A coordenadora de eventos Denize Kaluf, de 59 anos, fixou uma faixa com um pedido de socorro na janela de seu apartamento, na Vila Gumercindo, na zona sul de São Paulo, após ser assediada e ofendida por um vizinho. “Socorro! Sou mulher e vítima de injúria e assédio”, escreveu.

O homem mora no apartamento em frente ao dela e, segundo Denize, a chama de “fofoqueira”, “lixo” e “vagabunda”, além de outros xingamentos.

Denize conta que, nos últimos dois anos, vem sendo vigiada e importunada por esse vizinho. “Ele me xingava o tempo todo, reclamava de minha TV ligada, mandava fechar a janela, sair do telefone”, disse.

Ela contou que, há pouco mais de um ano, chamou o homem para conversar, mas não houve diálogo. Ele levantou a voz de uma forma que ela se sentiu ameaçada.

A coordenadora de eventos conta que tentou até se tornar “invisível” dentro da própria casa para evitar o assédio. “Cheguei ao ponto de rastejar dentro do apartamento para que ele não me visse. Tinha de ficar tudo fechado, não podia abrir janela mais, nem para tomar sol”, contou.

A última investida dele foi no dia 11 deste mês, segundo ela. “Eu estava procurando um programa na TV e ele gritou: ‘Não precisa procurar, é tudo um lixo e você é um lixo.'”

Depois de ter procurado a administração do condomínio, ela registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil, mas acabou não dando sequência. O tipo de denúncia exige que a pessoa confirme formalmente a queixa para que o possível crime seja investigado.

Em abril deste ano, ela voltou a registrar uma ocorrência, apontando como testemunha uma outra moradora do mesmo edifício. O homem foi chamado a depor na Polícia Civil, mas voltou dizendo que “isso não vai dar em nada”.

Após a abertura do inquérito, segundo ela, o homem parou de proferir ofensas, mas manteve uma postura de assédio. “Ele não xinga mais, mas quando me vê uiva feito cachorro. Outras pessoas do prédio ouvem e isso acontece exatamente no momento em que estou na sala ou que saio na minha varanda. Ficou uma situação insustentável.”

A moradora disse que decidiu colocar o cartaz como uma medida extrema, para que outras pessoas se sensibilizassem e pudessem ajudar outras mulheres que estivessem na mesma situação. Antes, ela gravou um vídeo e enviou ao condomínio informando e pedindo desculpas por eventuais transtornos. “Já havia em 2021 um B.O. (boletim de ocorrência) de duas mulheres do próprio edifício contra o mesmo homem. Uma delas saiu do prédio por medo”, disse.

Depois do dia 11, quando se viu rastejando em seu apartamento, ela decidiu dar um basta. Após Denize formalizar por e-mail uma queixa à administradora do condomínio, recebeu resposta que o condômino havia sido advertido anteriormente e agora está sendo multado, “Esperamos que as importunações cessem”, diz o documento.

Denize se disse sensibilizada com a rede de apoio que se formou após a sua denúncia do assédio. “Obrigada por me acolherem e estenderem as mãos!”, disse, em postagem. “Eu vou me libertar! Dentro do que acredito, que é agir de forma lícita, com respeito às leis e de forma a instruir e construir uma sociedade para cuidar e amparar vítimas. Omissão não instrui. Medo não liberta. Coragem constrói”, escreveu.

À reportagem, ela disse que o que mais doeu foi ver o sentimento de omissão em relação ao problema que estava vivenciando.

Crimes de injúria e de ameaça

Para o criminalista Matheus Falivene, doutor em Direito Penal, o vizinho pode estar cometendo crime de injúria e, em tese, de ameaça. “O meio adequado é procurar a polícia e, por se tratar de ação penal condicionada à representação do ofendido, não basta registrar o boletim de ocorrência. É preciso dar sequência à ação representando contra o autor da ofensa ou ameaça.”

De outro lado, ao colocar o cartaz, a mulher não incorreu em crime, segundo ele. “O cartaz não acusa, não aponta ninguém, então não há crime.”

Para o jurista, o condomínio dispõe de regras e normas internas que poderiam resolver a situação. “O condomínio pode advertir e multar quando as regras são descumpridas. O Código Civil permite até que se expulse um condômino em caso de conduta imprópria reiterada”, disse.

A reportagem entrou em contato com o Condomínio Edifício Maison Albernaz e ainda aguardava retorno até o fechamento deste texto. O jornal O Estado de S. Paulo não conseguiu contato com o suposto autor do assédio.