Ao ver aquela magrelinha no palco abrindo o espetáculo e soltando a voz foi mágico. Era a primeira apresentação dentro do circuito Teen Broadway. Any estava apenas com sete anos e arrebatou a plateia com  o solo Aquarius, no musical Hair. Que emoção, que potência vocal. Mas o que mudaria para sempre nossas vidas foi quando, ao encontrá-la na coxia do teatro, ela colocou as duas mãozinhas no coração e me disse:

– Mamãe, hoje é o dia mais feliz que já vivi, e eu quero fazer isso para o resto da minha vida. Obrigada.

Chorei muito de felicidade. Aquela apresentação do musical trouxe à tona o que eu já sabia – ela nasceu para brilhar. Any tinha me dito no sonho, quando eu estava grávida, que devia ter aquele nome. De alguma forma isso se gravou em nós, e desde então tive certeza de que ela podia se tornar uma estrela. Mas como manter essa certeza viva, na escassez que precisávamos enfrentar todos os dias?

Quando Any estreou no Hair, a Belinha, minha filha mais nova, tinha acabado de nascer. Eu estava amamentando, não tinha carro, corria para cima e para baixo com as duas. As pessoas falavam: “ mas você é doida de andar com este bebê tão pequeno, que judiação”.  Como isso me doía, mas a opção era desistir da Any e deixar pra lá o sonho que parecia impossível – ou lutar com todas as armas, vencer os obstáculos e inventar uma solução.

Conversei com a Any e fizemos um pacto: se é isso mesmo que você quer precisa ter determinação e foco, vamos ter um plano de ação. E foi o que fiz, traçando um roteiro de preparação para audições e concursos para os quais ela precisaria se submeter. 

Any se aplicava nas aulas de canto com a tia, estudava balé e idiomas, eu trabalhava arduamente E assim fomos levando a vida, exatamente como projetamos depois de sua estreia no musical. Naquela época a gente morava num quarto de menos de 30 metros quadrados, eu dormindo numa cama de solteiro com a Belinha, ela no colchão que colocávamos no chão – e todo mundo acordando cedo para estudar ou trabalhar.

Aos 9 anos, disputando uma audição com 5 mil meninas, Any conquistou o papel da jovem Nala, em O Rei Leão.  Pensei que teria um infarto na estreia do espetáculo. A minha menina dominando a cena, protagonista de um musical exemplar. “Ela parece ter um amplificador no pulmão, que voz estupenda, que emoção esta garota transmite”, era o que eu ouvia no teatro, um incentivo e tanto para quem tinha sido tão criticada.

“Você sonha demais”, não paravam de me dizer. Percebi que para chegar onde quer que fosse precisaria tirar tudo de negativo do caminho e focar no que realmente valia a pena. Porque mesmo no caos econômico em que vivíamos continuava com força, coragem, profundamente apaixonada pela vida.

Eu fiz muito e faria tudo de novo. Assim como Any se desdobrava a cada espetáculo, crescendo de forma surpreendente. Em outra audição, apenas alguns anos depois, ela se consagraria para o mundo dando voz à Moana, na versão brasileira do filme da Disney. Foi um sucesso esplendoroso. ”Saber quem sou”, o tema em português do filme, bateu 500 milhões de reproduções no Youtube.

 

 

Não foi sorte, embora também tenha sido – foi principalmente o resultado de muita dedicação, muita criatividade nossa. A gente queria sempre mais, e para divulgar seu papel no filme eu mesma ligava para os jornais, oferecia as entrevistas… Pesquisei o figurino da personagem e conseguimos fazer uma roupa parecida que Any usou, numa série de fotos numa pracinha do Morumbi… E não é que criamos algum astral de ilha da Polinésia? Assim eu mandava as imagens para revistas, jornais, e aos poucos conseguíamos matérias para divulgar a nova dubladora.

Hoje vejo que muitos querem colher grandes realizações, mas poucos são os que semeiam coisas boas. Aprendi que, ao invés de reclamar, de ficar perdendo tempo, é preciso tentar algo novo. Sabe o que eu lhe diria? Você tem um potencial enorme dentro de você. Não dê ouvidos a pessoas negativas. As neuroses dos outros podem asfixiar nossa alma. Não se permita desistir. Sonhar é preciso, e mais do que isso é preciso estar disposto a tirar, de cada briga feia, uma vitória linda. Nunca deixe de sonhar porque, se você deixar, ninguém vai sonhar por você.

 

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.