Coluna: Matheus Baldi

Mineiro, Matheus Baldi é jornalista e apresentador, com passagens por UOL, SBT, Record e Band. Com mais de 4 milhões de seguidores nas redes sociais, já ultrapassou os 2 bilhões de visualizações em seus vídeos na internet. Diariamente, Matheus compartilha sua visão apurada e informações exclusivas sobre os bastidores do show business.

Não é só festa: o problemão que a Globo criou para ela mesma

A comemoração dos 60 anos da emissora, além de trazer um clima de nostalgia, também acabou gerando comparações, burburinhos de substituição de apresentador e até “desconforto” envolvendo Fátima Bernardes

Não é só festa: o problemão que a Globo criou para ela mesma
Não é só festa: o problemão que a Globo criou para ela mesma Foto: Reprodução/montagem web

A Globo tem muitos motivos para comemorar. E fez isso em grande estilo. No “Show 60 Anos”, exibido nesta segunda-feira, dia 28, a emissora promoveu um espetáculo à altura de sua história. Atualmente, sob o comando do competente Amauri Soares, diretor dos Estúdios Globo, e com direção artística de Antonia Prado, o canal carioca reuniu mais de 200 nomes das áreas de música, dramaturgia, jornalismo e esporte. Um palco monumental, com 550m² de painéis de LED e 80 toneladas de equipamentos, deu forma à grandiosidade da ocasião. A transmissão usou 12 câmeras de cinema — algo raríssimo se comparado a tudo que já foi produzido na TV brasileira.

O resultado foi emocionante. Rostos que marcaram gerações — e andavam sumidos das telas — reapareceram sorrindo. Homenagens, reencontros e um orgulho compartilhado por quem ajudou a construir a trajetória do canal foram exibidos em um show visualmente impactante e cheio de memória afetiva. Mas, entre uma reverência e outra ao passado, algo se acendeu de maneira involuntária: a constatação de que, no fundo, a Globo ainda não encontrou sucessores à altura de muitos de seus antigos sucessos.

Foi o próprio saudosismo que a emissora reativou que acabou abrindo um ponto sensível. No sábado, dia 26, a exibição da edição especial do “Vídeo Game”, com Angélica, trouxe à tona uma avalanche de pedidos por seu retorno. Nas redes sociais, espectadores foram além: sugeriram que a atração voltasse definitivamente — até mesmo no lugar do atual “Caldeirão com Mion”. O Caldeirão, aliás, enfrenta hoje uma crise de identidade. Ainda que menor, é um produto que tem apelo comercial, mas pesquisas apontam que perdeu a fidelidade do telespectador e parte do vínculo emocional da audiência desde a saída de Luciano Huck.

A audiência reflete isso. Enquanto o especial do “Video Game” marcou 9,6 pontos na Grande São Paulo, o “Caldeirão”, exibido em um horário de maior visibilidade, cravou apenas 10,2.

Tem mais. A novela “História de Amor” e o “Paulistar” exibidos em seguida, marcaram índices menores, reforçando que o game show nostálgico conseguiu gerar maior interesse mesmo em um horário mais difícil.

Mion é talentoso, ninguém duvida disso. Mas talvez mereça um novo desafio. Um projeto desenhado para seu estilo, sua energia e linguagem. Há, nos bastidores, quem diga que sob o seu comando o Caldeirão nunca conseguiu encontrar sua nova alma.

Enquanto isso, Luciano Huck acaba sendo citado, internamente, como uma referência. Por exemplo, a edição especial do “Domingão”, que homenageou grandes programas de auditório da história da emissora, foi mais um acerto. Com criatividade e bom humor, o time de Huck modernizou até mesmo o clássico “Sexolândia” de Faustão. Também teve o “Show de Calouros” de Silvio Santos e musical com o cantor Daniel. Resultado: 15,2 pontos, com picos de 17. Na média, foi o melhor desempenho do programa nos últimos seis meses.

É nos bastidores, inclusive, que a comparação entre Huck e Mion se torna inevitável. Ambos são figuras queridas do público, mas enquanto Huck conseguiu imprimir sua força no domingo — e conta com uma equipe criativamente afiada —, Mion, indo para o seu quarto ano no comando da atração, ainda tenta se encontrar nas tardes de sábado.

Soube também do “desconforto” de alguns contratados por conta de Fátima Bernardes. Alguns colegas disseram ter ficado sem graça de perguntar à jornalista sobre seus planos futuros no canal. Segundo uma fonte, Fátima não esconde a vontade de voltar, foi extremamente gentil com todos, e em alguns grupinhos o comentário era: “Por que ela não consegue voltar?”. Posso garantir que conversas existem, e que o carinho e admiração do alto escalão da TV Globo por ela é grande. Mas, por enquanto, o desafio está em encontrar um formato que seja comercialmente viável e com apelo de audiência. “O talento de Fátima é inquestionável. O desafio, agora, está muito mais nas questões estratégicas”, me confidenciou a fonte.

Celebrar 60 anos é um marco raro. Poucas emissoras no mundo conseguiram chegar a esse momento com tamanha relevância. Mas ao revisitar seu passado com tanto brilho, a Globo acabou lembrando ao público de algo que ele próprio não esqueceu: há formatos e figuras que deixaram saudade. E talvez o maior desafio da emissora hoje seja exatamente esse — criar o novo sem ignorar o valor do que já funcionou tão bem.

Ao emocionar o público com a memória, reativou a cobrança por uma nova fase igualmente inspiradora. Ainda assim, é preciso reconhecer: o fato de o público cobrar, sugerir e se engajar é prova de que a emissora continua sendo parte essencial da vida de milhões de brasileiros. Em um mundo cada vez mais fragmentado e hiperconectado, a Globo ainda é, com todos os seus desafios, uma das maiores potências da televisão mundial. Que venham muitos novos capítulos tão inspiradores quanto os que já foram escritos até aqui.