O juiz federal Sérgio Moro, dos processos da Operação Lava Jato, em Curitiba, afirmou que o compartilhamento de provas das investigações de cartel e corrupção na Petrobras sobre o pecuarista José Carlos Bumlai – amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – com processo da área cível, do Ministério Público Federal no Distrito Federal, que apura empréstimos de mais de R$ 500 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para suas empresas, é “oportuno” e “atende ao interesse público”.

“O compartilhamento dos elementos de informação colhidos nestes autos para fins de instrução de processos em que se apurem atos de improbidade administrativa e responsabilidades cíveis e administrativas mostra-se oportuno e atende suficientemente ao interesse público”, escreveu Moro, em despacho de 26 de julho, em que autorizou remessa de documentos para Brasília.

O Ministério Público Federal investiga se o Grupo São Fernando, de usinas de álcool, foi beneficiado em empréstimos concedidos pelo BNDES, entre 2008 e 2012, de mais de R$ 500 milhões. As participações do BTG Pactual, do falido BVA e do Grupo Bertin também estão sob suspeita.

A principal suspeita recai na concessão de R$ 101,5 milhões em 2012. O valor foi contratado em nome da São Fernando Energia 1 – unidade do grupo que geraria energia com o bagaço da cana-de-açúcar -, no plano de reestruturação financeira do grupo. A operação foi feita de forma indireta, via bancos BTG Pactual e Banco do Brasil, um ano antes de Bumlai entrar com pedido de recuperação judicial.

Desde agosto, os procuradores do Distrito Federal trabalham com materiais compartilhados pela força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba. Foram enviados documentos apreendidos na 21ª fase, batizada de Operação Passe Livre – referência ao livre acesso que o pecuarista tinha no Planalto, nos governos Lula. São e-mails e documentos apreendidos em endereços do pecuarista e dos filhos, Maurício de Barros Bumlai e Guilherme de Barros Bumlai, como os contratos e cartas trocadas com o BNDES na época das operações financeiras.

Os procuradores da República do Distrito Federal Sara Moreira de Souza e Claudio Drewes José de Siqueira, da área de combate à corrupção, investigam os negócios de Bumlai e o BNDES desde 2015. Essas frentes, em parceria com a Lava Jato, podem gerar novos processos contra o pecuarista.

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“É crítica recorrente às instituições encarregadas de prevenção e investigação de crimes a falta de adequada cooperação e compartilhamento de informações”, afirmou Moro, ao autorizar o envio de documentos para as investigações na área cível. “Frases como ‘o Estado desorganizado contra o crime organizado’ tornaram-se até mesmo clássicas.”

Para o juiz da Lava Jato, a “cooperação entre as diversas instituições públicas, com compartilhamento das informações, é um objetivo político válido e que se impõe caso se pretenda alguma eficácia na investigação e persecução de crimes complexos, como os crimes de colarinho branco ou os crimes praticados por organizações criminosas”.

“Tal objetivo favorece interpretações do sistema legal no sentido de admitir o compartilhamento de provas, desde que preenchidos os requisitos que autorizam a adoção do método especial de investigação e desde que o compartilhamento vise apenas atender ao interesse público.”

O juiz da Lava Jato citou em seu despacho haver “significativa jurisprudência em casos de compartilhamento de provas colhidas em interceptação telefônica para finalidades públicas que não a instrução criminal”.

“Não se pode dizer, ademais, que o compartilhamento com a esfera cível seria desnecessário diante da perspectiva de um processo criminal. Os ritmos do processo criminal e do cível são diferenciados, aquele infelizmente sujeito a enormes delongas. Além disso, são diferenciadas as cargas probatórias necessárias em um e outro processo. O que pode não ser suficiente para uma condenação criminal, que reclama prova acima de qualquer dúvida razoável, pode mostrar-se mais do que suficiente para a responsabilização por improbidade.”


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