Incentivos bilionários para data centers podem transformar o Brasil em polo digital. Mas será que não estamos diante de mais um capítulo da longa história de renúncias fiscais sem retorno concreto?
A Medida Provisória 1318/2025 foi lançada pelo governo com um discurso sedutor: transformar o Brasil em protagonista da economia digital, atrair até R$ 2 trilhões em investimentos e criar um ecossistema de inovação verde, sustentável e competitivo. No papel, o plano é ambicioso. O problema é que já vimos esse filme antes.
A promessa do futuro digital
O Redata e o Repes oferecem benefícios fiscais generosos – isenções de PIS, Cofins, IPI e Imposto de Importação – para empresas de tecnologia que instalarem data centers ou exportarem serviços de TI. Em troca, exigem compromissos de sustentabilidade, destinação de capacidade ao mercado interno e aportes em P&D. É uma tentativa de atrelar o incentivo a contrapartidas palpáveis. Mas a pergunta é inevitável: quem vai fiscalizar se esses compromissos serão realmente cumpridos?
O peso da renúncia fiscal
Em um país com as contas públicas fragilizadas, abrir mão de receitas sempre exige cautela. A história brasileira está repleta de incentivos fiscais que acabaram virando despesas permanentes sem benefícios claros para a sociedade. O risco é repetir o modelo: lucros para grandes multinacionais, enquanto o contribuinte paga a conta. A MP 1318 precisa provar que não é apenas um “cheque em branco” para gigantes da tecnologia.
Dependência ou soberania?
Há também um dilema estratégico. Atrair data centers estrangeiros é positivo para a economia e pode baratear serviços digitais no Brasil. Mas até que ponto estaremos fortalecendo a dependência tecnológica em vez de criar empresas nacionais competitivas? A soberania digital não se alcança apenas com infraestrutura estrangeira; exige formação de talentos, estímulo a startups e fortalecimento de players locais.
Uma chance que não pode ser desperdiçada
O governo tenta corrigir essa distorção ao vincular parte dos investimentos a universidades, institutos de pesquisa e startups, além de reservar 40% dos recursos de inovação para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. É um avanço, sem dúvida. Mas tudo dependerá de execução e transparência. Sem isso, a MP 1318 corre o risco de se tornar mais uma página na velha cartilha do “desenvolvimentismo fiscal” sem lastro em resultados concretos.
Em resumo, a MP 1318 pode, sim, ser um passo estratégico rumo à modernização da economia digital brasileira. Mas a diferença entre um salto histórico e um novo fracasso de política fiscal dependerá menos da letra da lei e mais da sua aplicação prática.