A morte de Olavo de Carvalho, na última terça-feira, acelerou uma crise que já atingia o bolsonarismo. O guru liderava a ala ideológica que serviu de sustentação no início da gestão, mas foi descartada ao fragilizar o governo: por pura incompetência ou por suas ideias extravagantes (e muitas vezes criminosas) que criaram crises insustentáveis. Isso aconteceu no Itamaraty, no Ministério da Educação, no Meio Ambiente e no próprio gabinete do ódio, que se abasteceu com os palavrões e teorias conspiratórias do escritor. Um dos últimos suspiros do olavismo foi a recente recomendação de um discípulo seu no Ministério da Saúde, que condenou a vacinação contra a Covid e defendeu a cloroquina.

Apesar da pretensão e arrogância, o “pensamento” olaviano é ignorado entre intelectuais e não terá continuidade. Essa colcha de retalhos de teses conservadoras só conseguiu alguma projeção após o surgimento das redes sociais e da expansão da direita alternativa nos EUA, inclusive negando teses de Edmund Burke, Friedrich Hayek ou do contemporâneo Roger Scruton (que, ao contrário do brasileiro, tinha legitimidade para ser chamado de filósofo). É ridículo dizer que os Beatles eram satânicos ou que há evidências de que a Terra não é redonda, como fazia o “professor”. Os erros e aberrações desse discurso não criaram nada e nem serviram à direita. Ao contrário, ajudaram a fortalecer o populismo de esquerda, que está renascendo revigorado no Brasil.

Olavo de Carvalho usou esse repertório quando sentiu que lhe seria útil ou lucrativo após transitar pela astrologia, alquimia e pelo esoterismo. Ele não se propunha a ampliar o debate público. Queria angariar seguidores, como se fosse o profeta de uma seita. Essa proposta caiu como uma luva para um governo sem quadros, carente de qualquer projeto básico e baseado no discurso do ódio.

O ativismo vulgar do escritor nas redes, suas teses de almanaque e as frases de efeito para inflamar os radicais foram úteis para Bolsonaro até ameaçarem seu mandato. Hoje, os “olavetes” são um incômodo. Lutam para voltar aos holofotes com a proximidade das eleições ou tentam escapar da cadeia (como o próprio Olavo, que fugiu do Brasil após ser intimado pela PF). Isso é uma prova de que o fenômeno bolsonarista de 2018 não vai se repetir da mesma forma.

Bolsonaro debochou das vítimas da Covid, ignorou o desaparecimento de personalidades e só decretou luto oficial com a morte do seu ideólogo. É sinal de que Olavo ainda é um símbolo útil para a sua sobrevivência política. O know-how de difamações e injúrias do escritor vai inspirar a campanha subterrânea do mandatário nas eleições deste ano. Mas ambos têm o mesmo destino reservado na história.