O dia 6 de setembro de 2018 foi marcante para a arquiteta Denise Bueno Franco, de 31 anos. Ao acompanhar a campanha de Jair Bolsonaro em Juiz de Fora, ela ficou feliz ao ver que o então candidato usava uma peça de sua confecção, uma camiseta verde e amarela com os dizeres “Meu partido é o Brasil”. A alegria, porém, durou pouco: minutos depois, ele levaria uma facada, desferida por Adélio Bispo de Oliveira, na região do abdômen. Sem querer, a criação de Denise virava símbolo de um dos eventos mais influentes da história eleitoral brasileira. “Nós sabíamos que ele tinha a camiseta, mas não imaginávamos que ele iria vesti-la naquele dia”, lembra Denise. As buscas pela vestimenta explodiram de tal maneira que o site feito pela família saiu do ar. Denise e o marido, o publicitário Wilker Amaral, viram uma boa oportunidade de negócio e decidiram montar a loja online “Camisetas Opressoras”. Ali, o casal vende roupas com mensagens a favor do porte de armas e da família tradicional, além de acessórios que exaltam a figura de Jair Bolsonaro e de outros ícones da direita como Olavo de Carvalho e o coronel Brilhante Ustra. Em breve, nomes globais como Margaret Thatcher e Ronald Reagan também servirão de inspiração. Material associado à ex-primeira-ministra britânica e ao ex-presidente americano, aliás, já fazem sucesso em sites similares, como o Direita Store e a Vista Direita.

Alimentados pela ideologia, portais de comércio eletrônico como o de Denise estão sendo criado por famílias que acreditam nas causas do atual governo e que vivem pelas ideias que ajudam a divulgar. “O maior sucesso da loja é a estampa com o cachorrinho comunista”, diz Denise. A imagem mostra um cão estilizado fazendo suas necessidades – substituídas pela foice e o martelo, símbolos do comunismo. Há composições mais discretas, como acessórios ilustrados com armas ou bandeiras do Brasil. Em 22 de fevereiro, em Brasília, Jair Bolsonaro usou uma gravata com metralhadoras em evento oficial, levantando a polêmica sobre a irresponsabilidade de o presidente do Brasil usar uma peça de roupa que estimula a violência de forma tão óbvia em pleno Palácio do Planalto.

Ao contrário de empresas que defendem causas humanitárias, como o anti-racismo ou a defesa da comunidade LGBTQIA+, as marcas conservadoras abordam temas que poderiam ser enquadrados como a apologia ao crime, como a promoção da tortura e o preconceito contra minorias, temas que seriam impensáveis até pouco tempo. “É como se o governo Bolsonaro tivesse autorizado que a população se comportasse dessa maneira. A pessoa não tem mais medo de mostrar aos outros que pertence a esse grupo”, explica Suzana Ramos Coutinho, professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ela diz que o ato de consumir é cada vez mais político, obrigando o consumidor a escolher “um lado”. “Eles passam uma mensagem sobre o grupo ao qual pertencem por meio do que suas roupas expressam.”

GLOBAL Armas e slogans nacionalistas: camisetas e acessórios são vendidos online

Moda global

O caráter nacionalista conecta esses indivíduos ao movimento global da extrema direita. Uma marca na Polônia, por exemplo, vende camisetas com a bandeira confederada dos EUA, desenho associado ao racismo por ter sido usada pelos estados sulistas na guerra civil americana. Outras apostam em imagens rúnicas e vikings, ligados à masculinidade e à origem do homem ariano.

Quem exportou esse conceito para o mundo foi o movimento de direita dos Estados Unidos, que emergiu com a eleição do ex-presidente Donald Trump. O que faz sucesso por lá são as roupas e acessórios com as cores da bandeira norte-americana ou a frase “Make America Great Again”, slogan popularizado por Trump. Há ainda opções mais sutis, reconhecidas apenas por seus seguidores. É o caso da marca britânica Fred Perry. Combinando peças em preto e amarelo, ela foi adotada pelos “Proud Boys”, grupo de extrema-direita formado apenas por homens. Defensores de Trump, eles são geralmente vistos organizando protestos violentos nos EUA e no Canadá. Mensagens em camisetas são peças de expressão política desde os anos 1960. Em um mundo cada vez mais polarizado, no entanto, elas deixam de ser apenas imagens curiosas para se tornarem figurinos de exércitos ideológicos cada vez mais parecidos com os que frequentam as praças de guerra.