Uma salvadorenha condenada a 30 anos de prisão pela morte de sua recém-nascida foi libertada após quase oito anos presa, depois de uma revisão da pena, anunciou nesta quarta-feira (17) uma organização feminista que denunciou o caso como uma criminalização do parto.

Lilian, que prefere ser identificada apenas por esse nome, foi solta em dezembro e participou de uma coletiva de imprensa nesta quarta, acompanhada de ativistas do Grupo Cidadão pela Descriminalização do Aborto.

“A satisfação é muito grande porque, apesar de passar por um processo muito longo, foi possível comprovar minha inocência”, declarou à AFP a mulher de 28 anos.

Segundo a organização, Lilian era a última mulher que permanecia na prisão das 73 condenadas por abortos ou emergências obstétricas, acusadas pelo crime de “homicídio agravado”.

Em 2015, Lilian deu à luz em um hospital público de Santa Ana, oeste de El Salvador, mas sua bebê apresentou algumas complicações e foi levada para uma incubadora, onde morreu após 72 horas, relatou à AFP a advogada Abigail Cortez.

Segundo a defesa, o hospital cometeu “negligência” no cuidado da criança, mas para evitar sua responsabilidade, acusou Lilian de “abandono e desamparo”.

A promotoria apresentou a acusação de “homicídio agravado”, pela qual foi condenada a 30 anos na cadeia. Em 2023, porém, um tribunal revisou a pena e ordenou sua libertação.

“Estamos muito felizes por encerrar um ciclo”, declarou Mariana Moisa, coordenadora do Grupo Cidadão, ao encerrar a chamada campanha “As 17 e mais”, iniciada em 2014 com o apoio da “solidariedade” internacional.

No entanto, ela esclareceu que ainda há cerca de 20 casos tramitando que precisam ser rejeitados ou levados a julgamento.

O Código Penal de El Salvador estabelece uma pena de dois a oito anos por aborto em qualquer circunstância.

Mas promotores e juízes frequentemente tipificam casos de aborto ou até mesmo a perda involuntária do bebê como “homicídio agravado”, um crime punido com 30 a 50 anos de prisão.

A severidade da lei salvadorenha com relação ao aborto veio à tona em 2013 com o caso de Beatriz, uma jovem de 22 anos que sofria de lúpus e que foi impedida de abortar, apesar de seu feto não ter desenvolvido o cérebro, ou seja, estava condenado a morrer.

Em 3 de junho de 2013, após a intervenção da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Estado autorizou uma cesariana para Beatriz, e o recém-nascido morreu horas depois.

Beatriz morreu em um acidente de trânsito em 2017, mas a Corte Interamericana emitirá nos próximos meses uma sentença sobre o caso.

cmm/mis/atm/ic/mvv