Nas eleições, na formação do governo ou nas manifestações contra o poder, em todos os momentos importantes da vida política iraquiana, um homem é regularmente responsável por pender a balança para um lado ou para outro: o polêmico e multifacetado Moqtada al-Sadr.

O ex-líder de milícia dos descendentes de Maomé agora aparece como o homem da reforma e o crítico dos políticos no 12º país mais corrupto do mundo.

Fugindo da mídia e orador medíocre, é capaz de fazer reagir toda a classe política com um tuíte, e de mobilizar em um país onde a juventude é a maioria.

Isso é o que parece ter feito no início do mês, ao expressar seu apoio às manifestações exigindo a queda do governo que ele próprio levou ao poder há um ano.

No entanto, segundo o especialista em Iraque da Universidade de Singapura Fanar Haddad, “os sadristas são parte integrante da classe política e sempre estiveram entre ministros e funcionários do alto escalão”.

“É um personagem de itinerário sinuoso”, resume Karim Bitar, diretor de pesquisa do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris).

“Um encrenqueiro nacionalista antiamericano durante a guerra do Iraque, que depois se alinhou com a Arábia Saudita e, de repente, deu uma guinada radical e se aproximou novamente dos iranianos”, os grandes inimigos de Riad, ressaltou.

Nascido há 46 anos em Kufa, perto da cidade xiita de Najaf, no sul do Iraque, homem de corpo imponente, rosto redondo e barba grisalha é descrito por pessoas próximas como alguém de temperamento explosivo.

– “Resistente” –

Quando tinha apenas sete anos, Saddam Hussein eliminou o primo de seu pai, o grande pensador xiita Mohammad Baker. Em 1999, o ditador assassinou seu pai, Mohammed Sadek Sadr, ícone de um xiismo militante.

Graças a essa linhagem de prestígio, Moqtada al-Sadr foi impulsionado a partir de 2003 à liderança da “resistência” xiita – comunidade majoritária no Iraque – à ocupação dos americanos.

Um ano depois, al-Sadr, um dos poucos políticos que viveu no Iraque sob Saddam Hussein enquanto os outros estavam no exílio, criou o Exército Mahdi.

Ele, porém, dissolveu a milícia mais poderosa do Iraque, com 60.000 combatentes, ao final de um conflito com as forças do primeiro-ministro Nuri al-Maliki.

Quando este último chegou ao poder em 2006, Moqtada al-Sadr desapareceu e só reapareceu em 2011 no distrito de Al-Hannana de Najaf, onde vive desde então. Ele acabara de passar quatro anos em uma escola religiosa em Qom, Irã.

Ele, cujos apoiadores entoam regularmente em suas manifestações anticorrupção “Irã fora, Bagdá livre”, apareceu em setembro no país vizinho ao lado de seu guia supremo Ali Khamenei.

Se essa visita surpreendeu nas ruas iraquianas, para um especialista em assuntos iraquianos-iranianos, Moqtada Sadr cruzou a fronteira para “buscar proteção porque temia uma tentativa de assassinato”.

Prova disso, dizem os especialistas, foram os incêndios nas sedes das forças de Hashd al-Shaabi, dominadas por grupos pró-Irã, em meio ao caos dos protestos contra o governo. Para eles, esses eventos foram um “acerto de contas” de Moqtada Sadr.

– Antropólogo –

“Ele é antropólogo”, diz Renad Mansour, pesquisador do think tank Chatham House. Mas, “ao acompanhar os movimentos das ruas, ele se contradiz de um ano para o outro”.

Assim, se ele permitiu a formação do governo de Adel Abdel Mahdi há um ano, hoje se juntou aos manifestantes que reivindicam sua queda.

“A ideia do fracasso de um governo que ele formou não o preocupa, então ele decidiu derrubá-lo”, diz Mansour.

Mesmo assim, ele deve negociar com o Hashd que ele sempre rejeitou, fazendo valer uma linha iraquiana independente – que ainda oferece espaço para a influência do grande vizinho iraniano.

Pois, explica, Haddad, “existe uma divisão real entre os líderes xiitas: Moqtada Sadr e outros estão preocupados com a crescente influência dos pró-Irã no aparato político e militar”.

Apesar de suas mudanças de posição, ele mantém a maior base popular do país, pronta para obedecê-lo quase cegamente, principalmente em Sadr City, sua fortaleza em Bagdá e o distrito mais densamente povoado do Iraque.

Foi ela quem paralisou o país em 2016, tomando a Zona Verde de Bagdá e, portanto, as instituições mais importantes do Iraque.

Com a contestação atual, ele prova mais uma vez “que é uma personalidade divisora, mas inevitável no Iraque”, diz Bitar.