Há uma história que contam jogadores de golfe e que ajuda a entender a descriminação. Era um clube muito careta, que não aceitava mulheres como sócias. As esposas dos membros podiam ir ao club house, usar o restaurante e até participar de eventos; mas não podiam jogar. Os estatutos não permitiam.

O sistema proporcional de cotas que o Brasil utiliza, chamado de “cotas abertas” (e não fechadas como na Europa) é assim que nem este clube de golfe. Como não preordena os candidatos, mesmo que as mulheres candidatas sejam a maioria, elas não vão ser eleitas porque ocupam os últimos lugares da lista. É por isso que, mesmo com o percentual de 30% garantido, o número de mulheres eleitas em 2018 para a Câmara de Deputados de São Paulo foi apenas de 15%. Metade do que a lei determina.

O atual sistema de cotas na política é discriminatório para as mulheres porque foi desenhado para proteger os homens e não para promover as mulheres. Por isso reclamo. Eleger 15 mulheres em 100, não é par. Par é 50 em 100. Tudo o resto é triplo bogey.

Mas os tempos mudam e um dia, uma carta assinada por todas as esposas chegou ao presidente do clube careta. “Queremos o direito a jogar” – reclamavam as meninas. E foi preciso esperar. Como a direção se reunia apenas uma vez a cada três anos, foram precisas três reuniões para que o assunto chegasse a plenário.

Depois de quase uma década de aguardo lá chegou a desejada resposta: “A direção do clube, considerando o espírito tradicionalista da nossa instituição, mas entendendo a insistência das esposas dos queridos sócios, refletiu sobre as mudanças na sociedade e deliberou que, a partir do próximo ano as mulheres também podem jogar. Desde que na estrita observância dos antigos usos e costumes do nosso clube”.

Sem ler as letras miudinhas as meninas cantaram vitória e beberam champanhe. Mas a história não parou na festa e inesperadamente, nem um mês depois, nova carta chegava na direção. As agora jogadoras exigiam que os homens parassem de fazer xi-xi durante os jogos. Repetindo-se o longo ciclo deliberativo, a resposta (ainda mais inesperada), só chegou outra década depois: “Reunida, a direção do clube, blá blá blá, deliberou, que as senhoras jogadoras, querendo… também podem usar o campo para fazer xi-xi.

Numa sociedade secularmente machista como é a nossa, o caminho para a igualdade de gênero não passa apenas por lutar pela igualdade de direitos, mas sim pela conquista das diferenças.

Só assim as mulheres jogarão abaixo do par.