As eleições de 2022 devem contar com um número recorde de candidatos egressos das Forças Armadas, tanto da ativa quanto da reserva. A estimativa é de que pelo menos 50 militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica disputem o próximo pleito, em especial em busca de vagas nas Assembleias Legislativas ou na Câmara dos Deputados. Com discurso conservador e pauta voltada principalmente para segurança pública e educação, de preferência em colégios militares, os fardados tomaram gosto pela participação política estimulados por Jair Bolsonaro, ele próprio oriundo da caserna, e por uma cúpula militar que não tem demonstrado a devida preocupação com a perigosa interseção entre os mundos político e militar.

“Através da política é que se pode executar o bem comum”, diz o General Peternelli (União Brasil), coordenador informal da Bancada do Tanque no Congresso, com seis militares. Para o deputado federal, que tenta a reeleição por São Paulo, essa “vontade se servir” explica o interesse dos fardados pela política. “Com esse foco é que os militares vêm decidindo se candidatar nos últimos anos. Em 2018, o presidente Bolsonaro saiu candidato e o momento foi oportuno.”

O deputado estadual Capitão Castello Branco, do PL de Bolsonaro, diz: “Nós, militares, somos idealistas, patriotas, queremos o melhor para a nação”, justifica. Ele poderia optar por vaga na Câmara dos Deputados ou algum cargo no Executivo, porque “smpre aparece alguma oferta em razão da competência e da qualificação profissional dos militares”, mas tentará reeleição na Assembleia Legislativa paulista. “Acredito na eleição do capitão do Exército Tarcisio de Freitas para o Governo de São Paulo, e se Deus permitir serei mais útil no estado do que em Brasília.”

Para a cientista política Carolina Botelho, do Doxa/Iesp/UERJ e do Mackenzie, o grupo de militares que ascendeu ao poder com Bolsonaro, pelas urnas ou por indicações políticas, atua amparado na visão de que são agentes da sociedade capazes de impor ordem e “limpar a bagunça” de civis. “Mas essa é uma idealização deturpada, que não encontra correspondência na realidade”, diz. Para ela, os últimos anos mostraram que muitos militares que atuaram no governo criaram mais problemas do que resolveram. No comando do Ministério da Saúde, por exemplo, o general Eduardo Pazuello, que se apresentava como especialista em logística, conseguiu enviar para o Amapá vacinas contra a Covid destinadas ao Amazonas.

Fardados também foram seduzidos pelas benesses do poder e sua presença na administração federal aumentou bastante. É, acima de tudo, uma forma de engordar o contracheque. Estrelados quadros das Forças Armadas passaram a ocupar especialmente o primeiro escalão do Executivo federal: os generais Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria Geral; Augusto Heleno, do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), e Walter Braga Netto, que deixou a Defesa para ser vice na chapa de Bolsonaro. Recentemente, portaria do presidente passou a permitir que acumulem o salário dos ministérios com o soldo.

“Em democracias consolidadas esse tipo de aproximação dos militares com os governos não é comum. Esse arranjo acontece nas ditadura”, diz Carolina, que lembra: no fim do governo Trump, nos EUA, partiu de um general do Exército, Mark Milley, a iniciativa de pôr freio no projeto trumpista de subverter a Constituição por meio da ameaça de não reconhecer o resultado das urnas. Quanta diferença.