Quando Asya viu as vitrines estilhaçadas das lojas localizadas em uma rua comercial, a sua preferida, imediatamente começou a chorar. Sua casa foi bombardeada. Ainda tinha a intenção de voltar a morar em Raqa. Agora, não mais.

“Meu Deus! Era a cidade mais linda”, disse a síria de 35 anos, sentada no banco de trás de um carro, na avenida Tal Abyad, antes movimentada e agora apenas cheia de escombros.

“Agora olhe ao redor, olhe as nossas casas”, afirma chorando.

Asya faz parte dos poucos civis que tiveram a chance de voltar ao centro de Raqa, desde que uma aliança de combatentes curdos e árabes, apoiada pelos Estados Unidos, expulsou o grupo Estado Islâmico (EI) da cidade autoproclamada sua “capital”.

Na sexta-feira (20), as forças anti-extremistas organizaram uma cerimônia para oficializar a retomada da cidade, devastada após quase cinco meses de combates. Porém, em razão das muitas bombas plantadas pelo EI, no momento ainda não é possível que os habitantes voltem a residir no local.

Alguns familiares dos combatentes e de autoridades locais conseguiram o salvo conduto de um dia para assistir a cerimônia. Aproveitaram para dar uma olhada em suas casas.

É o caso de Asya e seus quatro filhos, que percorreram a cidade em um carro conduzido pelo seu marido, um combatente curdo. Depois da cerimônia, quiseram ver o bairro que moravam, Al Rumeila, no leste da cidade.

“Minha casa foi bombardeada, percebi quando vi todos os nossos pertences espalhados”, conta Asya. “Preferia que tivessem roubado tudo, mas que os muros continuassem de pé”.

– ‘Destruição, dor e tristeza’ –

Desde que fugiu da sua cidade natal no início do ano, ela tinha a intenção de voltar a morar no local junto a sua família. “Agora não quero voltar”, ressalta.

“Todas as nossas boas lembranças se transformaram em tragédia”, comenta Asya, que usa um véu na cor mostarda.

Ao seu redor, na avenida, tenta adivinhar o que era cada ponto comercial observando os detalhes: um outdoor rasgado em frente a uma clínica infantil, balcões vazios do que restou de uma joalheria, tecidos e máquinas de costura de uma alfaiataria.

A cidade está desfigurada.

Quando a cidade estiver livre das minas terrestres, a aliança curdo-árabe entregará seu controle ao Conselho Civil de Raqa, uma administração provisória. Os seus membros também conseguiram vê-la por algumas horas.

“Estamos felizes por termos voltado, mas há destruição, dor e tristeza”, declara a advogada Fadila Hamad al Jalil, que fugiu de Raqa em abril.

“Não imaginei que a destruição fosse tão extensa. Não parece real, não há sequer um edifício ou construção de pé, não há nenhum sinal de vida”, argumenta essa mulher, que assistiu a cerimônia como membro do Conselho Civil.

Jalil gostaria de ter ido ao local acompanhada de sua família e amigos de infância, mas o retorno dos civis pode demorar meses.

– ‘Reduzida a isso’ –

A breve ida à cidade permitiu que Mahmud Mohamed, membro do comitê pertencente ao conselho civil encarregado pela reconstrução de Raqa, tivesse ideia da grandiosa tarefa que o espera.

Há semanas, um grupo de engenheiros como ele elaboram planos para o restabelecimento da rede de água e eletricidade.

O jovem, de 27 anos, percebeu que ainda era muito otimista.

“Víamos as imagens feitas de Raqa (enquanto aconteciam os combates), mas não sabíamos e não prevíamos que ela tinha sido reduzida a isso”, disse Mohamed, enquanto tirava fotos dos danos acometidos na avenida Tal Abyad, onde sua família tinha várias lojas que continuaram em funcionamento mesmo durante os tempos do EI.

“A dimensão da destruição é muito maior do que tínhamos imaginado. O plano (de reconstrução) já mudou totalmente desde que entramos na cidade”, acrescentou cabisbaixo.

Uma caminhonete branca passa por trás dele. Na caçamba do veículo, os combatentes anti-extremistas festejam, enquanto fazem o “V” de vitória com os dedos.

Um deles levanta o seu fuzil e diz, dirigindo-se a Mohamed: “Irmão, Raqa foi libertada!”.