Em meio às gravações da série “E se eu fechar os olhos agora”, que irá ao ar pela TV Globo no próximo ano, o ator Murilo Benicio falou a ISTOÉ sobre seus novos projetos e a relação com a atriz Débora Falabella, parceira na vida pessoal e profissional. Ele interpreta Adriano, prefeito da fictícia cidade fluminense em que se passa a trama de assassinato escrita pelo jornalista Edney Silvestre. Ansioso pela estreia de seu primeiro filme como diretor, “O Beijo no Asfalto”, previsto para o semestre que vem, Murilo se prepara para rodar em abril o seu segundo longa-metragem, “Pérola”, baseado em texto de Mauro Rasi e que terá Drica Moraes como protagonista. E seu projeto seguintes como diretor será uma adaptação da peça “Doctor Foster”, que terá a companheira Débora como protagonista.

Por que decidiu abraçar a carreira de diretor?

O que me deu vontade de dirigir é saber que o ator sofre muita falta de um diretor que entenda de ator. No Brasil são raríssimos os diretores que realmente sabem dirigir um ator, e eu sei. Não porque sou melhor nem pior que ninguém, mas simplesmente porque sou ator, penso como ator e sei como ele se sente. Eu estou muito interessado nessa estrada que está se abrindo na minha frente.

 O que o levou a filmar “O Beijo no Asfalto”, de Nelson Rodrigues?

Eu conheci Nelson Rodrigues com meu pai, ele era um cara que lia muito e eu dedico “O Beijo” a ele. Eu ficava com essa coisa de Nelson Rodrigues na minha cabeça desde que eu tinha 8 anos. É dessas histórias que você vê e já vem um filme na cabeça. Esse era um projeto antigo que eu queria ter feito há 10 anos, cheguei a comprar os direitos autorais do meu bolso e acabei perdendo porque na época estava fazendo muito coisa. Fiquei frustrado e deixei de lado. Ninguém quer saber de Nelson Rodrigues, é difícil pra caramba. Você está numa reunião e tem de explicar a importância do que não precisa nem ser explicado. Isso é muito chato.

Como foi retomar o projeto?

Depois de 10 anos eu estava fazendo “Força Tarefa”, série da Globo, e o Lula, filho do Valtinho Carvalho, estava fotografando. Ele me falou, “cara, por que você não retoma ‘O Beijo’? Isso tá tão mais fácil, tem tanto incentivo”. Aquilo ficou na minha cabeça e eu retomei o projeto. E, claro, ninguém se interessa por Nelson Rodrigues. Eu não tive apoio nenhum, fiz o filme do meu bolso, custou um milhão de reais, um filme barato, mas uma fortuna para o bolso de qualquer pessoa. E agora a gente está esperando. Foi lindo o resultado e eu tenho o maior desprendimento de falar porque não é só meu o trabalho, sabe? Falo do trabalho das pessoas que fizeram o filme. Quando você é diretor, você divide muito mais o trabalho com os outros. No segundo semestre estamos lançando no Brasil. Eu queria muito fazer alguma coisa com as escolas, para as escolas verem de graça. É muito importante ter o Nelson Rodrigues ao alcance da gente.

Como será sua adaptação de “Pérola”, de Mauro Rasi?

É engraçado, quando eu assisti “Pérola”, na hora em que a peça terminou, eu virei para o Mauro e falei: “isso é um filme”. E isso nunca saiu da minha cabeça. Acabamos nos afastando por conta de trabalhos e depois eu soube que ele também tinha a sensação de que aquilo era cinematográfico, que dava para ficar muito especial. Então depois de fazer “O Beijo”, eu procurei a família do Mauro e comprei os direitos da peça. Estamos aí, fazendo esse filme que está lindo. Está muito no comecinho, fizemos uma leitura agora, já com o pré-elenco. A Drica (Moraes) já está no universo de “Pérola” e eu já sinto que vai ser lindo.

Como era sua relação com o Mauro?

O Mauro foi meu amigo. Ele me chamou para fazer “As Tias”, que foi sua peça seguinte a “Pérola”. Então era uma época em que estávamos juntos de quinta a domingo.

Algum cuidado especial ao dirigir um filme que conta a história de um amigo e da família dele?

O texto dele não é fiel aos fatos que ele viveu, o que é fiel é um sentimento, um estado de espírito, uma outra coisa. Nós tivemos uma liberdade muito grande de criar outros fatos e outra história para conduzir um flashback no filme, porque o texto é extremamente teatral. Tivemos muito trabalho pra fazer o roteiro, fizemos adaptações, mas tivemos muito cuidado para sermos fieis à atmosfera do Mauro e do que era Pérola.

Há novos projetos à vista depois de “Pérola”?

A gente tá até com muito projeto (risos). A Débora (Falabella) fez duas peças do Marc Bartlett, que é um autor inglês relativamente novo. Os textos dele são surpreendentes. Ela ficou tão doida com ele que começou a pesquisar. Aí ela chegou e falou: “tem uma série dele na Netflix chamada Doctor Foster”. Eu falei: “Nossa, sério?”. E a gente viu. É uma série genial. Eu que estou com a cabeça para dirigir, quero produzir, falei “Você pode fazer a Doctor Foster! Vamos fazer aqui no Brasil”. Eu tenho uma advogada americana e pedi para ela descobrir como conseguiria os direitos. Depois de uma semana ela já tinha falado com Londres, já tinham encaminhado o assunto e nós começamos a negociar. Bom, o fato é que eu estou com os direitos de Doctor Foster e, se tudo der certo, iremos filmar este ano.

Como estão as coisas com a Débora?

Nós estamos vivendo um momento que é muito complicado e histórico no Brasil. Não sabemos como as coisas vão acontecer, as coisas estão mudando, mas ao mesmo tempo nunca se teve tanta oportunidade para trabalhar. Hoje as possibilidades como ator, diretor e produtor são muito maiores que antigamente e isso até me assusta, porque as coisas funcionam e de uma forma muito rápida. Se você tem uma boa ideia e competência para fazer, não é difícil fazer as coisas andarem.

O que você quer dizer com momento complicado? Você está se referindo à crise financeira e aos cortes no orçamento da cultura?

Sim, é isso mesmo. Como as pessoas podem pensar que a cultura não é uma necessidade? A cultura vai salvar esse país, a cultura e a educação, mas é o primeiro orçamento a ter os custos cortados. É muito curioso porque a cultura vem antes da segurança, antes de tudo, porque ela é a base de tudo. Um país que oferece cultura para todo mundo tem muito menos problemas de segurança, como os que estamos vendo no Rio de Janeiro.

Sobre o relacionamento com a Débora, você só falou sobre trabalho…

A minha história com a Débora funciona demais porque temos muitas ideias, eu tenho a ideia ímpar e ela tem a ideia par. As ideias que me faltam ela traz para mim e vice-versa. Rende muito nossa conversa, as coisas que são feitas, o que fazer, o que não fazer. A gente estuda um texto e um chama o outro quando tem uma dificuldade, funcionamos muito como uma dupla. É realmente uma parceria quando estamos juntos. Vai além do amor, do carinho, do estar apaixonado, do homem-mulher. É uma parceria, é uma coisa de dois amigos que trocam ideias e informações, e crescem com isso.