18/04/2018 - 17:13
Usar uma versão colorida e esportiva da abaya tradicional era considerado antigamente um ato de rebelião cultural na Arábia Saudita, mas as mulheres o transformaram em uma tendência de moda.
Em março, imagens de mulheres atletas vestidas com roupas esportivas na cidade ocidental de Jidá, à beira do Mar Vermelho, circularam pelas redes sociais.
Estas fotografias provocaram um novo debate sobre a liberdade das sauditas na hora de escolher sua vestimenta, em um país que obriga as mulheres a usarem a abaya – uma túnica preta que cobre todo o corpo – em público.
Alguns puristas se indignaram e denunciaram um ataque à tradição, enquanto outros defenderam essa evolução dos costumes. É impossível avaliar o peso de cada um dos lados na sociedade.
O jovem príncipe herdeiro Mohamed bin Salman, o novo homem forte da monarquia, e um alto dignitário religioso asseguraram recentemente que o islã não impunha vestir a abaya, mas o poder saudita não mudou a lei em vigor.
Enquanto o debate segue, criadores e estilistas como Eman Joharjy, uma saudita de 43 anos, se beneficiam da crescente popularidade das abayas esportivas. “Há uma grande demanda”, diz à AFP em seu ateliê de Jidá.
As novas abayas, parecidas a um macacão com zíper, cobrem o corpo da mulher mas lhe oferecem uma maior mobilidade para fazer atividades físicas, ao contrário da versão clássica, que pode ser perigosa para correr.
Eman Joharjy escolheu cores como verde pistache, bege e branco para seus modelos, tons que tornam o calor mais suportável. Mas ao fazer isso se opôs a uma máxima popular na Arábia Saudita: “Se não é preta, não é uma abaya”.
Suas versões esportivas são confeccionadas com tecidos naturais, incluindo a popelina, que não grudam em um corpo suado.
– Mulheres maratonistas –
Eman Joharjy lembra que foi considerada um fenômeno social quando começou a desenhar e vestir abayas esportivas em público em 2007. Alguns compatriotas chegaram a apelidá-la “Batman”.
“Concebi-a para mim porque é prática”, explica.
Seus modelos foram evoluindo com novas estampas, tecidos e adornos. Certas mulheres os usam com um boné de beisebol em cima do véu.
A última tendência é uma coleção de abayas com as cores dos times de futebol locais, voltadas para as torcedoras.
Estes novos vestidos apareceram depois de que a monarquia permitiu o acesso das mulheres a alguns estádios, coincidindo com várias medidas destinadas a reduzir as graves restrições impostas às mulheres. Estas poderão dirigir a partir de junho.
As autoridades também tentam dar um novo impulso ao esporte feminino e anunciaram que as mulheres poderiam participar pela primeira vez em 2019 na maratona internacional de Riade, até agora reservada aos homens.
A polícia religiosa, que durante muitos anos reprimiu as mulheres maquiadas ou que faziam esportes em público, quase desapareceu das ruas. E a ideia de abandonar a abaya, impensável até pouco tempo atrás, parece estar ganhando terreno.
– “Roupa decente” –
“As leis são muito claras e estão previstas na sharia (lei islâmica): que as mulheres usem roupas decentes e respeitosas, como os homens”, declarou em março o príncipe Mohamed bin Salman à rede de televisão americana CBS.
“Isto, no entanto, não especifica que seja uma abaya preta. São as mulheres que devem decidir o tipo de roupa decente e respeitosa que vestem”, acrescentou.
O sheik Abdullah al Mutlaq considerou, por sua vez, que as mulheres não deveriam ser obrigadas a vestir a roupa tradicional.
Essas evoluções suscitam, no entanto, reações contrárias em uma sociedade muito conservadora.
“Parecem mulheres da limpeza!”, tuitou um internauta em resposta a uma foto de mulheres com abayas esportivas.
“Seu objetivo não é o esporte. Todas corremos com um véu integral”, tuitou por sua vez uma mulher oposta a essas mudanças indumentárias.
Marwa al Hadi, cliente de Eman Joharjy, entra em sua loja usando um desses modelos de abaya esportiva com tênis de cor rosa intenso.
“A abaya é como o sári indiano, faz parte de nossa identidade”, diz a ela a estilista. “Mas se Deus não quisesse que as mulheres fizessem esportes, não teríamos músculos nem corpo”.
A cliente opina: “Não é da conta de ninguém questionar o que eu visto”.