Ele disse várias vezes e, nesta terça-feira (5), vamos ver se é verdade. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, poderá ameaçar em seu discurso sobre o Estado da União que vai recorrer à “emergência nacional” para construir um muro na fronteira com o México, um recurso que os democratas já deixaram claro que vai parar nos tribunais.

– O marco legal –

Aprovada em 1976, a “National Emergencies Act” dá ao presidente dos Estados Unidos o poder de declarar uma “emergência nacional” para conceder poderes extraordinários, desde que haja uma razão para fazê-lo.

Com um simples decreto, a Casa Branca pode, deste modo, proclamar a lei marcial, restringir as liberdades civis, confiscar propriedades privadas, mobilizar a Guarda Nacional e recrutar pessoal militar, entre outros pontos.

Segundo esta lei, ambas as Casas do Congresso têm de se reunir seis meses depois do decreto presidencial para renovar, ou abolir a medida. E deve ser renovado depois de um ano. Do contrário, caduca automaticamente.

Em caso de emergência, outra lei permite ao presidente usar o orçamento do Exército para “projetos de construção militares”. Mas é difícil que o muro entre nesta categoria.

– Muitos precedentes –

Todos os presidentes usaram esta disposição. Muitas dessas ordens se renovam a cada ano, e mais de 20 medidas de emergência estão em vigor.

O presidente George W. Bush declarou várias emergências depois dos ataques do 11 de Setembro de 2001 em Nova York, para aumentar os recursos do Exército para além do orçamento votado, lançar programas secretos de vigilância, ou realizar interrogatórios violentos de prisioneiros. Tempos depois, estes mesmos interrogatórios foram equiparados à tortura e proibidos.

Barack Obama suspendeu o sigilo médico durante a epidemia de gripe H1N1, em 2009, para permitir aos hospitais responder mais rápido.

Esta lei foi usada com mais frequência para impor sanções contra países como Venezuela, ou Sudão e Zimbábue.

– O caso do muro –

Durante seu discurso ao Congresso, Trump poderá declarar uma “emergência migratória” na fronteira com o México, onde as autoridades prenderam mais de 153.000 estrangeiros que entraram ilegalmente no território americano entre outubro e dezembro passado.

Uma lei de migração define esse tipo de emergência como “um fluxo de estrangeiros de tal magnitude” que os governo não conseguem mais administrar a situação.

O magnata republicano poderia, então, enviar mais soldados para a fronteira (logo serão 4.350) e liberar até 20 milhões de dólares em verbas especiais, muito menos do que os 5,7 bilhões de dólares que exige do Congresso e o Legislativo tem se recusado a autorizar. Essa queda de braço foi responsável pelo shutdown de 35 dias que paralisou o governo entre dezembro e janeiro.

Além disso, o eventual muro cruza muitas terras privadas, motivo pelo qual os proprietários podem desafiar a legalidade das expropriações.

O Congresso tem o poder de impugnar qualquer decreto de emergência. Os democratas, que controlam a Câmara de Representantes, já indicaram que, se for necessário, farão todo o possível para bloquear essa medida, inclusive nos tribunais.

“Tenho certeza de que haverá um recurso”, disse a senadora democrata Debbie Stabenow na última sexta-feira. O muro “se tornou um símbolo político, mais do que qualquer outra coisa para o presidente”, completou.

Mesmo os congressistas republicanos se opõe ao muro de Trump.

“É mais caro e menos efetivo para a segurança da fronteira”, afirmou, em meados de janeiro, o representante pelo Texas Will Hurd, cujo distrito eleitoral é limítrofe com o México.