Por Philip Pullella

(Reuters) – O papa emérito Bento XVI, primeiro pontífice em 600 anos a renunciar e porta-estandarte dos conservadores que ansiavam por uma Igreja mais tradicional, morreu neste sábado, encerrando um período extraordinário em que dois homens vestidos de branco viveram no Vaticano.

Bento, de 95 anos, morreu em um antigo mosteiro onde vivia desde sua renúncia em 2013.

Os sinos dobraram em Roma quando a notícia de sua morte, que veio após um rápido declínio de sua saúde durante o Natal, se espalhou para os fiéis em um dia de inverno excepcionalmente quente. Muitos foram rezar na Praça de São Pedro ao saber da notícia.

“Agora teremos apenas um papa. Devo dizer que o papa Ratzinger foi um papa carismático, humilde, mas acima de tudo um grande teólogo”, disse a turista francesa Emilie Gaillard, usando o sobrenome de família de Bento XVI.

O Vaticano disse que o corpo será velado a partir de segunda-feira na Basílica de São Pedro e que o papa Francisco presidirá o funeral na manhã de quinta-feira na mesma praça onde Bento XVI, então cardeal Joseph Ratzinger, celebrou a missa fúnebre de seu predecessor, papa João Paulo II, em 2005.

“Com pesar, informo que o papa emérito, Bento XVI, faleceu hoje às 9h34 no mosteiro Mater Ecclesiae no Vaticano”, disse o porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni.

“Seguindo o desejo do papa emérito, o funeral acontecerá em um sinal de simplicidade”, disse Bruni, acrescentando que o serviço será “solene e sóbrio”.

O Vaticano tem rituais minuciosamente elaborados para o que acontece depois que um papa reinante morre, mas nenhum conhecido publicamente para um papa emérito –uma das muitas complicações criadas pela renúncia de Bento XVI.

O papa Francisco divulgou na quarta-feira que seu antecessor estava “muito doente”. Bruni disse que Bento XVI recebeu os últimos ritos, antes conhecidos como Extrema Unção e agora chamados de “unção dos enfermos”, no mesmo dia.

Os líderes foram rápidos em enviar suas condolências a Bento, que foi o primeiro papa alemão em 1.000 anos.

“Lamentamos a morte de nosso papa bávaro”, disse Markus Soeder, primeiro-ministro do estado natal de Bento XVI. O chanceler alemão, Olaf Scholz, disse no Twitter que o mundo perdeu “uma figura formativa da Igreja Católica”.

O primeiro-ministro italiano, Giorgia Meloni, saudou Bento XVI como “um grande homem que a história não esquecerá”, enquanto o presidente polonês Andrzej Duda o chamou de “um dos maiores teólogos dos séculos XX e XXI”.

ESCÂNDALOS E VAZAMENTOS

Por quase 25 anos, como cardeal Ratzinger, Bento foi o poderoso chefe do escritório doutrinário do Vaticano, então conhecido como Congregação para a Doutrina da Fé (CDF) e considerado um dos maiores teólogos da Igreja.

Nesse papel, ele suprimiu a dissidência dos teólogos da libertação, dizendo que eles estavam misturando o pensamento marxista e o cristianismo.

Ele foi eleito papa em 19 de abril de 2005 para suceder o amplamente popular João Paulo, que reinou por 27 anos. Os cardeais o escolheram entre eles em busca de continuidade e do que se chamou de “um par de mãos seguras”.

Escândalos de abuso infantil perseguiram a maior parte de seu papado, mas ele é creditado por iniciar o processo para disciplinar ou exonerar padres predadores depois de uma atitude mais negligente sob seu antecessor.

Mas o próprio Bento reconheceu que foi um administrador fraco, dizendo que mostrou “falta de determinação no governo e na tomada de decisões” durante seu pontificado de oito anos, marcado por erros, principalmente nas relações com o islamismo e o judaísmo.

DOIS “PAPA”, UM VATICANO

Ele anunciou que estava renunciando em latim em uma reunião de rotina dos cardeais. Muitos não tinham ideia do que ele havia dito e demorou até que a notícia caísse. Ele mesmo disse que não tinha mais forças para liderar a Igreja devido à sua “idade avançada”.

Após sua renúncia, ele se instalou em um convento convertido nas dependências do Vaticano e escolheu o título de “papa emérito”.

Embora tenha dito que permaneceria “escondido do mundo” em sua aposentadoria, Bento às vezes causava polêmica e espalhava confusão por meio de seus escritos e entrevistas.

Embora ele raramente aparecesse em público, os conservadores católicos olhavam para o papa emérito como seu porta-estandarte e alguns ultratradicionalistas até se recusavam a reconhecer Francisco como um pontífice legítimo.

Eles criticaram Francisco por sua abordagem mais receptiva aos membros da comunidade LGBTQ+ e aos católicos que se divorciaram e se casaram novamente fora da Igreja, dizendo que ambos estavam minando os valores tradicionais.

Apesar das dificuldades que surgiram por ter dois homens vestidos de branco no Vaticano, Francisco desenvolveu um relacionamento caloroso com Bento XVI e disse que era como ter um avô morando na casa.

(Texto de Crispian Balmer; reportagem adicional de Ângelo Amante)

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