Moradores de Maresias e a prefeitura de São Sebastião, no litoral norte paulista, estão em embate por causa da construção de 220 casas do Minha Casa Minha Vida no bairro. Uma parte da população, representada pela Sociedade Amigos da Praia de Maresias (Somar), questiona o espaço escolhido para o empreendimento e afirma que a região não tem saneamento básico nem estrutura para receber um projeto como este. A administração municipal defende a iniciativa e diz que todos habitantes serão beneficiados.

“Não somos contra a construção do conjunto, mas temos muitas dúvidas sobre os impactos do projeto no meio ambiente e na economia local”, afirma Eliseu Arantes, presidente da Somar. “A praia de Maresias está poluída porque não há rede de esgoto. E essa sujeira, com a correnteza para o leste, já está se alastrando para a região de Paúba (bairro vizinho)”, argumenta.

O prefeito de São Sebastião, Felipe Augusto (PSDB), admite que Maresias não tem infraestrutura básica de saneamento, mas afirma que a prefeitura assinou, em março do ano passado, um contrato com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) para investimentos de R$ 700 milhões na região em 17 anos, com previsão de instalação de todo o sistema de água e esgoto em quatro anos.

O terreno escolhido para o conjunto habitacional tem 25.872 metros quadrados e fica a aproximadamente 500 metros do mar, próximo ao Canto da Barra, com entrada pela Avenida Paquetá. A meta, segundo a prefeitura, é que a entrega das residências comece em meados de 2023.

A licitação, vencida pela Construtora e Incorporadora Faleiros Ltda., foi cancelada porque, de acordo com o prefeito, na publicação do edital havia informações erradas. O edital previa imóveis da Faixa 1 do projeto habitacional, que não tem mais investimento do governo federal. O novo processo, para casas da Faixa 2, deve ser publicado nos próximos dias.

No entorno da área há condomínios de alto padrão, casas de veraneio, pousadas, hotéis, restaurantes e baladas. Maresias é famosa em todo o País e, também internacionalmente, por sua vocação turística. É um dos picos mais frequentados por surfistas no litoral paulista. Gabriel Medina, bicampeão mundial de surfe, nasceu e mora no bairro.

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“Esse conjunto terá capacidade para aproximadamente 900 moradores. Maresias vive principalmente do turismo e a oferta de empregos é limitada. Sabemos que nossa região tem famílias em áreas de risco. Essas serão as pessoas encaminhadas ao conjunto? Como dar emprego para essa gente?”, questionou o presidente da Somar.

O prefeito de São Sebastião garante que todos os moradores transferidos para o conjunto já vivem em Maresias. “Fazer o transbordo dos habitantes de um bairro para outro cria um enorme problema social porque há uma questão de adaptação”, disse. “O programa segue a regularização fundiária do governo municipal, que cadastrou todas as famílias. Maresias tem 396 imóveis em locais irregulares e de risco.”

A Somar encomendou um Estudo do Impacto de Vizinhança (EIV), e o relatório com diagnóstico das áreas de influência, impactos ambientais e socioeconômicos ficou pronto no dia 20 de janeiro. Eliseu Arantes protocolou na prefeitura um ofício com 24 questões sobre o Minha Casa Minha Vida (veja a íntegra abaixo). O prazo para resposta acabou na quinta-feira, 30. O presidente da associação pretende apresentar novo ofício na próxima semana e vai incluir o EIV.

A engenheira ambiental Patrícia de França Ferreira, que assina o relatório, comenta que todos os dados usados como base do estudo são oficiais, disponíveis à população por autoridades do Governo, entre elas o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat).

“O terreno escolhido está em Zona de Amortecimento (ZA ou Zona Tampão) de unidade de conservação, ou Área Envoltória de bem tombado, do Parque Estadual da Serra do Mar”, explicou a especialista. “Esse projeto precisa de licenciamento ambiental específico. O local não tem nenhum saneamento estruturado, as praias estão todas impróprias e a maioria das casas têm fossas”, apontou Patrícia.

Ela também chama atenção para o acesso à cachoeira Sete Quedas. “A única maneira de chegar na cachoeira é por meio daquela área. A população ainda não teve acesso a todos os dados desse projeto e isso gera muitas dúvidas e preocupações”, afirmou a engenheira.

O prefeito rebate e destaca que tem todos os estudos e relatórios necessários para tocar o projeto. “Isso é uma guerra do rico contra o pobre”, comparou Augusto. “Aquela não é uma área de amortecimento e o acesso à cachoeira será mantido. Do tamanho total do terreno (25 mil metros quadrados), as casas só podem ocupar 15 mil metros quadrados. O restante é área de preservação e lazer.”

Território

Maresias ocupa 680 mil hectares, ou 6.800 quilômetros quadrados, com uma praia de 5 quilômetros de largura e uma área de 6 quilômetros em direção ao continente.

“A população de Maresias cresceu de maneira desordenada nos últimos seis anos, pulando de 4,5 mil para 10 mil. Em toda a cidade de São Sebastião, no mesmo período, a população cresceu de 73 mil para 84 mil. Desses novos 11 mil moradores, 5,5 mil estão em Maresias”, calculou o presidente da associação de moradores.

“Em março deste ano vamos inaugurar uma creche no bairro com capacidade para 300 crianças. E abrimos uma licitação para a construção de uma nova unidade de saúde. Ainda convivemos com muitas invasões em áreas públicas e trabalhamos para reduzir esse problema”, afirmou o prefeito, que garante estar aberto a conversas com a população e promete avaliar os documentos apresentados pela Somar.



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