Se o frio chega tímido, o marrom definitivamente veio para ficar e se fixar como a cor da estação. Da última temporada de moda para cá, a aparição de suas variações nas passarelas aumentou 21,5%, segundo o relatório Colour Vision, da empresa de previsão de tendências WGSN. Há dois anos, a tonalidade Nutshell (do inglês, “casca de noz”) chegou a ser anunciada como aposta para 2024 pela Coloro, sistema de cores para a indústria de design italiano semelhante à Pantone. A norte-americana, por sinal, catalogou os tons esperados para as coleções de Outono/Inverno 2024/2025. Se os desfiles de Nova York devem dar espaço para cores como o “âmbar cru”, na London Fashion Week estarão em destaque “queimadura de sol” e “pinha”.

Nos últimos meses, os marrons também vêm brilhando nos tapetes vermelhos, e atrizes como Margot Robbie e Zoe Saldaña os exibiram no after party do Oscar e no Met Gala, respectivamente. O próprio Timothee Chalamet apareceu na festa de lançamento de Duna 2 com uma blusa puxada para o caramelo — o primeiro filme da sequência que ele co-protagonizou com Zendaya, inclusive, quase levou o Oscar de Melhor Figurino 2022 ao investir na mesma paleta.

Muito associado ao visual masculino dos anos 1990, as variedades da coloração vêm ocupando os armários femininos, em alternativa ao preto. “Buscamos modernizar a alfaiataria, respeitando o ofício milenar, e explorar as tonalidades além das tradicionais, ao brincar com a cartela de cores e os contrastes”, diz Cecília Gromann, diretora criativa da Anacê.

Ao contrário de pigmentos raros, como os roxos e vermelhos, que sempre foram objeto de desejo, o marrom demorou a ser valorizado. No Antigo Egito, esteve associado à mumificação, na Roma Antiga, aos plebeus, e na Idade Média, ao desapego material franciscano, como pontua Brunno Almeida Maia, pesquisador na área de Moda da USP. “É a partir da Renascença que pintores conferem nobreza à cor. O art-déco, na década de 1920, também teve sua importância, tanto em termos de design e arquitetura, como de estamparia, pintura e ilustração.”

A relação com as classes menos abastadas está ligada à sua proximidade óbvia com a terra. “Quando pensamos no campo nos vêm à memória tons que lembram a natureza, como o marrom, o cáqui ou um verde mais fechado”, diz Cecília, que se baseia no guarda-roupa e nas fotos de família, do interior, para produzir uma alfaiataria contemporânea.

Volta à discrição

Marsala, canela, caramelo e cappuccino são apenas alguns dos tons que compõem a paleta. “Enquanto os quentes remetem à condição de jovialidade e alegria, os frios transmitem uma ideia de calma e serenidade. A escolha acaba por representar um estado de espírito”, diz Brunno Maia.

Seja qual for o sentimento, a busca pelo marrom e outras cores neutras, como branco, preto e cinza, em detrimento de opções mais vibrantes – ou mesmo do luxo ostentatório – vem em reação a momentos de crise: sanitária, climática e política. “Imaginávamos que as pessoas iam ficar mais extravagantes no período pós-pandemia, mas elas passaram a pensar melhor sobre o que consomem, a repensar a ostentação. Tanto que a logomania entrou em desuso”, diz Cecília Gromann.

Moda: marrom é o novo preto; confira
(Divulgação; Angela Weiss/AFP)