão, é uma revolução, por exemplo. Você imagina quantos governos passaram por pautas-bombas. Não foi o caso desse. Nós superamos um problema grave das pautas-bombas, que poderiam servir de instrumento de desestabilização institucional. A questão do Dino, que pode parecer rusga, provocação, mas o ministro Dino está com a melhor das boas intenções para normalizar as relações entre Executivo e Legislativo, dando transparência, garantindo que o recurso chegue de forma correta, para efetivamente melhorar a qualidade da vida das pessoas.

A gente acabou indo por outro caminho, mas o senhor acabou não respondeu a questão de uma mudança para o Congresso.

Eu acredito que a relação Executivo x Legislativo é como a relação Executivo x Judiciário. Desde janeiro de 2023, por decreto presidencial, eu faço parte de uma junta de acompanhamento das disputas judiciais envolvendo causas bilionárias. Nós tivemos uma relação com o judiciário espetacular, em que nós tivemos tempo de explicar o que estava acontecendo, qual era o impacto daquela decisão sobre as contas públicas. Se isso tivesse sido feito antes, a tese do século que quebrou o Brasil não teria acontecido. A tese do século, só ela, é responsável por mais de 10% da dívida pública brasileira. Só ela. Com consequências que até hoje se verificam na arrecadação. Então, nós estamos fazendo a boa política de harmonizar os poderes. E eu não acredito que… É muito importante fazer parlamentar. Mas a mudança de status institucional dos três poderes tem que ser superior a essa discussão sobre quantos senadores você vai fazer. Porque ela não pode depender disso para funcionar bem. Se o judiciário, se a segurança, a integridade moral e física dos ministros do Supremo depender do número de senadores de extrema-direita, ninguém vai querer ser ministro do Supremo. Se a extrema-direita fizer metade do Senado, o Supremo tem que subsistir, tem que sobreviver a isso. Nós estamos fazendo um outro tipo de concertação para que os poderes se harmonizem. Quem ganha eleição governa, mas os poderes da República não podem estar vulneráveis ao resultado das urnas. Pelo contrário, a democracia deveria fortalecer as instituições, não enfraquecer. É lógico que a extrema-esquerda, a extrema-direita, todos os extremismos… É que nós não temos força de extrema-esquerda no Brasil. Mas uma extrema-direita no Brasil, que é real, é significativa do ponto de vista eleitoral, ela pode ameaçar as instituições. Como agora está fazendo na relação com os Estados Unidos, ameaçando as instituições. O Poder Judiciário vai parar de funcionar porque tem uma ameaça extrema ao Brasil, em função do interesse de uma família? Qual o sentido disso? Então, pela segunda vez, eu estou disponível para o projeto, mas não tenho pretensões eleitorais no ano que vem.