Luzes de neon, corpos sensuais e o calor do nordeste brasileiro. Karim Ainouz volta a filmar no Brasil com “Motel Destino”, um thriller erótico na disputa pela Palma de Ouro, que celebra a vida através do sexo.

PERGUNTA: Como surge a ideia de “Motel Destino”?

RESPOSTA: “A primeira ideia era fazer um filme de suspense, que mantém todo mundo colado na tela. O suspense é uma maneira da gente chegar mais perto do público, sobretudo depois de uma pandemia, quando o cinema perdeu tanto lugar. Outra ideia era fazer um filme onde eu pudesse falar do desejo, do inconsciente, da paixão e de uma certa explosão de vida.”

P: Este é seu filme mais erótico. Era sua ideia inicial?

R: “Eu queria fazer um filme que fosse erótico, que fosse sensual, mas uma sensualidade que celebra a vida, não uma sensualidade que fala de morte. Era para mim muito importante, depois de tanto tempo que a gente passou sob um regime autoritário que a gente teve no Brasil, um regime de terror onde a verdadeira obsessão era a morte. Queria fazer um filme onde a gente vai celebrar a vida. E eu acho que nada é mais vital que o sexo.”

P: Para isso, teve que voltar a filmar no Brasil, sua terra natal?

R: “Fazia cinco anos que eu não filmava no Brasil. Esse filme é uma espécie de retomada da vida. Numa entrevista eu falei que a gente saiu da UTI depois de tantos anos de governo de extrema direita. Para mim, eu estava precisando filmar num lugar que eu tivesse o mesmo sotaque, no lugar onde eu conheci essa luz e que fosse quase febril.”

P: Por que escolheu um motel?

R: “É um lugar tão brasileiro, onde tudo pode acontecer entre quatro paredes. Na hora que aquilo se torna público, está falando da sociedade, que se diz livre, que se diz alegre, mas é uma sociedade absolutamente hipócrita e contraditória. O lugar do motel era como uma espécie de radiografia do Brasil, onde a gente pode escutar o que o outro está fazendo.”

P: Como foi filmar as cenas eróticas?

R: “Foi muito bacana poder trabalhar com uma coordenadora de intimidade. A dança [do ato sexual] e a intimidade são duas facetas da mesma coisa. É sempre muito importante. A gente viveu durante tantos anos relações de abuso sexual no cinema, de abuso de poder. Tem um ato de reparação histórica que a gente tem que fazer. A gente não está aqui por acaso. A gente não chega a situações de abusos sexuais por acaso.”

P: Seus filmes costumam ter personagens femininos fortes. Em “Motel Destino”, embora não seja um tema central, também trata da violência contra as mulheres.

R. “É um assunto que não tem como não ser relevante num país que mata uma mulher a cada seis horas. Eu sempre tive uma empatia muito grande com o lugar do feminino por razões diversas, mas eu tinha poucas vezes adentrado o lugar da construção desse homem tóxico, como [o personagem] Elias [protagonizado por Fábio Assunção]. Mas, nesse filme eu tentei fazer o que nunca tinha de fato feito antes, que é uma espécie de anatomia do macho, uma anatomia do patriarcado através do personagem machista.”