Museu regional de Kherson, ‘em choque’ após saques russos

Museu regional de Kherson,

Ao ver as vitrines quebradas e as prateleiras vazias de um museu de Kherson, uma cidade do sul da Ucrânia recentemente recuperada dos russos, a diretora interina da instituição, Olga Goncharova, diz que sentiu “uma punhalada no coração”.

Depois de mais de oito meses de ocupação russa, ela descobriu, consternada, o estado em que deixaram as instalações do museu.

Dedicado à história local, o Museu Regional de Kherson abrigava cerca de 180 mil objetos em seu acervo antes da invasão russa, deflagrada no fim de fevereiro deste ano.

“Tudo o que tinha valor material foi roubado, ou transferido para um local desconhecido”, disse Olga à AFP, durante uma visita ao centro.

“Todas as fotos, os documentos, tudo o que havia… tudo me era familiar”, afirmou.

“É a minha segunda, ou talvez, a minha primeira casa”, acrescentou.

O estado de desolação que ela encontrou ao retornar deixou-a sem palavras.

“Foram emoções incomparáveis. Como uma punhalada no coração”, desabafou.

“Foi um choque terrível”, completou.

Desde a retirada forçada dos russos de Kherson, expulsos pelo Exército ucraniano durante uma contraofensiva, Olga avalia os danos e os roubos.

“Naquele momento, me dei conta, diretamente, ao ver esses atos de vandalismo, de que a ‘grande cultura russa’ de que eles falam não existe”, denunciou, perguntando-se como os soldados russos puderam ser “tão cruéis com o museu”.

O Museu Regional de Kherson é um dos quatro centros culturais da cidade que foram selvagemente saqueados durante a ocupação, denunciou a ONG Human Rights Watch (HRW) em um comunicado divulgado na terça-feira (20), evocando “crimes de guerra”.

“O povo de Kherson ficou meses sofrendo torturas e outros abusos durante a ocupação russa, e depois viram como eles iam empacotando e levando seu patrimônio cultural e histórico”, lamentou a vice-diretora do Departamento de Crises e Conflitos da HRW, Belkis Wille.

“O povo ucraniano tem direito à restituição de todos os objetos roubados e à justiça”, acrescentou.

– ‘Estava tudo destruído’ –

Goncharova assumiu pessoalmente a responsabilidade de proteger vários objetos.

“Todas as obras expostas passaram pelas minhas mãos”, lembrou.

Nos últimos dias, seu trabalho mudou drasticamente. Agora, ela registra o que foi roubado: objetos de ouro, peças inéditas, armas, medalhas militares, entre outros.

Segundo a imprensa ucraniana, os russos transferiram alguns dos objetos desaparecidos deste estabelecimento e do Museu Regional de Belas Artes de Kherson para museus da Crimeia, península ucraniana anexada por Moscou em 2014.

A Promotoria ucraniana suspeita de que a antecessora de Goncharova à frente do museu, Tetiana Brachenko, teria colaborado com os ocupantes. Ela teria, inclusive, fugido para a Rússia quando o Exército ucraniano assumiu o controle da cidade.

Segundo um funcionário da segurança do museu, citado pela HRW, os russos em trajes civis ocuparam o museu “em inúmeras ocasiões”, especialmente para celebrar o Dia da Bandeira Nacional Russa, em agosto.

A ONG informou que, em outubro, cerca de 70 pessoas foram ao museu, então guardado pelo Exército russo, para recolher objetos e levá-los em três caminhões.

Segundo a ONG, “pelo menos 450 objetos” desapareceram.

Entre eles, haveria “ouro dos citas, medalhas imperiais russas e moedas”, além de pinturas, móveis e uniformes militares da época soviética. Um tesouro local, herdado de centenas de anos de história.

“É um ato bárbaro”, disse Goncharova, com raiva. “Está tudo quebrado e destruído”, lamentou.