As eleições para a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e do Senado estão praticamente definidas. Desbancar o favoritismo de Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), respectivamente, só com uma bomba sobre o Congresso Nacional às vésperas dos pleitos, marcados para este sábado, 1º.
Motta e Alcolumbre adotaram a estratégia de sufocar os adversários e angariar apoios que vão do PT de Lula ao PL de Jair Bolsonaro. De quebra, ambos podem bater recordes de votação histórica na disputa pela presidência das duas Casas.
Mesmo com o favoritismo garantido, a dupla deve encontrar algumas dificuldades pelo caminho. Ao menos seis parlamentares prometem bater de frente com os favoritos para reduzir o alto número de votos prometidos a ambos.
Na Câmara dos Deputados, Hugo Motta deve enfrentar os deputados Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) e Marcel Van Hattem (Novo-RS), que já confirmaram suas candidaturas. No cálculo da banca de apostas, Motta deve angariar 475 votos, enquanto Vieira deve levar toda a sua bancada de 14 parlamentares. Já Van Hattem deve conquistar os quatro deputados de seu partido, além de alguns dissidentes do bolsonarismo raiz.
Em entrevista ao site IstoÉ, Henrique Vieira afirma que sua candidatura é um contraponto ao ódio provocado pelos adversários e avalia a necessidade de um choque de transparência na Mesa Diretora da Casa.
“A defesa da democracia, a não anistia para quem tentou um golpe contra a democracia e o enfrentamento político e pedagógico à extrema-direita justificam nossa candidatura nesse contexto. No Brasil, a extrema-direita tem relação com milícia, teve até plano ou tentativa de matar presidente, vice-presidente e ministro do STF. Ou seja, o que mais precisa acontecer para entendermos a gravidade do que está acontecendo no mundo e no Brasil?”, afirma.
“A Câmara precisa desse choque de uma gestão mais transparente, mais previsível, mais democrática, com pautas publicadas com mais antecedência para que o debate seja frutífero”, completa.
Dos três candidatos, Henrique Vieira é o que menos investiu em publicidade na Câmara. A reportagem do site IstoÉ encontrou apenas dois banners com o nome do deputado espalhados pela Casa na véspera da eleição.
Crítico da distribuição das emendas, o carioca vê a necessidade de avançar na discussão sobre transparência na destinação dos valores e defende o fim das emendas de comissão, principal impasse entre os Três Poderes na reta final do ano passado.
“O orçamento secreto não acabou, ele só foi atualizado por meio das emendas de comissão. São bilhões de reais que poderiam ser investidos de forma mais inteligente, pensando em melhorar a vida do nosso povo. Mas esse dinheiro fica pulverizado entre Lira e seus aliados, sem controle externo e sem transparência”, afirma.
“Eu acabaria com as emendas de comissão, que hoje significam a atualização do orçamento secreto: R$ 11 bilhões previstos para 2025”, completa.
Sabendo da dificuldade de se eleger, o deputado garante o protagonismo do PSOL na base de Lula e nas discussões com Hugo Motta em plenário. Ele admite a dificuldade de superar o adversário e diz que sentará com o novo mandatário para negociar os espaços da legenda na Casa.
“O Hugo Motta vai ganhar a eleição? Vai ganhar a eleição. Vou sentar com Hugo Motta de forma republicana, democrática, junto com o meu partido, para discutir o funcionamento da Casa e os espaços do PSOL, sem barganha, sem chantagem, sem toma lá, dá cá”, declarou.
Já Marcel Van Hattem segue uma linha completamente oposta à dos adversários. Mesmo sem apoio do PL, adota pautas bolsonaristas e conservadoras, como o PL da Anistia, que poderá beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Uma das pautas que o parlamentar gaúcho quer avançar é o pedido de impeachment de Lula. A ideia, inclusive, é destaque nos banners de sua campanha espalhados pela Câmara dos Deputados.
“O impeachment do Lula acho fundamental como primeira pauta. Assinei vários pedidos de impeachment, e esse é um anseio da população brasileira. O presidente da Câmara é quem vai ter que despachar”, disse o deputado.
“A anistia de todos os perseguidos políticos no Brasil vai pacificar o país. A CPI do Abuso de Autoridade precisa andar, e os abusos precisam ser combatidos para reequilibrar os Poderes.”
As chances remotas de cumprir as promessas em meio ao favoritismo de Hugo Motta parecem não preocupar o deputado, que tenta a presidência da Câmara pela segunda vez. Van Hattem acredita que as insatisfações entre os aliados de Motta podem favorecê-lo na disputa.
“Há muita insatisfação com a forma como essa candidatura do Hugo Motta foi criada. Apesar de ele ter as bênçãos de Arthur Lira, houve uma intervenção do PT no processo que acabou eliminando outros candidatos de centro.”
“Nós vemos que há uma insatisfação com a forma como essa candidatura foi construída e uma grande possibilidade de que uma parte significativa dos votos de partidos que fecharam apoio a um candidato seja depositada em uma candidatura como a minha.”
Essas insatisfações vêm dos bolsonaristas do PL, partido que fechou questão com Motta em troca de cargos nas comissões e da 1ª vice-presidência da Casa, que tende a ficar com Altineu Cortês (PL-RJ). A legenda chegou a emitir um comunicado determinando o voto em Hugo Motta.
Nos bastidores, um membro do partido disse ao site IstoÉ que a candidatura de Van Hattem é um “tiro pela culatra”. Na avaliação dele, se o número de votos para Motta for menor que o esperado, poderá dar margem para que o novo presidente da Casa não cumpra as promessas feitas ao PL.
Um dos líderes da oposição na Câmara, Marcel Van Hattem é um dos deputados que mais sobem o tom contra o governo Lula e seus aliados. Se conseguir reverter o cenário atual, o gaúcho promete mudar de postura, mas até segunda ordem.
“O presidente da Câmara tem um papel institucional, então ele precisa tratar todos os Poderes com a responsabilidade que lhe cabe. Isso, obviamente, não me impede de exercer minha opinião pessoal fora do ambiente da presidência, nem muito menos de dar seguimento ao processo de impeachment, que é minha primeira proposta”, disse.
“Vou presidir com independência e equilíbrio, deixando que todos os partidos atuem dentro de suas características, inclusive o meu, o Partido Novo, sem me manifestar na Mesa Diretora enquanto presidente da Casa, favoravelmente ao meu partido ou a outro.”
Davi contra quatro
Seguindo os passos da Câmara dos Deputados, Davi Alcolumbre está sereno quanto à votação deste sábado. É o favorito inquestionável e deve beirar os 75 votos, segundo a banca de apostas interna.
Mesmo com os votos no bolso, o amapaense deve enfrentar outros quatro adversários no pleito: Soraya Thronicke (Podemos-MS), Marcos do Val (Podemos-ES), Marcos Pontes (PL-SP) e Eduardo Girão (Novo-CE).
Soraya lançou sua pré-candidatura ainda no ano passado, em contraponto a Alcolumbre. Ela estudava sua viabilidade junto à bancada feminina, mas as articulações dos partidos obrigaram as senadoras a se juntarem ao atual presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.
Já Marcos do Val lançou candidatura própria em desafio ao próprio partido, que está rachado no Senado. Enquanto alguns devem seguir com Soraya, outros tendem a apoiar Davi Alcolumbre, enfraquecendo a candidatura do ex-policial.
O caso de Marcos Pontes é o mais curioso. Ex-astronauta, o senador lançou uma candidatura independente, sem apoio do próprio partido e sob pressão de seus pares para recuar da ideia.
Enquanto uns lançaram seus nomes à própria sorte, Eduardo Girão vê no voto aberto uma luz no fim do túnel. Atualmente, as eleições da Mesa Diretora são secretas, mas Girão afirma que, se fossem abertas, a votação de Alcolumbre seria menor que o esperado.
“O próprio Davi Alcolumbre, o favorito dessa eleição, foi eleito pelo voto aberto – em 2019, por uma campanha, uma mobilização nacional, de fora para dentro, que os senadores abraçaram”, afirma.
“Se tivermos o voto aberto, a gente vai derrubar o Golias da vez, que é o Davi. Na época, a gente derrubou o Renan Calheiros, que o brasileiro já conhecia e não queria no Senado. Ele [Alcolumbre] é o candidato do governo Lula, ele é o candidato do PT, ele é o candidato do PL, ele é o candidato dos poderosos de plantão. Entendeu? Então, a sociedade está do outro lado”.
Girão ainda defendeu um Senado mais afoito na separação entre os Poderes. Ao site IstoÉ, reforçou haver interferência do Judiciário nos trabalhos legislativos e vê a necessidade de pautar o impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
“O Senado está agachado. O Senado está no chão. Porque o STF tem legislado, inclusive, do nosso lugar. E o Senado nada faz”, declarou.
“Eu como presidente do Senado vou colocar o pedido de impeachment [contra o Moraes] para analisar. Não foi aprovado? Ok! Mas precisamos fazer o nosso dever”, completou.