A televisão pública da Colômbia divulgou neste domingo (11) imagens inéditas do resgate das quatro crianças indígenas que sobreviverem por mais de um mês na selva amazônica, depois de um acidente de avião que levou à morte de sua mãe quatro dias após a queda em 1º de maio.

“Recebi a menina (Lesly) em meus braços, e ela disse: ‘Estou com fome'”, relatou Nicolás Ordóñez Gomes, um dos integrantes da equipe de busca, durante uma entrevista ao vivo à emissora pública RTVC.

“Fomos ver o menino e ele estava deitado. Ele se levantou e disse, muito consciente: ‘Minha mamãe morreu'”, acrescentou.

Lesly (13 anos), Soleiny (9), Tien Noriel (5) e Cristin (1) foram encontrados vivos na sexta-feira no meio da Amazônia colombiana, a 5 km do local do acidente, no qual três adultos morreram.

A RTVC exibiu um vídeo gravado com um telefone celular, em que os quatro irmãos da comunidade huitoto aparecem debilitados e muito magros; a mais nova nos braços de um de seus salvadores.

Os resgatadores, membros da guarda indígena, cantam, fumam tabaco (planta sagrada para os nativos) e agradecem alegres.

Mais de 100 soldados e indígenas da região, apoiados por cães farejadores, seguiram o rastro das crianças, enquanto elas caminhavam pela selva ao longo de 2.656 quilômetros.

Entre 15 e 16 de maio, uma equipe militar localizou no departamento de Caquetá o piloto morto na cabine da aeronave, que estava presa entre árvores e tinha sua parte frontal destruída.

Magdalena Mucutuy, mãe das crianças, e um líder indígena também faleceram, embora os militares não tenham especificado onde estavam seus corpos.

“A única coisa que ela (Lesly) esclareceu é que sua mãe ficou viva por quatro dias. Então, antes de morrer, talvez a mãe tenha dito a eles: ‘Vão embora que vocês vão encontrar quem é o pai de vocês’ (…)”, declarou o viúvo Manuel Miller Ranoque à imprensa, no hospital militar em Bogotá, onde seus filhos estão se recuperando.

Lesly, que tem uma natureza “guerreira” e é muito “inteligente”, manteve seus irmãos mais novos em segurança, segundo relataram seus avós em entrevistas à AFP.

– Ameaças –

A busca foi difícil devido à densa vegetação da área, a presença de jaguares e cobras, e a chuva constante que impede que possíveis chamados de socorro sejam ouvidos.

A selva amazônia colombiana é um território extenso, de difícil acesso por rios e sem estradas, onde os habitantes costumam viajar em voos privados.

Além da vegetação hostil e dos animais selvagens, também há a presença de rebeldes que se separaram do acordo de paz entre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e o governo em 2016.

Os menores embarcaram no avião junto com sua mãe em 1º de maio para fugir dessas dissidências das Farc, que recrutam e aterrorizam os moradores da região. O pai já havia escapado e aguardava o reencontro com sua família, segundo a imprensa.

Ranoque, que participou das buscas, afirmou que teme pela vida das crianças. “É o que me assusta mais, porque sei que essas pessoas sem escrúpulos podem começar a me pressionar usando meus filhos, e isso eu nunca vou permitir enquanto estiver vivo”, acrescentou.

A notícia das crianças perdidas deu a volta ao mundo, com vídeos e fotos do exército mostrando o dia a dia das operações, nas quais foram encontrados abrigos improvisados com galhos, tesouras, elásticos de cabelo, sapatos, roupas, uma mamadeira, frutas mordidas e pegadas.

– Frágeis –

Embora debilitados, os irmãos estão fora de perigo de acordo com os primeiros relatórios médicos. Estão recebendo tratamento com alimentos leves, atendimento psicológico e cuidados tradicionais indígenas.

“Estão muito acabadinhos, têm seus machucados, têm seus arranhões (…) Saíram com doenças da selva (…) Mas estão bem, em boas mãos”, disse o avô das crianças, Fidencio Valencia, à imprensa neste domingo.

Em fotografias divulgadas na mídia local, eles aparecem muito magros e a mais velha tem um ferimento na testa.

Os indígenas realizaram rituais tradicionais e utilizaram seus conhecimentos da floresta para finalmente encontrarem as crianças. Segundo o governo, foram eles os primeiros a as avistarem em meio à vegetação.

“Acreditamos muito na selva, que é nossa mãe. Por isso, sempre tive fé e dizia que a selva e a natureza nunca me traíram”, afirmou Ranoque.

Embora a espetacular operação de resgate tenha terminado, soldados do exército continuam procurando por Wilson, um cão farejador que foi fundamental para encontrar pistas das crianças na selva, mas que está desaparecido.

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